Tuesday, July 06, 2021
«António Carmo – Poesia e Trabalho» por Osvaldo Macedo de Sousa in «O Dia» de 9/11/1987
Enquanto uns se perdem na interioridade filosófica do profundo interior muitos procuram o reflexo do mundo pelo seu contorno exterior, sem se esvaziarem do conteudo e este é o caso de António Carmo, um desanhador que numa sintese pictórica, se entranha em barroquismos de forma.
Natural de Lisboa, fez o curso da Escola de Artes
Decorativas António Arroio, e desde 68 que desenvolve uma intensa actividade
pictórica, cenográfica / figurinista (Teatro Nacional de São Carlos) e
ilustrador. As exposições que realizou são multiplas, tanto em território
nacional, como no estrangeiro e esta exposição patente na Cooperativa de
Gravadores Portugueses não é um especial acontecimento pela raridade, mas pela
oportunidade de ver os últimos trabalhos deste artista popular.
O desenho é fundamental na sua obra, como transposição
da realidade em simbologias da vida, da mensagem poética de um quotidiano
reinventado na linearidade das formas num gosto «naif» de expressão. Há tempos
António Carmo descreveu-se como «sou um
pintor profundamente empenhado em reflectir as preocupações da minha época. Sou
um artista que transfigura o real que nos cerca e, também, em dar conteudo,
direi mágico, à nossa própria interioridade».
Esse conteudo, nesta exposição, é a Poesia e o
trabalho. Partindo da «Antologia Poética» (uma recolha assinada por José do
Carmo Francisco e Joaquim Pessoa), António Carmo transpôs algumas dessas
poesias para a simbologia pictórica, como é o caso de «A Mulher de Erva», de
José afonso: «Há quem viva / sem dar por nada (Há quem morra / sem tal saber
/Vende a fruta / Se queres comer». É, tal como afirma o catálogo, «uma maneira de abordar a realidade a partir
de visões diversas unificadas numa mesma poética».