Saturday, November 01, 2008

Escola do Riso em Coimbra - http://www.escoladoriso.com

 A Missão da Escola do Riso e promover o estudo, investigação, difusão e prática de Yoga do Riso, uma ferramenta muito eficaz para promover melhoria de saúde física e mental, reduzindo stress e encontrando a paz interior numa maneira lúdica e divertida.

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Tuesday, October 28, 2008

LOUIS HELLMAN - Prémio AmadoraCartoon 08 em exposição até 9 de Novembro nos Recreios da Amadora

Natural da Grã-Bretanha (1936), iniciou os seus estudos normais em 1947 no Cardinal Vaughan School, e arquitectura a partir de 1955 no Bartlett – UCL, complementados na Ecole des Beaux Arts de Paris. De 1963 a 67 trabalhou com Yorke Rosenberg Mardall; de 1967 a 72 no GLC/ILEA; de 1974 a 79 com Spastics Society (SCOPE) de Londres; e a partir de 1979 em atelier privado, especializando-se em edifícios para pessoas com deficiências.
O desenho é a arma principal de qualquer arquitecto, ultrapassando muitas das vezes o estirador do desenho técnico, e Hellman não se entregou apenas a complementar seus edifícios com designs de interior, mas com designs de irreverência pedagógica, desconstruindo o seu universo para melhor compreensão desse mundo. Por um lado à o Hellman investigador, com trabalhos sobre a historia, a evolução da arquitectura em artigos e estudos pedagógicos, por outro o humorista, porque não há verdadeiro pedagogo sem o olhar desconstrutivo da filosofia humorística.
Sua colaboração na imprensa espalha-se por periódicos como The Architect’s Journal, Building Design, Design Week, Build Environment, Progressive Architecture, Private Eye, The Observer, The Evening Standard, Punch, The Guardian, The Spectator, New Society, Euromoney, Access By Design… ou Architectural Review. Foi para esta ultima publicação que L.H. fez as caricaturas que motivaram o convite para a Amadora.
São as originalíssimas Archi-Tetes, criadas sob o efeito Arcimboldo, ou seja reconstruir a imagem do arquitecto com o auxílio do estilo, da obra criada pela própria vítima satirizada. Hellman explica-nos a ideia que está por detrás desta criação: “Penso que o que a arquitecturamoderna pertendia, era que o design fosse matéria de análise e de racionalização mas, obviamente, não é. Os arquitectos projectam de acordo com um determinado gosto pessoal, reflexo das suas próprias personalidades. Esta foi a ideia por detrás de Archi-Têtes. Os arquitectos são como os edifícios que projectam. Existe, actualmente, um interesse pelo antropomorfismo na arquitectura, a ideia que os edifícios têm caras, corpos além de fachadas. Todo o vocabulário arquitectónico está relacionado com a forma humana e utiliza metáforas para o corpo e para a natureza. Foi pois essa quantidade de elementos que surgem simultaneamente nestes trabalhos.”
Estas caricaturas foram reunidas em livro em 2000 com o titulo “Archi-tetes. The Id in the Grid” (Wiley/Academy), existindo contudo outras publicações anteriores como “A is for Architect” (Trend Publishing Singapore 1973); “All Hellman Breaks Loose” (Aecus Ltd, London 1980); “Architecture for Beginners” (Writers & Readers, London /USA 1986); “Do it with an Architect” (1999); “Architecture A to Z. A Rough guide” (Willey/Academy 2001) No âmbito de exibição publica de seus originais pode-se apontar a colaboração anual com a Royal Academy Summer Exhibitions desde 1989, ou exposições individuais: 1979 - Architectural Asociation, London; 1991 e 1993 Interbuild, NEC Birmingham; 1996 - Nasle; 1997 - Cambridge; 2000 - Soane Museum, London; 2001 – Barcelona (Espanha); 2005 – Col-legi d’Arquitectes de Catalunya – Lleida (Espanha); 2006 – Shrawsbury; 2008 – Amadora (Portugal).
Em 1983 recebeu um BEM pelos serviços à Arquitectura e um Honorary Degree pela Oxford Brookes University em 2002.
Em 2008 é homenageado no XIX FIBDA com o Prémio AmadoraCartoon 2008

EXÍLIO DE LEAL DA CÂMARA EM MADRID

HUMOR Y TURISMO FORÇADO
OU O EXÍLIO DE LEAL DA CÂMARA EM MADRID


Conferencia realizada a 25 de Outubro 2008 na Universidade de Granada, integrada no II Encuentro Internacional de Humoristas de Granada
Por: Osvaldo Macedo de Sousa

O turismo está na essência do Homem, mais não seja ir à esquina comprar tabaco ou tomar um copo com os amigos, tudo só para não se sedentarizar em casa.
Também se pode garantir cientificamente que o turismo está na génesis do Homem, visto a sua irreverência, a gula pelo conhecimento da maça, o ter colocado em turismo forçado para fora do Paraíso. Dizem os teóricos que a arvore da Sabedoria mais não era que o humor, e que a gargalhada que se verificou após a primeira dentada provocou o big-bang, e o mundo ficou tal como é hoje, uma grotesca bola de vida em crise financeira, crise familiar, crise politica ou crise religiosa, consoante o interesse e afinidades de cada um.
Vagueando pelo planeta, o Homem Sapiens foi visitando os melhores campos de caça, os mais belos recantos de abrigo… Sempre que a adversidade invadia o seu espaço, partia em turismo forçado para novos territórios.
A sedentarização, na realidade, não passou de um acto comercial no campo do turismo, já que com este acto político administrativo, criaram-se novas oportunidades de capitalização dos espaços, assim como novos empregos na hotelaria e agências de viagens. O poder assumiu o conceito de viagem como controle fronteiriço de produtos e matérias-primas, para além da vigilância das mentes pensantes ou, simplesmente, turísticas. Criaram-se, deste modo, estruturas de apoio e controle do turismo cultural, comercial e religioso.
Contrariamente, ao que muita gente pensa, o turismo não é uma moda contemporânea. Sempre existiu e os Romanos já comercializavam Guias de Viagem, guias turísticos sobre os pontos, os elementos importantes das principais rotas comerciais, religiosas ou de simples lazer.
Quanto aos turistas forçados, sempre existiram, já que o poder é algo que não combina muito bem com o espírito de irreverência, com o pensamento livre e curioso. Na história, estes turistas tiveram várias designações, como exilados, escravos…
Esta minha vinda a Granada é um acto de turismo não forçado, mas de grande prazer, porque para além de ser uma das terras mais belas da Ibéria, é uma região que recorda espaços de turismo, exílios, tolerância intercultural, irreverência, humor…
E cá estou eu, cá estamos nós neste Outono solarengo, período de castanha e vinho novo a comemorar a Semana Santa. Só mesmo os humoristas, é que poderiam ter criado tal confusão de tempos litúrgicos.
Não me pediram para falar sobre a “via crucis” dos humoristas, ou sobre as alegorias e paródias que o cartoonismo tem usado, ao longo da sua vida, para caricaturar a vida política. Não vou falar das flagelações, paixões, carpideiras, Herodes e Pilatos…
Por outro lado, só um humorista poderia ter escolhido a título da minha conferência. O que me foi pedido, no convite, foi uma palestra sobre algo que unisse, no estudo do humor, estes dois países irmãos na iberocidade. Em Portugal, publicaram-se trabalhos de alguns artistas espanhóis, mas nenhum viveu lá. Em Espanha, creio que nunca houve portugueses a colaborarem regularmente na imprensa noticiosa, ou a cá viver, excepto Leal da Câmara.
Este artista viveu Madrid durante dois anos. Amadureceu aqui como Homem e como Artista, seguindo depois para novos voos. Alguns contemporâneos dele garantem que foi uma presença importante e revolucionária que deixou marcas, influencias. Os investigadores actuais nem sequer referem o seu nome, a sua obra publicada por estas terras.
Resolvi pois vir cá falar sobre este artista, escolhendo como título “O Exílio de Leal da Câmara em Madrid”. Quando recebi o programa descobri que vinha conversar sobre o “Humor e Turismos Forçados”.
É verdade que o exílio é um turismo forçado e quando Leal da Câmara chegou a Madrid vinha em fuga forçada. Também é verdade que em Madrid ele não sobreviveu economicamente, apenas. Pelo contrário, procurou sorver a cultura, a riqueza pictórica dos seus museus, viver os ambientes tertulianos de discussão cultural, a boémia das irreverências, conhecer a sociedade espanhola, conhecer os seus tesouros, seus costumes, suas mulheres… Foi um verdadeiro turista a calcorrear as tertúlias, os teatros, os museus, as verbenas…
Quem é Leal da Câmara ? Tomás Júlio Leal da Câmara nasceu em Pangin - Nova Goa (Índia Portuguesa) a 30 de Novembro de 1876. Viveria até aos 6 anos na Índia, altura em que a família se muda para a metrópole, Lisboa. Pela actividade militar de seu pai, a sua vida sempre esteve moldada pelas saias da mãe, e esse poder ficou mais explícito a partir da morte do pai em serviço em Timor. Esta morte ao serviço de um regime que não lutava pelo seu império entre os grandes, que se acabrunhava perante a ignóbil Albion marcou profundamente a revolta do jovem Tomás Júlio.
Estávamos no início da década de noventa de oitocentos, em que os ânimos nacionalistas andavam exaltados contra a passividade, a subserviência dos governos perante os poderes externos. Em que a revolta germinava contra o imobilismo da nação, contra a usurpação dos dinheiros pela monarquia… A República surgia então como uma utopia alcançável, um projecto salvador para relançar o país no progresso, na soberania do seu império…
Dentro do núcleo das irreverências, das armas da oposição, a caricatura capitaneava na crítica jornalística, tendo como almirante da armada dos lápis litográficos, Raphael Bordallo Pinheiro, rodeado de muitos soldados, quase todos eles armados com o raphaelismo, como estilo dominante. A carreira de Raphael já tinha mais de duas décadas de lutas inglórias na imprensa, e o seu revolucionarismo naturalista dos anos 70, já se ia esmorecendo no cansaço, na divisão de seus interesses plásticos e de sobrevivência, transformando-se, cada vez mais, num academismo estético, e a sua sátira numa ironia cansada de criticar sempre os mesmos erros, as mesmas politicas, indiferentemente de que cara estivesse ao leme do governo.
Leal da Câmara é um estudante com o sangue na guelra, submetido a um poder materno que lhe pesa, por um lado, como uma opressão, por outro como um remorso de eterno agradecimento pelos sacrifícios feitos para lhe dar uma boa educação. Se o bom comportamento se mantém dentro do controle possível, para não sacrificar a mãe, o nervosismo da mão extravasa a revolta para a irreverência, e o seu traço rápido e nervoso está sempre engatilhado para disparar sobre quem merece, para rabiscar um papel, uma parede, uma pedra litográfica…
Em 1896 Celso Hermínio lança o seu “Berro” de revolta, um periódico que apesar de só ter publicado 18 nºs, será um marco de uma nova época satírica. A ironia raphaelista já não satisfazia os gostos dos jovens críticos ao regime, que desejavam avançar para a provocação directa, para a agressividade ideológica que incomodasse os passivos do regime e das oposições. Renasce então o espírito grotesco e panfletário que esteve na origem da sátira politica portuguesa, em tempos do cabralismo. Leal da Câmara inserir-se-á neste espírito como seu lema: “Comentar, causticando”.
Assim nesse ano de 1896, não aconteceu só o “Berro”. Leal da Câmara impor-se-á como uma promessa, como um novo valor satírico. Não nos referimos ao efémero “Inferno” de que ele foi director artístico, mas sim à sua colaboração em o “D. Quixote”, ao lado de Celso Hermínio e João Chagas. Este ultimo, jornalista e republicano activista, foi quem melhor explorou a irreverência destes dois artistas, para o combate que ele queria liderar.
Em 1897 colaborará em “Os Ridículos” e entra na nova aventura no Supl. Humorístico de “A Marselheza”, um projecto de João Chagas. Este último tinha no cabeçalho a gloriosa inscrição: o jornal “de maior circulação em todo o Governo Civil” (onde estava instalada a censura)
João Chagas, que é o verdadeiro mentor de “A Marselheza” escreverá: «Quem é pela monarquia está disposto a morrer com ela: quem é pela República, está disposto a morrer por ela. Cessou toda a propaganda. Entrou-se definitivamente numa fase de combate. Já não é de amigos, secretários ou aderentes que se precisa; é de soldados. Já não se reclamam palavras: reclamam-se armas…» E o lápis será uma grande arma. O batalhão de soldados, para além do jornalista e do desenhador, é composto pelos gráficos e pelos ardinas, todos eles vitimas da perseguição policial.
As apreensões serão constantes, por isso por vezes é necessário imprimir em vários locais, ser distribuído pelos ardinas mais rápidos para que o público consiga ler alguns exemplares. A policia, conhecida como formiga branca, ou fuinhas é pois um elemento vivo da vida do jornal, razão pela qual invade as suas páginas, instala-se no cabeçalho, nas margens… sendo um elemento decorativo de luta pela liberdade de expressão.
As instituições, os políticos decadentes de um rotativismo gasto e estagnado eram zurzidos pela crítica, mas num momento destes de guerrilha, o alvo tinha que ser mais personalizado, e para além dos governantes, o Rei perdeu o estatuto de Nação, para ser simplesmente um gordo esbanjador da riqueza do país, passou a ser um alvo directo da sátira panfletária. O Juiz Veiga não admitia tais insolências, proibindo, a certo momento, o acto de se caricaturar a família real. Nada melhor que uma interdição para aguçar o engenho e em consequência desta restrição nasceram algumas das melhoras caricaturas de Leal da Câmara. Como diria mais tarde Oliveira Salazar, «os verdadeiros pensadores, os que pensam, transpõem, sem ninguém dar por isso /…/ todas as limitações». Foi o que aconteceu – o chapéu à Mazantini, e uma série de objectos, como um barril… passaram a simbolizar o Sr. Proibido.
Apesar de toda a censura, apreensões, multas… “O Supl. Humorístico de A Marselheza”, passou a chamar-se simplesmente “Marselheza” o qual foi sobrevivendo até ao numero 57, morrendo por exaustão e por desinteresse do público já que, entretanto, em Maio de 1898, Leal da Câmara abandonou esta redacção fundando o seu próprio semanário, em parceria com o jornalista Gomes Leal. A batalha prossegue agora, não sob a bandeira do hino francês da liberdade, mas atacando directamente toda “A Corja” que governava o país, desde o Rei ao dirigentes partidários monárquicos, ministros… A primeira capa de A Corja era precisamente a caricatura do Rei feita com o retratos dos políticos que faziam a sua corte. Prossegue assim a sua batalha, com muita poesia revolucionária, lutando por ideais que raramente eram, totalmente, partilhados pelo grande público, antes por um pequeno grupo de idealistas.
A 16 de Dezembro de 1898 o nº17 é apreendido, acto que Câmara já pressentia, por isso tinha já um Suplemento preparado e lançado de imediato para denunciar mais este acto anti liberdade de expressão. Este acto foi a gota de água que os fuinhas esperavam para o caçarem e entregar ao Juiz Veiga. Uma nova Lei facilitava a prisão com julgamento sumário e o envio para a deportação. Felizmente que os republicanos tinham um sistema de defesa montado para se informarem dos acontecimentos antes deles se concretizarem, e assim tiveram tempo de o despachar para fora do país. Assim surge o primeiro exilado da caricatura em Portugal em finais do ano de 1898. Parte para um exílio de 11 anos.

Com a ajuda de cúmplices republicanos, foge para Madrid em Dezembro de 1898. No âmbito pessoal esta fuga para o exílio foi um desastre, mas no aspecto artístico foi uma sorte porque foi obrigado a visitar novos mundos, conhecer outros ambientes, beber de outras fontes estéticas levando-o para uma outra maturidade plástica, que nunca conheceria em terras lusas.


Partiu como exilado político de um movimento ideológico que lhe prometeu apoios em caso de imprevistos policiais, mas que depois só lhe deu apoio na compra do bilhete e na chegada a Madrid, entregando-o depois ao seu destino. Teve que se fazer à vida, lutar pela sobrevivência com as poucas armas que possuía – o desenho.
Como escreverá um dos seus biógrafos, Aquilino Ribeiro, ele foi logo instruído sobre o ambiente espanhol «que não professavam nenhuma simpatia séria pelos portugueses e consideravam Portugal o país da anedota».
«Madrid, de princípio, estarreceu-o – prossegue Aquilino Ribeiro – com as suas grandes artérias e palácios construídos para a prosápia castelhana. Faltava-lhe o ar comum, catitinha e piegas, que dá visco e compadrio às coisas de Lisboa, e essa falta bulia-lhe na alma. Mas que animação! Que ror de mulheres bonitas, estimulantes que nem malaguetas, alegres e vistosas como rosas no roseiral…»
Portugal, na Europa de então, era um atraso de sociedade e Madrid, apesar de na fachada parecer mais opulenta, acabava por ser muito menos pródiga, muito menos progressista do que se imaginava. No âmbito da caricatura, Portugal tinha um historial mais rico no domínio da qualidade de filosofia humorística e de artistas graficamente mais evoluídos. Por seu lado, Madrid possuía uma riqueza pictórica que nada se assemelhava com a pobreza do nosso país, a começar pela colecção d’ O Prado, acabando no movimento de jovens irreverentes que por lá andavam como Picasso, Sancha…
 Tomás Júlio aproveitou para beber, para devorar Goya, Velásquez, El Greco… já que pouco dinheiro tinha para devorar outras coisas. Inscreveu-se na Escola de Belas Artes onde frequentou algumas classes de Moreno Carbonero (artista natural daqui perto – Málaga), assim como frequentou outras Academias, onde predominaram as Academias dos Bares e Cafés onde havia tertúlias de artistas, onde podia executar livremente a sua arte. As tertúlias intelectuais foram o seu refúgio anti-depressivo e os cadernos de apontamentos a sua escola. Copia os grandes mestres, estuda as pinceladas, as cores, as perspectivas, o enquadramento… e nessa amálgama de conhecimentos ligados à sua irreverência caricatural cria um estilo, uma forma de estar que deslumbra Madrid.


O que ele mostra aos seus companheiros de tertúlias fascina-os, descobrindo uma segunda encarnação de Goya e todos querem ser retratados, caricaturados para a posteridade pelo pincel do jovem português. Os mestres da cultura madrilena como Benavente, Manuel del Palácios, Perêda, Sorolla, Benliure, , Compary, Manuel Rodriguez, Moreno Carbonero… todos personalidades de tão grande renome, como de bolsas vazias. «Aqui todos me tem tratado com muito carinho e pena é que não seja o país próspero e rico, onde se ganha muito dinheiro. Infelizmente não o é. /…/ O êxito dos meus pasteis foi estrondoso no meio intelectual, só há um contra: ter de trabalhar de graça. Esta classe de gente, literatos, periodistas, actores dramáticos, poetas e quejandos pagam com artigos, encómios, mas lá esportular-se em metal sonante não se fala, por muitas e várias razões, das quais a principal é esta, que andam sempre a tinir.»

Não lhe pagavam as caricaturas, mas abriram-lhe as portas de alguns jornais de índole cultural ou humorístico («periódicos que pagam mal… quando pagam»). Assim foi equilibrando a sua sobrevivência com colaborações para “La Vida Literária, “Almanach de La Vida Literária”, “Almanach de la Revista Vinícula”, “Madrid Cómico”, “Álbum Hispano Americano, “El Mundo Cómico” (Barcelona), “Illustraccion Americana y Española”, “Revista Moderna”, “La Revista Cómica e Taurina”, “El Imparcial”, “El Álbum”….. normalmente com caricaturas de personalidades da cultura ou charges costumbristas e de sátira internacional: «Não fazem senão insistir para que faça caricatura da política internacional». Claro que como estrangeiro a critica ao governo espanhol estava-lhe interdita. De todas as formas o facto de ter conseguido entrar em todos estes periódicos é notável, como ele próprio confessa à sua mãe: «É preciso notar que Espanha não é Portugal onde só há quatro caricaturistas. Aqui há dezenas em Madrid e todos eles buscam comprometer os outros porque não chega trabalho para tantos. O nome que eu tenho criado em Espanha é o que os franceses chamam um «tour de force» (sabe o que é?) e esse nome, sem modéstia devo dize-lo, já o consegui.»
São dois anos o tempo que se mantém em Madrid e, para sintetizar a sua evolução caricatural poderíamos dizer que em 1898 chegou um desenhador caricatural e em finais de 1900 partiu um pintor caricatural. O domínio do pastel, do óleo dera uma nova consistência ao seu trabalho, ao seu estilo que se situava entre o goyesco e o expressionismo ibérico.
Leal da Câmara, como já referi, não viveu em Madrid, mas sim viveu Madrid com toda a sua irreverência juvenil e múltiplas são as anedotas dessa vivência, mas não queria deixar de me referir a um acontecimento especial, pelas consequências que deixou no meio cultural espanhol, ou seja, o mito da perda do braço de um génio da cultura espanhola. Quem nos conta este episódio, é mais uma vez Aquilino Ribeiro: « ele foi dar a Madrid, ao tempo Abbaye Theleme de curiosas e simpáticas figuras nas letras e na política, Valle Inclan, Luís Bonafoux, Benavente, Pereda, Rubén Dario, Gomes Carrilho, Galanis, Sancha, etc., etc., pessoas que foram retratadas pela sua mão, e se podem ver na casa-museu da Rinchoa.

«Foi na sarrafusca duma tertúlia de arte e literatura que, por causa de Leal da Câmara, Valle Inclan, catedrática de estética, como se titulava nos bilhetes de visita, perdeu um braço. Ramon Gomez de la Serna conta num livro as sete maneiras, segundo as quais se deu «tão deplorando quanta heróico lance». O autor das “Sonatas” atribuía-lhe alta e epopaica origem, se bem que não pudesse comparar-se à da excelsa manchot de Lepanto, autor da D.Quixote. Afinal, a fonte do calamitoso sucesso estava num peguilho de que fora objecto Leal da Câmara, Valle Inclan havendo terçado por ele. Ferido, descurara o go1pe que, infectando-se, acabara por gangrenar-se. A estada de Leal da Câmara em Madrid teve largas e demoradas projecções.»
O caminho da pesquisa, do experimentalismo é sempre mais fácil quando há uma alma gémea com quem partilhar as duvidas, as incertezas e as ousadias. Em Portugal, Tomás Júlio teve em Celso Hermínio esse companheiro da descoberta da sátira panfletária, do republicanismo desenhado com revolta e alma. Em Madrid, o cúmplice no amadurecimento do traço pictórico, foi Francisco Sancha, um humorista da sociedade, um critico dos costumes, um observador do quotidiano: «Dou-me muito com um caricaturista espanhol chamado Sancha que tem um enorme talento e que é o único caricaturista espanhol. Não há outro hoje e não tem havido outro maior depois do grande Goya».

Francisco Sancha Lengo (Málaga 1874- Oviedo 1936) estudava com Moreno Carbonero onde Leal da Câmara o conheceu, e viveu depois algum tempo em Paris e em Londres. No humor dedicou-se à caricatura ou a desenhos de humor costumbrista, dedicando-se também à pintura, ilustração, desenho de móveis… Foi director da revista “Alegria”, colaborou em El Cardo, Madrid Cómico, La Vida Literaria, La Revista Moderna, Gedeón, Alegría!, El Sol, La Voz, Blanco y Negro, La Esfera, Abc, Le Cri de Paris, Frou-Frou, Le Rire…
Ambos trabalhavam numa constante pesquisa de apanhar a realidade grotesca do dia a dia, para poderem conquistar o seu espaço na imprensa madrilena: «Eu sou obrigado a ir a toda a parte, a teatros, a cafés, às verbenas (festas populares) enfim, a toda a parte. Ando sempre com um belo álbum na mão e sempre trabalho, copiando do natural muitíssimo, e só assim eu tenho conseguido um adiantamento tão sensível. Resultado é que para tudo isto é preciso dinheiro, e muito mais em Madrid, onde é tudo caríssimo. Cada álbum custam duas pesetas ou seja um cruzado e hás vezes em que um álbum fica cheio em dois dias.» Tomás Júlio seguia a melhor escola das artes, fazer a mão trabalhando, trabalhando.

Mesmo sem dinheiro, mas sempre com muitos sonhos e projectos ainda idealizou com Sancha a criação de um periódico que, naturalmente, ficou por um simples projecto. Em 1916 o critico de arte espanhol José Frances escreveria - no “El Año Artístico de 1916” - que Sancha e Leal da Câmara «juntos realizaram essa admirável missão de renovar por completo a caricatura espanhola. Porque Leal e Sancha foram os mais decididos inimigos daquele Madrid cómico, absurdo, que durante anos e anos se considerou como empório do génio e da arte /…/ Mais que a Sancha foi a Leal que os caricaturistas espanhóis, que então surgiram, imitaram. /…/ Leal da Câmara, apesar dos seus triunfos madrilenos, breve se cansou de viver em Madrid. Sobretudo de viver mal, porque nunca foram, e então menos de que nunca, um lápis e um espírito rebelde meios muito seguros para medrar em Espanha.»»
Entretanto Sancha parte para Paris com uma bolsa de estudo, e aí consegue trabalho no “Rire” e onde publica trabalhos do amigo Câmara. Entretanto, além deste jornal francês, Leal da Câmara consegue publicar um ou outro desenho em Itália, no Brasil e em Portugal ainda enviou desenhos para “O Diabo”.
Esta partida de Sancha motiva o nosso artista a ir também até essa cidade das artes, como escreve à mãe: «…E olhe, andava há muito, a acariciar a ideia duma passeata a Paris. A estada ali de uns meses só podia fazer-me bem e seria o coroamento feliz dos meus esforços. Escrevi esforços, e a Mamã não suspeita sequer a soma de energia que envolve esta expressão. Não foi um dia só nem dois que fiquei sem comer para poder pagar aos modelos e comprar material. Estas coisas tão molestas digo-lhas, querida Mamã, para que não pense mal de mim e não me suponha enterrado até o pescoço na vida airada. No entanto, creia que ninguém me vê senão de cara alegre, porque estas batalhas não se ganham chorando ou implorando a comiseração do nosso próximo. Tudo isto vem de intróito a eu querer-lhe dizer que o Imparcial, a maior gazeta de Espanha, me propôs ir a Paris fazer umas crónicas semanais para o suplemento das segundas-feiras, consagrado às letras. Olho para o Paris de monóculo, para o Paris o mais possível íntimo, o Paris por detrás das persianas e das fórmulas consabidas de Ville Lumiere, Bal Tabarin, metrópole das artes e letras, numa devassa galante, e cobro uns cem francos por cada artigo. Cem francos, parece muito dinheiro, e nada mais enganoso dada a vida que serei obrigado de levar em Paris, bem encasacado, batendo de tipóia, para poder entrevistar artistas, políticos, gente de clube e de botequim, colher em suma impressões vividas. Antes de partir - pois a Mamã está a adivinhar que aceitei - penso expor os meus últimos trabalhos…»


A sua primeira vontade não era ficar por lá, já que a sua situação profissional em Madrid se ia consolidando, enquanto que Paris era o voltar à estaca zero na luta pela sobrevivência económica, era o regresso à luta por um espaço num território já dominado e explorado por dezenas de grandes artistas. Mas, parece que foi essa luta que o motivou mais, como se pode depreender por estas suas palavras: «… a razão de estarem ali muitos burros facilita-me a entrada nesses jornais e a razão de estarem pessoas de talento, estimula-me para que faça alguma coisa melhor do que as que tenho feito até agora. Enfim, eu quero ir a Paris.»
Partiu para ver os ares e por lá ficou uma década. Rapidamente se impôs na cidade luz como um caricaturista de sucesso, mas o seu espírito curioso e investigador não o deixou adormecer no regaço do sucesso. Para além das questões técnicas ou estéticas (ele experimentou todas as correntes vanguardistas de então, inclusivamente o cubismo), o lado filosófico e social da arte vão-se impondo na sua pesquisa, O papel do artista na sociedade foi uma preocupação sua, levando-o para novos campos como o design de interiores, a decoração, a publicidade, a pedagogia artística. Contudo, o humor gráfico manteve-se como a âncora da sobrevivência.



Com a queda da monarquia, em Portugal em 1910, Leal da Câmara regressaria ao seu país para rever a família e amigos. Ficou quase quatro anos, apesar do regresso ter sido uma desilusão, já que não foi recebido com o carinho e a vontade de publicar desenhos que esperava. Eram novos tempos, e as revoluções nem sempre acarinhavam quem estragou a vida na luta por ela. Ninguém é profeta na sua terra.

Em 1914 tenta recuperar o seu lugar em Paris, mas novos ventos sopravam na Europa, e a Guerra impede-lhe o intento de permanecer em Paris. Perdido entre os dois mundos não tem outro remédio senão voltar para o seu país. Era um turista forçado em ambos os lados.
Intenta liderar o modernismo, intenta educar a caricatura para novos moldes de critica política, novas formas de encarar a arte. O pedagogo vai-se impondo cada vez mais. Não se sente bem estar a satirizar os ex-colegas de luta que são agora regime, que são agora governo. Foi colaborando em “Os Grotescos”, “A Águia”, “A Montanha”, “O Mundo”, “Capital”, “Ilustração Portuguesa”, “A Batalha”, “O Riso da Vitória”, “A Risota”, “Sempre Fixe”, “O Sol”… editou “O Miau”. Em Espanha manteve colaboração com “La Esfera, “España”, “El Zorro”. No Brasil colabora com “A Noite”…

Seria este último jornal que lhe proporcionaria uma nova aventura em Espanha. A ideia era entrevistar as figuras de relevo no campo cultural, político e social sobre a Guerra. Estas entrevistas realizadas em 1916, acabariam por serem, também, reunidas num livro chamado “Miren Ustedes”, em 1917.
Esta viagem foi também o reencontro de amigos que logo aproveitaram a sua presença para lhe pedirem uma conferência sobre um dos seus novos campos de batalha, a Publicidade Artística. Em Paris, tinha-se iniciado nessa actividade criativa e pedagógica, realizando diversas conferências sobre a nova arte da publicidade. Para Espanha realizou diversas campanhas publicitárias encomendadas pela revista Mundo Gráfico (Jabon Flores del Campo). Assim em 1916, já que estava em Madrid, pedem-lhe que faça uma palestra sobre a Arte da Publicidade. Esta realizou-se no Ateneu Cientifico Y Literário Y Artístico de Madrid. Quem fez as apresentações foi Garcia Gaudriz: «Leal da Câmara, todos lo sabeis, es un espanol, ha sido un madrileno. Todas las primeras firmas de nuestra juventud le tutean y mañana mismo van a congregarse para festejarle como merece, como al camarada que regresa al hogar. Pasó por Madrid Leal da Cámara influyendo en nuestra vida, dando un matiz nuevo y una expressión insólita a la caricatura nacional, después se marchó a Francia, donde continuó colaborando con compatriotas nuestros, entre otros Paco Sancha, y allí higo célebre su nombre por todo el mundo. Quien no conoce los periódicos que el fundó y, entre otras cosas menudas é interesantisimas, esa colección de postales de los soberanos de Europa, que ha recorrido y que forma el piso intimo de tantos y tantos estudios y saloncitos? »

Leal da Cámara, como hé dicho, ha influido ya una vez en la vida española; ahora viene, a influir de nuevo. Esta noche, antes que nada, pretende influir en los intelectuales y en los artistas el deseo de salir a la calle, el deseo de dejar la torre de marfil, el deseo de querer la vida…»
Da conferência e seu tema reza assim o próprio: «Expliquei depois o que já tivera ocasião de explicar em múltiplas conferências em Portugal, isto é, o estudo da Publicidade sob o ponto de vista psíquico, e não me esqueci de apresentar o gráfico que mostra os principais estados de alma por que passa um freguês, a partir da indiferença inicial até ao acto da compra, e desenvolvi o que sabem todos os que se dedicam à psicologia, ou sejam várias maneiras de despertar e fixar a atenção, de provocar o interesse, de fazer nascer o desejo e de determinar a vontade.»
Se foi importante para o mundo da publicidade espanhola não sei. Em Portugal acabaria por nunca ser acarinhado e a sua sobrevivência foi quase um acto de caridade em o deixar ser professor de artes e ofícios para as meninas que frequentavam a escola industrial.


Espanha, grata pelo seu contributo artístico ainda o chamaria em 1944 a Madrid para o nomear Membro de Honra do Circulo de Artes de Madrid, onde lhe foi oferecido um jantar de honra com os velhos amigos e novos admiradores.
Viria a morrer a 21 de Julho de 1948 na sua casa da Rinchoa (arredores de Lisboa) onde deixou criada a sua Casa-Museu.
Leal da Câmara foi um turista forçado não só em Madrid, também o foi na sua terra, já que sempre foi um irreverente, por isso uma pessoa incómoda porque via a arte não como um diletantismo, mas como uma ferramenta de pedagogia.Se ele nos deixou um magnifico legado de obras geniais que fazem o registo do seu tempo, fazem o registo da história dos homens de uma forma descarnada, mais importante é o seu legado em descrever o Humor como a suprema arte da pedagogia: «O humorismo é se deter à beira do caminho e desse lugar contemplar a vida que vai correndo».


Monday, October 27, 2008

Inauguração do AmadoraCartoon 2008 nos Recreios da Amadora

A secção Portuguesa é composta pela obra dos caricaturistas Carlos Laranjeira, Pê (Pedro Ribeiro Ferreira) e Ricardo Galvão com caricaturas do mundo da ficção cientifica futebolistica
O Director do Festival Nelson Dona discursando com a presença dos tres artistas do Vereadpr e demais convidados. Quem faltou fui eu mesmo que apesar de ser o Comis´´ario do AmadoraCartoon tive que me ausentar para ir a Granada representar o país e fazer uma conferencia. Peço desculpa aos artistas, mas o mais importante é a sua obra, só espero que o publico da Amadora e do Festival visitem a exposição que está patente ao publico até 9 de Novembro nos Recreios da Amadora




Os Humoristas presentes em Granada


Eu recebendo o Diploma de Enbajador Honorário

Osvaldo de Sousa, Marçal, Pep Roy Gomez, Kap, Enrique, Rodrigo de Matos e Cabañas


Os Humoristas Presentes em Granada






Granada foi terra de homenagens e nomeações

Os Humoriats presentes foram Nomeados Embajadores Honorários de Granada pela Concejaria de Turismo
Diploma que me nomea Sócio Honorário da FECO Portugal, diploma esse entregue em Granada após a minha conferencia sobre Leal da Câmara e seu trabalho em Madrid durante o seu exílio



Granada e o II Encuentro de Humoristas



A Feco Portugal resolveu surpreender-me em terras Granadinas com uma nova distinção, Sócio-Honorário da FecoPortugal. Enchem-me de mimos...
Osvaldo de Sous fazendo sua conferencia sobre Humor e Turismo Forçado . O Exílio de Leal da Câmara em Madrid
Manuel Freira cativou os humoristas copm suas canções de irreverencia, de humor, de intervenção...
Um pedaço do recital/aula-de-poesia de Manuel Freire em Granada:
http://www.youtube.com/watch?v=v2AXsH_miaQ






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