Saturday, November 17, 2007
O MODERNISMO PEL'O HUMORISMO (3ª parte)
Por: Osvaldo Macedo de Sousa
1912
Não podemos separar as artes do contexto revolucionário das modificações sociais durante o séc. XIX e XX. Tanto a Revolução Francesa, como a Revolução Industrial atingiram profundamente os conceitos, as ideologias, e as posturas tanto do artista como do público.
O Homem ao destruir o Antigo Regime com a Revolução Francesa, pôs em causa uma série de leis, ideologias e laços sociais que regiam até então, as relações humanas. Com a Revolução Industrial, a sociedade criou uma relação trabalho/trabalhador, capitalista/operário que nunca tinha existido. O Homem libertou-se de uma relação feudalista, do absolutismo aristocrático, dos "direitos divinos", para de novo se escravizar numa relação monetária, no absolutismo capitalista, nos "direitos económicos". Ao aristocrata sucedeu o burguês.
A sociedade em crise, que viria a sar parte da morte de Deus, é constituída por grupos de Homens que perdendo o rumo milenar das relações, partem à deriva do tempo, do espaço, da nova estrutura social. A técnica e a Industria transformaram-lhe a paisagem, a cidade, o consumo vivencial, mudaram-lhe a visão do mundo, que se transforma, que vive numa aceleração contínua, que se altera de minuto a minuto.
As revoluções tecnológicas deram o maior contributo para esta alteração, com especial destaque para uma máquina chamada fotográfica.
A fotografia nasceu das mãos de caricaturistas e pintores que investigavam uma nova forma de fixar o que viam. Conseguiram-no. A máquina fixava o que o Homem desejáva, mas nem sempre como idealizava. Isso levou-o a novas investigações, ao estudo da luz e suas refracções, das perspectivas… e notou que cada indivíduo, do mesmo assunto e com o mesmo aparelho, cria imagens diferentes. É que toda a imagem, fotográfica ou não, encarna um modo de ver. E quando olhamos algo, estabelecemos uma relação pessoal entre as coisas e nós próprios.
Outra contribuição para a criação de uma nova visão do mundo, foi dada pelo desenvolvimento das técnicas de impressão. Com a lithografia, a zincografia, a gravura nas suas várias técnicas, e finalmente a silk-screen, ou seja a serigrafia… a reprodução democratizou a arte, destruiu-lhe a sacralidade do único, porque a tornou múltipla, e mais acessível.
Para além destes factores, a imprensa deu ao artista um meio de subsistência, remunerando-o pela sua colaboração, e divulgando-lhe parte das obras (gráficas). A imprensa dá continuidade ao papel do artista plástico como testemunha da vida. Se antes servia para cronista e glorificação do Aristocrata, da Igreja, agora passa a cronista de toda a sociedade.
Ao mesmo tempo a imprensa fornece-lhe um campo onde as experiências formais eram "totalmente" permitidas. Desta simbiose, de estética, técnica gráfica e cronista, nasceram novos géneros como a ilustração, o desenho satírico, a banda desenhada…
No campo social, a "libertação revolucionária" fez com que o artista perdesse, em parte, a sua "identidade social", visto ele ser, de novo, um artesão que tem de vender o seu trabalho no mercado burguês, e não responder a encomendas de protectores. A arte passou a ser uma simples mercadoria, dependente da lei da procura, dos gostos do povo/burguesia… O artista em crise de identidade torna-se um rebelde, um político e um filósofo, gritando por uma arte ao serviço da sua sociedade ideal, ou então por uma sociedade à medida da sua arte.
A arte, para este criador do séc. XIX já não pode permanecer dentro dos conceitos estáticos da tradição Renascentista, dentro da concepção espacial "numérica, cenográfica e estática" (como definiu Francastel), sentindo que pelo contrário tinha que viver, criar uma estrutura aberta e dinâmica.
Como dirá mais tarde G. Braque - «Não se deve imitar o que se deseja criar. Não se imitam as aparências; a aparência é o resultado. Para ser imaginação pura, a pintura deve esquecer a aparência. Trabalhar do natural é improvisar.»
Esta foi uma das principais conquistas do Homem do séc. XIX, "destruir" o que vê para o reconstruir, para o recriar à sua medida.. Uma descoberta que afinal só tinha sido perdida, porque como nos diz Paul Gauguin, «a arte primitiva parte do espírito e serve-se da natureza. A denominada arte refinada parte da impressão sensorial e serve a natureza, assim caimos no erro do realismo. /…/ A arte é abstracção. Tomai da natureza o que dela vejais em vossos sonhos.»
O artista passou a ser um Homem em busca do seu sonho, passou a ser um investigador. Destruidas, ou tentando destruir as velhas linguagens da arte, ele procura um novo código linguístico, uma estrutura analítica que fosse auto-suficiente frente à realidade exterior.
Este caminho, cheio de interrogações e dúvidas existenciais, numa constante procura de compreender se era possível a formação de uma arte representativa da sua época, fez a separação Homem/Artista, isolou artistas entre artistas, isolou-os da sociedade. O artesão, que tinha que concorrer para Mestre, com o domínio pleno das técnicas e da criatividade, dá lugar ao criador-mestre pela irreverência, ousadia, e por vezes descaramento.
A luta que era principalmente contra a burguesia, contra a sua moral neo-aristocrática absolutista, a sua visão académico-conservadora, o seu mercado, levou uma parte dos artistas a fecharem-se sobre si mesmos, já que o proletário não era acessível, tanto no nivel económico, como no cultural, de forma a compreender o porquê destes novos caminhos de ousadia, destas novas visões estéticas que pareciam contra-natura. O artista isolou-se numa "mensagem" de autor para autor, numa "visão" pessoal, mas aberta às múltiplas interpretações, ou para simples gozo visual. Para triunfo destas correntes foi fundamental o papel de um novo ser intelectual, o crítico, que se assume como o tradutor da obra, o filósofo da existência plástica.
Resumindo, desde o iluminismo afirma-se a autonomia das artes, assim como se coloca o problema da sua função dentro da nova sociedade. Desenvolve-se então a filosofia da arte-estética, numa procura contínua da relação do indivíduo com a colectividade, ao mesmo tempo que a individualidade tenta não se diluir na multiplicidade.
Os ideais cognitivos, religiosos e morais são substituídos pela estética, ficando por resolver a sua relação com as demais actividades humanas. A arte passa a ser uma visão pragmática da crítica de arte.
Por outro lado, tanto na sociedade como na arte, o sentimento de identidade individual acentua-se e difunde-se. A fotografia será um elemento importante nesta dinãmica de difusão social da imagem, do esforço da personalidade em se afirmar numa nova sociedade sem classes perfeitamente definidas. A imagem torna-se numa necessidade de demonstrar a existência, de se verificar o Eu.
A vontade acentuada de individualização, a necessidade de ruptura entre gerações como afirmação do indivíduo caracterizam a nova sociedade.
O rápido desenvolvimento tecnológico, leva a uma continua mudança das orientações estéticas. Dessa forma defende-se que o mundo não é para se admirar, mas para o viver. A natureza não é objecto, mas motivo estético, sentimento. A emoção torna-se no cerne da criatividade, para além da estrutura. A arte explora a técnica pela decomposição da visão, contuso a técnica se abstratiza na emoção, defendendo-se a liberdade individual do artista.
Se por um lado verificamos uma agudização na pesquisa estética, seja técnica, plástica ou emocional, numa constante ruptura geracional de ismos, caminhando-se para uma forte individualização conceptual da criação estética, no triunfo do Eu absoluto e abstracto. Por outro ficou por resolver a dicotomia entre criação Arte-Estética e Arte Funcional. A solução mais fácil, e mais preguiçosa, foi consagrar a primeira como Arte Maior, ou Arte Séria, e as outras como Artes Menores.
O caminho das artes menores é no fundo muito mais interessante, já que não é um percurso de meia dúzia de pessoas que vivem os seus problemas isolados da Sociedade Geral, sem se interessarem por eles, vivendo à margem. As Artes Menores são as verdadeiras Artes Contemporâneas, já que vivem por um lado as mesmas preocupações de irreverência, ousadia e progresso tecnológico que as ditas Artes Maiores, mas que ao mesmo tempo estão em constante diálogo com a sociedade, refreando por vezes as ousadias para poder acompanhar os gostos da sociedade, acelerando por vezes os gostos da sociedade com as suas ousadias.
O artista do séc. XIX e XX, para além da questão de funcionalidade da sua arte, teve também que, como sendo agora um homem comum, de ter posições políticas definidas, e dessa forma usar a sua arte como um testemunho das lutas políticas, ou politizando-se e virando as costas à sociedade como a maioria dos ditos artistas das Artes Maiores.
Nas artes politizadas a moral influencia o modo de ver a realidade. A imagem não é a simples representação de um facto, mas o juízo que se pode dar dele. A vontade moral abre perspectivas ao conhecimento, à mensagem.
1912
Não podemos separar as artes do contexto revolucionário das modificações sociais durante o séc. XIX e XX. Tanto a Revolução Francesa, como a Revolução Industrial atingiram profundamente os conceitos, as ideologias, e as posturas tanto do artista como do público.
O Homem ao destruir o Antigo Regime com a Revolução Francesa, pôs em causa uma série de leis, ideologias e laços sociais que regiam até então, as relações humanas. Com a Revolução Industrial, a sociedade criou uma relação trabalho/trabalhador, capitalista/operário que nunca tinha existido. O Homem libertou-se de uma relação feudalista, do absolutismo aristocrático, dos "direitos divinos", para de novo se escravizar numa relação monetária, no absolutismo capitalista, nos "direitos económicos". Ao aristocrata sucedeu o burguês.
A sociedade em crise, que viria a sar parte da morte de Deus, é constituída por grupos de Homens que perdendo o rumo milenar das relações, partem à deriva do tempo, do espaço, da nova estrutura social. A técnica e a Industria transformaram-lhe a paisagem, a cidade, o consumo vivencial, mudaram-lhe a visão do mundo, que se transforma, que vive numa aceleração contínua, que se altera de minuto a minuto.
As revoluções tecnológicas deram o maior contributo para esta alteração, com especial destaque para uma máquina chamada fotográfica.
A fotografia nasceu das mãos de caricaturistas e pintores que investigavam uma nova forma de fixar o que viam. Conseguiram-no. A máquina fixava o que o Homem desejáva, mas nem sempre como idealizava. Isso levou-o a novas investigações, ao estudo da luz e suas refracções, das perspectivas… e notou que cada indivíduo, do mesmo assunto e com o mesmo aparelho, cria imagens diferentes. É que toda a imagem, fotográfica ou não, encarna um modo de ver. E quando olhamos algo, estabelecemos uma relação pessoal entre as coisas e nós próprios.
Outra contribuição para a criação de uma nova visão do mundo, foi dada pelo desenvolvimento das técnicas de impressão. Com a lithografia, a zincografia, a gravura nas suas várias técnicas, e finalmente a silk-screen, ou seja a serigrafia… a reprodução democratizou a arte, destruiu-lhe a sacralidade do único, porque a tornou múltipla, e mais acessível.
Para além destes factores, a imprensa deu ao artista um meio de subsistência, remunerando-o pela sua colaboração, e divulgando-lhe parte das obras (gráficas). A imprensa dá continuidade ao papel do artista plástico como testemunha da vida. Se antes servia para cronista e glorificação do Aristocrata, da Igreja, agora passa a cronista de toda a sociedade.
Ao mesmo tempo a imprensa fornece-lhe um campo onde as experiências formais eram "totalmente" permitidas. Desta simbiose, de estética, técnica gráfica e cronista, nasceram novos géneros como a ilustração, o desenho satírico, a banda desenhada…
No campo social, a "libertação revolucionária" fez com que o artista perdesse, em parte, a sua "identidade social", visto ele ser, de novo, um artesão que tem de vender o seu trabalho no mercado burguês, e não responder a encomendas de protectores. A arte passou a ser uma simples mercadoria, dependente da lei da procura, dos gostos do povo/burguesia… O artista em crise de identidade torna-se um rebelde, um político e um filósofo, gritando por uma arte ao serviço da sua sociedade ideal, ou então por uma sociedade à medida da sua arte.
A arte, para este criador do séc. XIX já não pode permanecer dentro dos conceitos estáticos da tradição Renascentista, dentro da concepção espacial "numérica, cenográfica e estática" (como definiu Francastel), sentindo que pelo contrário tinha que viver, criar uma estrutura aberta e dinâmica.
Como dirá mais tarde G. Braque - «Não se deve imitar o que se deseja criar. Não se imitam as aparências; a aparência é o resultado. Para ser imaginação pura, a pintura deve esquecer a aparência. Trabalhar do natural é improvisar.»
Esta foi uma das principais conquistas do Homem do séc. XIX, "destruir" o que vê para o reconstruir, para o recriar à sua medida.. Uma descoberta que afinal só tinha sido perdida, porque como nos diz Paul Gauguin, «a arte primitiva parte do espírito e serve-se da natureza. A denominada arte refinada parte da impressão sensorial e serve a natureza, assim caimos no erro do realismo. /…/ A arte é abstracção. Tomai da natureza o que dela vejais em vossos sonhos.»
O artista passou a ser um Homem em busca do seu sonho, passou a ser um investigador. Destruidas, ou tentando destruir as velhas linguagens da arte, ele procura um novo código linguístico, uma estrutura analítica que fosse auto-suficiente frente à realidade exterior.
Este caminho, cheio de interrogações e dúvidas existenciais, numa constante procura de compreender se era possível a formação de uma arte representativa da sua época, fez a separação Homem/Artista, isolou artistas entre artistas, isolou-os da sociedade. O artesão, que tinha que concorrer para Mestre, com o domínio pleno das técnicas e da criatividade, dá lugar ao criador-mestre pela irreverência, ousadia, e por vezes descaramento.
A luta que era principalmente contra a burguesia, contra a sua moral neo-aristocrática absolutista, a sua visão académico-conservadora, o seu mercado, levou uma parte dos artistas a fecharem-se sobre si mesmos, já que o proletário não era acessível, tanto no nivel económico, como no cultural, de forma a compreender o porquê destes novos caminhos de ousadia, destas novas visões estéticas que pareciam contra-natura. O artista isolou-se numa "mensagem" de autor para autor, numa "visão" pessoal, mas aberta às múltiplas interpretações, ou para simples gozo visual. Para triunfo destas correntes foi fundamental o papel de um novo ser intelectual, o crítico, que se assume como o tradutor da obra, o filósofo da existência plástica.
Resumindo, desde o iluminismo afirma-se a autonomia das artes, assim como se coloca o problema da sua função dentro da nova sociedade. Desenvolve-se então a filosofia da arte-estética, numa procura contínua da relação do indivíduo com a colectividade, ao mesmo tempo que a individualidade tenta não se diluir na multiplicidade.
Os ideais cognitivos, religiosos e morais são substituídos pela estética, ficando por resolver a sua relação com as demais actividades humanas. A arte passa a ser uma visão pragmática da crítica de arte.
Por outro lado, tanto na sociedade como na arte, o sentimento de identidade individual acentua-se e difunde-se. A fotografia será um elemento importante nesta dinãmica de difusão social da imagem, do esforço da personalidade em se afirmar numa nova sociedade sem classes perfeitamente definidas. A imagem torna-se numa necessidade de demonstrar a existência, de se verificar o Eu.
A vontade acentuada de individualização, a necessidade de ruptura entre gerações como afirmação do indivíduo caracterizam a nova sociedade.
O rápido desenvolvimento tecnológico, leva a uma continua mudança das orientações estéticas. Dessa forma defende-se que o mundo não é para se admirar, mas para o viver. A natureza não é objecto, mas motivo estético, sentimento. A emoção torna-se no cerne da criatividade, para além da estrutura. A arte explora a técnica pela decomposição da visão, contuso a técnica se abstratiza na emoção, defendendo-se a liberdade individual do artista.
Se por um lado verificamos uma agudização na pesquisa estética, seja técnica, plástica ou emocional, numa constante ruptura geracional de ismos, caminhando-se para uma forte individualização conceptual da criação estética, no triunfo do Eu absoluto e abstracto. Por outro ficou por resolver a dicotomia entre criação Arte-Estética e Arte Funcional. A solução mais fácil, e mais preguiçosa, foi consagrar a primeira como Arte Maior, ou Arte Séria, e as outras como Artes Menores.
O caminho das artes menores é no fundo muito mais interessante, já que não é um percurso de meia dúzia de pessoas que vivem os seus problemas isolados da Sociedade Geral, sem se interessarem por eles, vivendo à margem. As Artes Menores são as verdadeiras Artes Contemporâneas, já que vivem por um lado as mesmas preocupações de irreverência, ousadia e progresso tecnológico que as ditas Artes Maiores, mas que ao mesmo tempo estão em constante diálogo com a sociedade, refreando por vezes as ousadias para poder acompanhar os gostos da sociedade, acelerando por vezes os gostos da sociedade com as suas ousadias.
O artista do séc. XIX e XX, para além da questão de funcionalidade da sua arte, teve também que, como sendo agora um homem comum, de ter posições políticas definidas, e dessa forma usar a sua arte como um testemunho das lutas políticas, ou politizando-se e virando as costas à sociedade como a maioria dos ditos artistas das Artes Maiores.
Nas artes politizadas a moral influencia o modo de ver a realidade. A imagem não é a simples representação de um facto, mas o juízo que se pode dar dele. A vontade moral abre perspectivas ao conhecimento, à mensagem.
Thursday, November 15, 2007
Mortadelo y Filemón cumplen 50 años
El aniversario se celebra con la edición del 'Gran Libro' de las aventuras de los agentes de la T.I.A
Mortadelo y Filemón, los célebres agentes de la T.I.A creados por Ibáñez, cumplen medio siglo de vida. Para celebrarlo, Ediciones B ha editado un libro conmemorativo que repasa las diferentes etapas por las que han pasado los "agentes especiales". El volumen cuenta con un prólogo del cineasta Alex de la Iglesia, quien se confiesa devoto admirador del dibujante y de sus geniales personajes.
A finales de 1957 Ibáñez terminó la primera historieta de Mortadelo y Filemón, que apareció publicada en la revista Pulgarcito al año siguiente. A partir de aquí, y durante los años sesenta, Ibáñez trabajó para diferentes revistas e inició un periodo de enorme creatividad.
La década de los sesenta fue especialmente prolífica. En 1961 se publicó la primera historieta de "13, Rue del Percebe" y dos años más tarde la de "El botones Sacarino". En 1964 llegó la primera entrega de "Rompetechos", "Pepe Gotera y Otilio" y "El sulfato atómico", la primera historieta larga en formato de álbum con una cuidada realización de guión y dibujo.
En 1970 nació la revista Mortadelo, a la que siguieron publicaciones como Mortadelo especial, Mortadelo gigante, Super Mortadelo, y las ediciones especiales de sus aventuras en las colecciones Olé, Magos del humor y Super humor. En esta misma época, las historietas de "Mortadelo y Filemón" fueron traducidas a once idiomas.
En 1985 Ibáñez dejó Editorial Bruguera para pasar a Grijalbo y tres años después regresó a Ediciones B, donde "Mortadelo y Filemón" volvió a editarse con regularidad.En 1994 el dibujante recibió el Gran Premio del Salón del Cómic al conjunto de su obra y en 2002 fue distinguido con la Medalla de Oro al Mérito en las Bellas Artes. En ese mismo año, publicó dos de los títulos más celebrados: "Misión Triunfo" y "El estrellato".
O MODERNISMO PEL'O HUMORISMO (2º parte)
Por: Osvaldo Macedo de Sousa
1908/9
Tudo começou em 1908 no Liceu de Coimbra, onde estudavam Christiano Shepard Cruz (Leiria 189 ), Fernando Correia Dias ( 189 ), e Cerveira Pinto (Coimbra 1893), e que entram num projecto de edição do jornal do liceu, assumindo os dois primeiros o cargo de Director artístico nos primeiros números, e posteriormente o terceiro artista. O jornal foi "O Gorro", e durou apenas meia dúzia de números.
Mas, em Dezembro de 1909 este grupo de artistas irreverentes surge reunido com um outro artista a estudar direito na Universidade, Luíz Filipe Rodrigues (Melgaço 188), o qual surge como Director Artístico do jornal "A Farça".
Alberto Meira, nos anos trinta (na revista "Prima", em artigo sobre Luíz Filipe) escreverá: «Na realização da caricatura em Portugal marcou um ponto estranho a tudo quanto até então se produzia no género, e despreocupada falange de humoristas novos, que em Coimbra, cerca de 1910, se apresentava nas páginas duma revista da especialidade, infelizmente de curta duração.»
Estes quatro artistas são, para mim os introdutores do Modernismo em Portugal, já que entraram em ruptura com a escola naturalista, optando pela síntese expressionista (de influência germânica). Verificamos em suas obras a estilização dos registos miméticos, a liberdade abstratisante da mancha, a sintetização do discurso plástico e consequente anulação da perspectiva. São artistas livres, que fogem aos dogmas do ensino académico, às imposições dos mestres. Ele não publicaram qualquer manifesto, nem procuraram os críticos numa Galeria para receberem os seus consentimentos ou críticas, apenas lançaram para o público, um público mais vasto que os que frequentavam galerias de Arte, a sua obra.
Quatro artistas isolados, aos quais se juntará, por curto espaço de tempo (1910), um outro jovem de nome José de Almada Negreiros (São Tomé 189 ) de passagem pelo Liceu local, que ainda sem uma base teórica referenciada, têm já consciência de uma ruptura que desejavam, não só com o passado, mas com o presente.
Um dos academismos dominantes, da escola raphaelista, era o uso da sátira política, com identificação personalizada dos intervenientes, da farpas enviadas. O humor não era crítico ao regime, mas ao indivíduo, à identidade.
Este grupo opta por um humor irónico à sociedade, aos sistemas. Á velha chalaça política, apresentam como alternativa um humor mundano na estilização da vida citadina, com os seus contrastes entre pobreza e riqueza, sem nunca deixarem de serem anti-clericalistas, e de sagrarem o triunfo da mulher moderna, com a sua independência, a sua beleza, as suas formas ondulantes.
De "A Farça" saíram apenas seis números, mas tanto este como "O Gorro" foram uma lufada de ar fresco de humor e modernidade na imprensa humorística, onde reinavam os velhos "Supl. Humorístico de O Século", "Os Ridículos", "O Xuão"… Duraram o suficiente para chamarem a atenção sobre o traço destes artistas, que de imediato começaram a ser convidados para colaborarem em "O Povo", "A Revolta", "Jornal de Arganil", "A Lucta"… duraram o suficiente para influenciarem artistas como M. Pacheco, João Valério, Stuart Carvalhais, Hipolito Collomb…
Como escreverá André Brun, no Catálogo do Salão dos Humoristas de 1913, «O Humorismo, desde que for a reconhecido, baptizado e deitado à margem da arte séria, for a sempre vivendo, e se bem que o não vissem senão sob o aspecto d'um garoto da rua, gracioso e impertinente, ia criando músculos e caminhando com serenidade.
/…/ Um dia - o de hoje - a Arte chegou enfim a uma franca simplicidade. Despiu-se de todos os falsos atavios que séculos tinham ido sobrepondo sobre a nudez deslumbrante e já não busca iludir com grandes gestos, mas convencer com raciocínio. Reduzir a vida às equações claras e positivas, e quando a arte, professada por pontífices solenes e académicos, chegou a esta meta, encontrou, esperando-a tranquilamente e olhando-a com um sorriso, o Humorismo. Esse que ela sempre tomara, até então, por um gaiato irreverente, verificou-se que for a quem sempre conduzira o facho da verdade.»
A Caricatura, ou como a partir de agora se vai generalizar, o Desenho de Humor, ou Humorismo assume a liderança da ruptura, da irreverência estética.
1910
Na sequência das edições ligadas a este percurso do Modernismo-Humorismo gráfico, ainda em 1910 encontramos a revista "Límia", de Viana do castelo (terra onde vivia a família de Luíz Filipe, o qual é o elo de ligação), para onde todos estes quatro enviarão trabalhos.
É nesta revista que encontramos, pela mão de Luíz Filipe, a notícia da primeira baixa do modernismo, a notícia da morte do jovem artista Cerveira Pinto, que contava apenas 16 anos em Setembro de 1910, quando morre em Coimbra.
Este ano é o fim prematuro do Grupo de Coimbra, com o desaparecimento de Cerveira Pinto por morte, pelo destacamento do pai de Christiano Cruz, militar, para Lisboa, e no ano seguinte, com o finalizar do Curso de Direito, o regresso a Luíz Filipe ao Minho. Ficará apenas Correia Dias na cidade dos estudantes.
A vinda de Christiano Cruz para Lisboa vem despoletar a irreverência modernista na capital, congregando à sua volta uma geração de jovens insatisfeitos. Como dirá Jorge Barradas…. «Lhe demos o lugar primeiro…»
Este artista veio para Lisboa em consequência da implantação da República, golpe revolucionário que naturalmente modificara profundamente toda uma estrutura social, que dará alento ás novas ideias, à irreverência, ao sonho de uma sociedade nova. O modernismo era um sonho adequado a esta nova sociedade…
1911
Desse alento surgirá em Março a Exposição Livre, organizada por jovens estudantes emigrados, como bolseiros, e que desejam quebrar as amarras com as escolas, os Mestres académicos que dominam o ensino das Belas Artes em Portugal. Como já referi, as obras apresentadas pouco têm de modernidade, apenas a filosofia de intenções da organização da exposição se pode considerar moderna. Na realidade não conseguiram qualquer ruptura estética.
Desse mesmo alento, nasce a revista humorística "A Sátira", propriedade de um humorista de traço académico, mas que chama para a Direcção um jovem irreverente de nome Stuart Carvalhais, como será um espaço aberto às obras dos jovens modernistas, como Christiano Cruz, Correia Dias, Luíz Filipe, Almada Negreiros, M. Pacheco (ver mais nomes)
Publicará também obras de académicos já consagrados, como do seu proprietário Joaquim Guerreiro. Para além de ser um novo item editorial do percurso do Modernismo-Humorismo, a sua curta duração (quatro números) deu como fruto duas iniciativas importantes neste percurso: o regresso do único artista exilado por questões políticas, Leal da Câmara; a criação da Sociedade dos Humoristas Portugueses.
Leal da Câmara, como já referi, foi um dos primeiros artistas portugueses a entrar em ruptura com o academismo naturalisto-raphaelista. Por razões políticas, o regime tentará deportá-lo, mas este foge, primeiro para Madrid, depois para Paris. Em ambas as cidades triunfará.
Câmara conseguirá um lugar de destaque no meio caricatural francês, assim como desenvolverá actividade no design gráfico, e design de interiores como pedagogo e criativo. Totalmente integrado no meio cultural, não se dará com os jovens bolseiros portugueses, mas conviverá com outros imigrantes, como Picasso, com quem participará em exposições colectivas. Leal da Câmara, como depois Amadeo de Souza-Cardoso, foi o artista que viveu mais próximo dos grandes movimentos da vanguarda europeia do princípio do século.
Quando se verifica o derrube da monarquia, todos pensavam que ele regressaria de imediato do exílio, mas porquê vir-se enterrar de novo no fim do mundo, quando tinha uma carreira esplêndida no centro do universo cultural ?
Para a juventude ele era uma referência, um ídolo de irreverência, e foi essa juventude, reunida à volta de "A Sátira", que o conseguirá convencer a cá voltar. Convidaram-no para uma série de conferências e exposições.
Mal chegou, foi homenageado com um jantar, que os jovens 'esqueceram-se' de pagar. Ficou o Menu, uma preciosidade com uma série de auto-caricaturas de Christiano Cruz, Almada Negreiros, Stuart Carvalhais, Hipólito Collomb, Menezes Ferreira…
Inicia entretanto um ciclo de conferências em Lisboa, e em diversos pontos do país sobre "A Arte Útil", "O Humorismo e o Satirismo", "O Movimento Anti-Clerical e a parte tomada pela Caricatura Universal nesta campanha"… O panfletário republicano dava lugar ao pedagogo sobre as artes humorísticas e decorativas. Como complemento às suas palavras, existia a sua obra, com a qual realizará uma série de exposições: em 1911 expõe no "Grémio Literário, assim como no Teatro Nacional, onde em 1912 realizará nova exposição.
Dos catálogos destes exposições gostaria destacar uma frase de Coelho de Carvalho, que faz a introdução num deles, e no qual afirma: «…Leal da Câmara, grande na composição caricatural, e, sobretudo, como pintor impressionista de paisagens e retratos.» Noutro o artista dispensa elogios alheios, e é ele próprio que escreve a introdução, onde afirma: «Como vê, há uma certa quantidade de desenhos coloridos por vários sistemas - aguarela, pastel, óleo, verniz, pasteis oleosos, etc.»
«Por eles verá a tendência que tenho, como quasi todos os desenhadores modernos, de integrar nos simples desenhos as noções que antigamente só se utilizavam na pintura propriamente dita.»
«O Caricaturista, como terá visto pelos trabalhos dos meus colegas em outras exposições e por esta mesma, não encontra assumpto exclusivamente na política.»
«A rua com os seus typos, o campo com os seus costumes, a paysagem com os seus tons, os livros dos nosso melhores escriptores com as suas ideias de génio que só esperam ilustração, são tantos outros assuntos que interessam e impressionam o caricaturista.»
«São algumas d'essas impressões que lhes mostro n'esta exposição.»
****
«Ao fundo do salão, verá o meu caro visitante alguns moveis.»
«Eles não teem a pretenção de ser obra d' Arte e muito menos a de servirem de ensinamento à Industria nacional.»
«São, simplesmente, móveis que toda a gente pode fazer.»
«Não é ao rico, portanto, que eu dedico esta parte da exposição porque esse pode adquirir facilmente o mobiliário que lhe convêm.»
«Dedico estes móveis feitos do mais democrático pinho, à observação d' aqueles que teem pouco e que sentem a necessidade de crearem uma casa pobre mas correspondente aos seus desejos d' Arte.»
«/…/ É necessário, urgente mesmo, que os artistas da minha terra estudem este problema e que o Estado ou a Industria particular se occupem dela.»
«Em pouco tempo, graças a estes esforços combinados, haverá talvez em Portugal um mobiliário barato e as casas modestas tomarão pouco a pouco aspectos mais sadios.»
«Os explendidos motivos d' Arte decorativa que são o património da nossa raça portugueza, poderiam servir de base a esses futuros mobiliários e, se estes tarecos que exponho despertarem em um único visitante a ideia de chamar um carpinteiro e construir na sua casa uma mesa, uma cadeira ou uma estante, diferentes das que lhe são impostas pela tyrania do vendedor avulso. Dar-me-hei por satisfeito porque d' esse dia em deante esse visitante amará a sua casa, desejará embelezal-a, sentirá a necessidade fe ler, de estudar o problema do seu conforto - de progredir portanto - e dará o mais salutar exemplo que possa ser dado aos pequeninos observadores que são as criancinhas seus filhos, para os quaes a desordem e a falta de gosto doméstico são o peor dos trenos moraes.»
Da relação de obras nestes catálogos são curiosos alguns títulos, como:"O meu retrato pela nova escola Cubista", "Estampa Simili Japoneza - O domador de feras", "Blague Impressionista"…
A situação de Leal da Câmara na introdução do modernismo é bizarra, porque ele é um exemplo que os jovens modernistas respeitam e admiram; ele é um artista que pela sua obra está já distanciado do academismo, incorpora nos seus trabalhos elementos das novas vanguardas, nomeadamente do impressionismo, do expressionismo, do fauvismo… sendo as suas exposições de 11 e 12 muito mais de ruptura que os chamados Livres. Contudo manter-se-á sempre à margem da onda irreverente dos jovens.
De todas as formas foi incisiva a sua presença, nesta dinâmica. Para além da sua obra pedagógica, através das conferências, o simples montar das exposições, segundo os críticos da época, é já uma ruptura com o passado. Aquilino Ribeiro escreverá em "A Ilustração Portuguesa": «Ao mesmo tempo que Leal da Câmara exibia os seus trabalhos, ensinava a arte de armar uma exposição. Até ali os quadros estiravam-se pelas quatro paredes duma sala, a esmo, singularmente como os editais no átrio duma repartição pública.»
Para além deste facto a apresentação da caricatura como pintura a óleo, pastel, num mundo em que domina a tinta da china e a aguarela obriga os mestres académicos a ter maior respeito por esta arte. Por outro lado há uma grande necessidade de afirmação de A Arte como elemento integrante da educação do povo.
Christiano Cruz, como o Teórico do Modernismo-Humorismo defenderá em 19 … que se não se pode enviar o povo….
E o maior desalento de Leal da Câmara, quando resolve regressar a Paris em 1913 (?), é precisamente a falta de estrutura educacional e cultural da nossa sociedade. Como ele escreverá «…ainda não havia lugar para artistas; um homem de letras é um boémio; um pintor, escultor, desenhador, profissionais mais ou ,menos parasitários. Um desenho não se chama vinheta, cul de lampe, caricatura, retrato, chama-se um boneco; todos nós lá vivemos por favor; somos tolerados; falta meterem-nos a matricula na mão.»
O segundo elemento, onde "A Sátira" exerceu função crucial, foi a criação da Sociedade dos Humoristas Portugueses pelo grupo de artistas que se reuniam para levar avante aquela revista.
Esta sociedade, apesar de ter como principais motores os jovens modernistas, por razões económicas, e de credibilidade foi parcialmente dominada pelos conservadores. Monetariamente, porque quem suportava a revistas, as reuniões, e toda a estrutura era Joaquim Guerreiro, um caricaturista endinheirado, mas na linha raphaelista. Dominada pelos conservadores pela força do traço de Francisco Valença, pelo sombra tutelar dos Bordallos Pinheiro, na figura de Manuel Gustavo… De todas as formas a actividade deste grupo só se fará sentir em 1912.
1908/9
Tudo começou em 1908 no Liceu de Coimbra, onde estudavam Christiano Shepard Cruz (Leiria 189 ), Fernando Correia Dias ( 189 ), e Cerveira Pinto (Coimbra 1893), e que entram num projecto de edição do jornal do liceu, assumindo os dois primeiros o cargo de Director artístico nos primeiros números, e posteriormente o terceiro artista. O jornal foi "O Gorro", e durou apenas meia dúzia de números.
Mas, em Dezembro de 1909 este grupo de artistas irreverentes surge reunido com um outro artista a estudar direito na Universidade, Luíz Filipe Rodrigues (Melgaço 188), o qual surge como Director Artístico do jornal "A Farça".
Alberto Meira, nos anos trinta (na revista "Prima", em artigo sobre Luíz Filipe) escreverá: «Na realização da caricatura em Portugal marcou um ponto estranho a tudo quanto até então se produzia no género, e despreocupada falange de humoristas novos, que em Coimbra, cerca de 1910, se apresentava nas páginas duma revista da especialidade, infelizmente de curta duração.»
Estes quatro artistas são, para mim os introdutores do Modernismo em Portugal, já que entraram em ruptura com a escola naturalista, optando pela síntese expressionista (de influência germânica). Verificamos em suas obras a estilização dos registos miméticos, a liberdade abstratisante da mancha, a sintetização do discurso plástico e consequente anulação da perspectiva. São artistas livres, que fogem aos dogmas do ensino académico, às imposições dos mestres. Ele não publicaram qualquer manifesto, nem procuraram os críticos numa Galeria para receberem os seus consentimentos ou críticas, apenas lançaram para o público, um público mais vasto que os que frequentavam galerias de Arte, a sua obra.
Quatro artistas isolados, aos quais se juntará, por curto espaço de tempo (1910), um outro jovem de nome José de Almada Negreiros (São Tomé 189 ) de passagem pelo Liceu local, que ainda sem uma base teórica referenciada, têm já consciência de uma ruptura que desejavam, não só com o passado, mas com o presente.
Um dos academismos dominantes, da escola raphaelista, era o uso da sátira política, com identificação personalizada dos intervenientes, da farpas enviadas. O humor não era crítico ao regime, mas ao indivíduo, à identidade.
Este grupo opta por um humor irónico à sociedade, aos sistemas. Á velha chalaça política, apresentam como alternativa um humor mundano na estilização da vida citadina, com os seus contrastes entre pobreza e riqueza, sem nunca deixarem de serem anti-clericalistas, e de sagrarem o triunfo da mulher moderna, com a sua independência, a sua beleza, as suas formas ondulantes.
De "A Farça" saíram apenas seis números, mas tanto este como "O Gorro" foram uma lufada de ar fresco de humor e modernidade na imprensa humorística, onde reinavam os velhos "Supl. Humorístico de O Século", "Os Ridículos", "O Xuão"… Duraram o suficiente para chamarem a atenção sobre o traço destes artistas, que de imediato começaram a ser convidados para colaborarem em "O Povo", "A Revolta", "Jornal de Arganil", "A Lucta"… duraram o suficiente para influenciarem artistas como M. Pacheco, João Valério, Stuart Carvalhais, Hipolito Collomb…
Como escreverá André Brun, no Catálogo do Salão dos Humoristas de 1913, «O Humorismo, desde que for a reconhecido, baptizado e deitado à margem da arte séria, for a sempre vivendo, e se bem que o não vissem senão sob o aspecto d'um garoto da rua, gracioso e impertinente, ia criando músculos e caminhando com serenidade.
/…/ Um dia - o de hoje - a Arte chegou enfim a uma franca simplicidade. Despiu-se de todos os falsos atavios que séculos tinham ido sobrepondo sobre a nudez deslumbrante e já não busca iludir com grandes gestos, mas convencer com raciocínio. Reduzir a vida às equações claras e positivas, e quando a arte, professada por pontífices solenes e académicos, chegou a esta meta, encontrou, esperando-a tranquilamente e olhando-a com um sorriso, o Humorismo. Esse que ela sempre tomara, até então, por um gaiato irreverente, verificou-se que for a quem sempre conduzira o facho da verdade.»
A Caricatura, ou como a partir de agora se vai generalizar, o Desenho de Humor, ou Humorismo assume a liderança da ruptura, da irreverência estética.
1910
Na sequência das edições ligadas a este percurso do Modernismo-Humorismo gráfico, ainda em 1910 encontramos a revista "Límia", de Viana do castelo (terra onde vivia a família de Luíz Filipe, o qual é o elo de ligação), para onde todos estes quatro enviarão trabalhos.
É nesta revista que encontramos, pela mão de Luíz Filipe, a notícia da primeira baixa do modernismo, a notícia da morte do jovem artista Cerveira Pinto, que contava apenas 16 anos em Setembro de 1910, quando morre em Coimbra.
Este ano é o fim prematuro do Grupo de Coimbra, com o desaparecimento de Cerveira Pinto por morte, pelo destacamento do pai de Christiano Cruz, militar, para Lisboa, e no ano seguinte, com o finalizar do Curso de Direito, o regresso a Luíz Filipe ao Minho. Ficará apenas Correia Dias na cidade dos estudantes.
A vinda de Christiano Cruz para Lisboa vem despoletar a irreverência modernista na capital, congregando à sua volta uma geração de jovens insatisfeitos. Como dirá Jorge Barradas…. «Lhe demos o lugar primeiro…»
Este artista veio para Lisboa em consequência da implantação da República, golpe revolucionário que naturalmente modificara profundamente toda uma estrutura social, que dará alento ás novas ideias, à irreverência, ao sonho de uma sociedade nova. O modernismo era um sonho adequado a esta nova sociedade…
1911
Desse alento surgirá em Março a Exposição Livre, organizada por jovens estudantes emigrados, como bolseiros, e que desejam quebrar as amarras com as escolas, os Mestres académicos que dominam o ensino das Belas Artes em Portugal. Como já referi, as obras apresentadas pouco têm de modernidade, apenas a filosofia de intenções da organização da exposição se pode considerar moderna. Na realidade não conseguiram qualquer ruptura estética.
Desse mesmo alento, nasce a revista humorística "A Sátira", propriedade de um humorista de traço académico, mas que chama para a Direcção um jovem irreverente de nome Stuart Carvalhais, como será um espaço aberto às obras dos jovens modernistas, como Christiano Cruz, Correia Dias, Luíz Filipe, Almada Negreiros, M. Pacheco (ver mais nomes)
Publicará também obras de académicos já consagrados, como do seu proprietário Joaquim Guerreiro. Para além de ser um novo item editorial do percurso do Modernismo-Humorismo, a sua curta duração (quatro números) deu como fruto duas iniciativas importantes neste percurso: o regresso do único artista exilado por questões políticas, Leal da Câmara; a criação da Sociedade dos Humoristas Portugueses.
Leal da Câmara, como já referi, foi um dos primeiros artistas portugueses a entrar em ruptura com o academismo naturalisto-raphaelista. Por razões políticas, o regime tentará deportá-lo, mas este foge, primeiro para Madrid, depois para Paris. Em ambas as cidades triunfará.
Câmara conseguirá um lugar de destaque no meio caricatural francês, assim como desenvolverá actividade no design gráfico, e design de interiores como pedagogo e criativo. Totalmente integrado no meio cultural, não se dará com os jovens bolseiros portugueses, mas conviverá com outros imigrantes, como Picasso, com quem participará em exposições colectivas. Leal da Câmara, como depois Amadeo de Souza-Cardoso, foi o artista que viveu mais próximo dos grandes movimentos da vanguarda europeia do princípio do século.
Quando se verifica o derrube da monarquia, todos pensavam que ele regressaria de imediato do exílio, mas porquê vir-se enterrar de novo no fim do mundo, quando tinha uma carreira esplêndida no centro do universo cultural ?
Para a juventude ele era uma referência, um ídolo de irreverência, e foi essa juventude, reunida à volta de "A Sátira", que o conseguirá convencer a cá voltar. Convidaram-no para uma série de conferências e exposições.
Mal chegou, foi homenageado com um jantar, que os jovens 'esqueceram-se' de pagar. Ficou o Menu, uma preciosidade com uma série de auto-caricaturas de Christiano Cruz, Almada Negreiros, Stuart Carvalhais, Hipólito Collomb, Menezes Ferreira…
Inicia entretanto um ciclo de conferências em Lisboa, e em diversos pontos do país sobre "A Arte Útil", "O Humorismo e o Satirismo", "O Movimento Anti-Clerical e a parte tomada pela Caricatura Universal nesta campanha"… O panfletário republicano dava lugar ao pedagogo sobre as artes humorísticas e decorativas. Como complemento às suas palavras, existia a sua obra, com a qual realizará uma série de exposições: em 1911 expõe no "Grémio Literário, assim como no Teatro Nacional, onde em 1912 realizará nova exposição.
Dos catálogos destes exposições gostaria destacar uma frase de Coelho de Carvalho, que faz a introdução num deles, e no qual afirma: «…Leal da Câmara, grande na composição caricatural, e, sobretudo, como pintor impressionista de paisagens e retratos.» Noutro o artista dispensa elogios alheios, e é ele próprio que escreve a introdução, onde afirma: «Como vê, há uma certa quantidade de desenhos coloridos por vários sistemas - aguarela, pastel, óleo, verniz, pasteis oleosos, etc.»
«Por eles verá a tendência que tenho, como quasi todos os desenhadores modernos, de integrar nos simples desenhos as noções que antigamente só se utilizavam na pintura propriamente dita.»
«O Caricaturista, como terá visto pelos trabalhos dos meus colegas em outras exposições e por esta mesma, não encontra assumpto exclusivamente na política.»
«A rua com os seus typos, o campo com os seus costumes, a paysagem com os seus tons, os livros dos nosso melhores escriptores com as suas ideias de génio que só esperam ilustração, são tantos outros assuntos que interessam e impressionam o caricaturista.»
«São algumas d'essas impressões que lhes mostro n'esta exposição.»
****
«Ao fundo do salão, verá o meu caro visitante alguns moveis.»
«Eles não teem a pretenção de ser obra d' Arte e muito menos a de servirem de ensinamento à Industria nacional.»
«São, simplesmente, móveis que toda a gente pode fazer.»
«Não é ao rico, portanto, que eu dedico esta parte da exposição porque esse pode adquirir facilmente o mobiliário que lhe convêm.»
«Dedico estes móveis feitos do mais democrático pinho, à observação d' aqueles que teem pouco e que sentem a necessidade de crearem uma casa pobre mas correspondente aos seus desejos d' Arte.»
«/…/ É necessário, urgente mesmo, que os artistas da minha terra estudem este problema e que o Estado ou a Industria particular se occupem dela.»
«Em pouco tempo, graças a estes esforços combinados, haverá talvez em Portugal um mobiliário barato e as casas modestas tomarão pouco a pouco aspectos mais sadios.»
«Os explendidos motivos d' Arte decorativa que são o património da nossa raça portugueza, poderiam servir de base a esses futuros mobiliários e, se estes tarecos que exponho despertarem em um único visitante a ideia de chamar um carpinteiro e construir na sua casa uma mesa, uma cadeira ou uma estante, diferentes das que lhe são impostas pela tyrania do vendedor avulso. Dar-me-hei por satisfeito porque d' esse dia em deante esse visitante amará a sua casa, desejará embelezal-a, sentirá a necessidade fe ler, de estudar o problema do seu conforto - de progredir portanto - e dará o mais salutar exemplo que possa ser dado aos pequeninos observadores que são as criancinhas seus filhos, para os quaes a desordem e a falta de gosto doméstico são o peor dos trenos moraes.»
Da relação de obras nestes catálogos são curiosos alguns títulos, como:"O meu retrato pela nova escola Cubista", "Estampa Simili Japoneza - O domador de feras", "Blague Impressionista"…
A situação de Leal da Câmara na introdução do modernismo é bizarra, porque ele é um exemplo que os jovens modernistas respeitam e admiram; ele é um artista que pela sua obra está já distanciado do academismo, incorpora nos seus trabalhos elementos das novas vanguardas, nomeadamente do impressionismo, do expressionismo, do fauvismo… sendo as suas exposições de 11 e 12 muito mais de ruptura que os chamados Livres. Contudo manter-se-á sempre à margem da onda irreverente dos jovens.
De todas as formas foi incisiva a sua presença, nesta dinâmica. Para além da sua obra pedagógica, através das conferências, o simples montar das exposições, segundo os críticos da época, é já uma ruptura com o passado. Aquilino Ribeiro escreverá em "A Ilustração Portuguesa": «Ao mesmo tempo que Leal da Câmara exibia os seus trabalhos, ensinava a arte de armar uma exposição. Até ali os quadros estiravam-se pelas quatro paredes duma sala, a esmo, singularmente como os editais no átrio duma repartição pública.»
Para além deste facto a apresentação da caricatura como pintura a óleo, pastel, num mundo em que domina a tinta da china e a aguarela obriga os mestres académicos a ter maior respeito por esta arte. Por outro lado há uma grande necessidade de afirmação de A Arte como elemento integrante da educação do povo.
Christiano Cruz, como o Teórico do Modernismo-Humorismo defenderá em 19 … que se não se pode enviar o povo….
E o maior desalento de Leal da Câmara, quando resolve regressar a Paris em 1913 (?), é precisamente a falta de estrutura educacional e cultural da nossa sociedade. Como ele escreverá «…ainda não havia lugar para artistas; um homem de letras é um boémio; um pintor, escultor, desenhador, profissionais mais ou ,menos parasitários. Um desenho não se chama vinheta, cul de lampe, caricatura, retrato, chama-se um boneco; todos nós lá vivemos por favor; somos tolerados; falta meterem-nos a matricula na mão.»
O segundo elemento, onde "A Sátira" exerceu função crucial, foi a criação da Sociedade dos Humoristas Portugueses pelo grupo de artistas que se reuniam para levar avante aquela revista.
Esta sociedade, apesar de ter como principais motores os jovens modernistas, por razões económicas, e de credibilidade foi parcialmente dominada pelos conservadores. Monetariamente, porque quem suportava a revistas, as reuniões, e toda a estrutura era Joaquim Guerreiro, um caricaturista endinheirado, mas na linha raphaelista. Dominada pelos conservadores pela força do traço de Francisco Valença, pelo sombra tutelar dos Bordallos Pinheiro, na figura de Manuel Gustavo… De todas as formas a actividade deste grupo só se fará sentir em 1912.
Tuesday, November 13, 2007
O MODERNISMO PEL'O HUMORISMO (parte 1)
Por: Osvaldo Macedo de Sousa
A História escrita é uma visão facciosa dos homens, que impregnados de uma outra vivência, procuram olhar o passado com a mente enriquecida pelo tempo, pelo espaço.
É facciosa porque apesar de se dizer objectivo, o historiador, como homem comum, está viciado culturalmente por opções conceptuais e ideológicas.
É facciosa porque o tempo cria perspectivas, e leituras inexistentes na época. Factos, acontecimentos que no momento passaram despercebidos, foram insignificantes, mas que com a análise dos historiadores de hoje, tornaram-se fulcrais.
Naturalmente, pelas razões atrás descritas, eu sou mais um historiador faccioso, e aceito que a minha visão dos factos analisados possa ser criticada, e acusada de sectarista. É mais uma visão, mais uma opção de análise entre tantas.
O período sobre o qual nos vamos debruçar, é um dos momentos mais interessantes da nossa história cultural, e um dos mais difíceis de narrar objectivamente. Nela entram em jogo múltiplos interesses (literários, plásticos, sociais), múltiplas pretensões (ideológicas e estéticas), múltiplos interpretes.
Contudo, é necessário ter consciência de que os factos de relevo que narraremos, aconteceram sem que a maioria da população tivesse tomado conhecimento deles. Para além dos intervenientes, apenas uma parca centena de indivíduos tomaram consciência dos factos, tiveram uma posição crítica.
Por outro lado, existe uma dificuldade terminológica, já que tanto os conceitos de Humorismo, como de Modernismo, Futurismo… não são muito claros no nosso meio, e têm variado ao correr dos tempos.
Ora, precisamente neste período de 1909/1919, vai haver uma procura de nova posição perante o humor e a estética, e será nossa intenção conseguir distingui-las.
Antes do mais será necessário destrinçar a evolução cronológica da entrada do dito modernismo em Portugal. A maioria dos historiadores elege a data de 5 de Março de 1911 (inauguração da Exposição Livre) como momento de ruptura com o passado naturalista, e início de uma nova fase estética, dita posteriormente modernista.
A 5 de Março de 1911, oito jovens artistas, todos a estudarem no estrangeiro como bolseiros, apresentam trabalhos seus no Salão Bobone, uma Casa de Fotografias que abriu o seu espaço como a primeira Galeria de Arte privada. Os artistas são Manuel Bentes, e mentor e coordenador do grupo, acompanhado por Francis Smith, Domingos Rebelo, Francisco Alvares Cabral, Alberto Cardoso, Eduardo Viana, Emmérico Nunes, e o brasileiro Roberto Colin.
O argumento que dá força interventora a esta exposição, é o objectivo de irreverência geracional contra os mestres académicos das Belas Artes Nacionais, que está na raiz da organização do evento, e a reacção teórica de Manuel Bentes, que perante as críticas desfavoráveis. Declara então a nova postura "moderna" (infelizmente apenas numa opção filosófica) destes artistas: «A Arte não tem sistemas, tem emoções /…/ Queremos ser livres ! Fugimos aos dogmas do ensino, às imposições dos mestres, e , quando possível, às influências das escolas, porque cremos que os artistas têm uma só escola - a Natureza; um dogma único - o Amor".»
Na realidade a única irreverência desta exposição foi a postura contra os mestres, já que as obras apresentadas pouco tinham de modernidade, de ruptura com o passado, e entre todos destacar-se-ia apenas Emmérico Nunes, pela sua irreverência humorística.
A 6 de Março de 1911 inaugurou, na Academia de Belas Artes de Lisboa, uma outra exposição de jovens bolseiros a viverem em França. Porque é que a maioria dos historiadores ignorou esta exposição? Ela surgiu como resposta da Academia à postura de confronto de Manuel Bentes, e nele encontraremos tanto ou mais ousadia estética que na outra, já que entre os expositores estavam os bolseiros Francisco Franco, Henrique Franco, José Campas, Dórdio Gomes e Santa-Rita. Esta exposição não tinha objectivos estéticos, ou ideológicos por parte dos artistas, mas incorporava dois nomes que posteriormente marcarão o nosso modernismo, principalmente o último que será depois uma das vozes mais irreverentes da década.
Estes artistas, não só não impressionaram os seus contemporâneos que aqui só conheciam a rotina, como mereciam a crítica e o desdém de quem lá for a procurava realmente novos caminhos para a arte. Amadeo de Souza-Cardoso, em carta enviada de Paris a um tio seu, acusa «os amigos compatriotas, que marcham numa rotina atrasada. Arte é bem outra coisa que quase toda a gente pensa, é bem mais que muita gente julga. Tudo quanto para aqui se faz é medíocre, aparte raras coisas.»
Pela força dos factos, os historiadores foram obrigados a aceitar os humoristas como uma parcela motora do modernismo, apontando o Salão dos Humoristas de 1912 como o segundo passo na introdução do modernismo. Esta iniciativa é coadjuvada com a realização da primeira exposição individual de Almada Negreiros, principalmente porque esta mereceu uma crítica assinada pelo poeta Fernando Pessoa.
Esquecem-se eles que o humorismo já à vários anos vivia em ruptura com o passado naturalista, vivia em irreverência estética, em ousadia de caricatura moderna.
Porquê esta constante separação entre géneros artísticos? Porquê essa dificuldade facciosa de olhar as artes como um todo? Porquê essa necessidade de divisão em sectores da criação plástica? Esse facciosismo não é uma posição apenas contemporânea, e Leal da Câmara já na época (em conferência em 1912), sentiu a necessidade de denunciar que a «…raça de dominadores /…/ tem desejado fazer de papões diante dos pobres artistas sem defesa e decidiram do alto da sua infabilidade que a caricatura não era uma Arte !Eu não sei com que compasso mágico ou com que centímetro misterioso mediram eles a distância que separa a Arte Séria da Arte Cómica.
Eu só sei que certos destes artistas sérios têm feito caricaturas admiráveis e que vários caricaturistas têm conseguido fazer obras mestras de pintura e de escultura que forçaram a admiração dos próprios críticos.
Chego a acreditar que a Arte não é o apanágio de uma teoria, de uma formula ou de um processo, mas a universal manifestação do desejo de Beleza, de Correcção e de Progresso.
Não há arte séria e não existe arte cómica. Há somente uma Arte como há uma só Natureza, como há só Amor e não deveria existir senão uma Justiça.
São as manifestações de esta Arte suprema que são diferentes, mas a essência é sempre a mesma admirável Natureza que faz vibrar temperamentos diferentes.»
(Curiosamente encontramos os mesmos elementos defendidos por Manuel Bentes em 1911 - Natureza e Amor)
Será precisamente uma nova postura perante a criação e a "utilidade" da arte que revolucionou a estética, que rompeu com o passado, e criou uma nova arte para uma nova sociedade baseada na velocidade, na tecnologia, no progresso e na democracia (segundo os elementos ideológicos de liberdade, igualdade e fraternidade).
Portugal nunca foi um grande centro criativo das vanguardas culturais, mas, principalmente no campo literário, conseguiu acompanhar medianamente as correntes europeias (por vezes com alguns anos de atraso…)
Apesar de geograficamente pertencermos à Europa, a existência do 'tampão' Espanha, que também nunca foi um centro de vanguardas, obrigou-nos a um maior esforço de adaptação aos novos ventos. A implementação da imprensa após o triunfo do liberalismo, facilitou as comunicações, e as influências. Para além da imprensa, o desenvolvimento da gravura, e da caricatura foram outros elementos fundamentais, e através deles teremos conhecimento quase imediato do realismo e do naturalismo, assim como será fácil a introdução do romantismo. Todas estas são correntes estéticas que se quadunam perfeitamente com as nossas "deformações rácicas" intrínsecas.
A Caricatura, definição que abrangia todo o desenho de humor de imprensa, foi uma arte fundamental ao longo de todo o séc. XIX, seja no plano estético, seja no social e político. Através dela, verificou-se a introdução das estéticas realistas e naturalistas (onde a família Bordallo Pinheiro terá um papel fundamental com Manuel Maria, Raphael, Columbano, Manuel Gustavo), assim como será motor de introdução do gosto "Art nouveau" (por Manuel Gustavo, Simões Jr., …) e do expressionismo (por Celso Hermínio e Leal da Câmara)…
Através da caricatura, a necessidade de individualismo da sociedade triunfante (uma das características da nova sociedade moderna), com a sobrevalorização do retrato-charge, e do retrato litográfico impõe-se. Foi moda em alguns jornais humorísticos, a primeira página apresentar retratos litográficos das individualidades locais e nacionais.
Através da caricatura solidificou-se uma postura burguesa de estar na sociedade, de fazer política, de fazer modas.
Tal como na pintura, a naturalismo, principalmente pelo génio de Raphael Bordallo Pinheiro impõe-se primeiro como academismo de um estilo. Esse academismo, para além do docilidade do traço, era acompanhado de um maneirismo ironista de sátira. Contudo, a sociedade evoluía em confronto cada vez mais agudo com o regime, com o sistema. A Monarquia era cada vez mais contestada, e o Republicanismo grassava. Na década de noventa, de oitocentos, esse confronto agudiza-se com uma série de escândalos políticos e económicos (os monopólios), assim como com o Ultimatum Inglês, que fere profundamente o orgulho nacional.
Para apoiar uma nova campanha panfletária contra o regime, surgem Celso Hermínio e principalmente Leal da Câmara, que utilizam um traço sintético, anguloso e agressivo do tipo expressionista. Para além desta linha estética, verifica-se uma alteração de comportamento satírico, desviando o alvo dos políticos, e dos partidos, para o Rei (que até então tinha sido quase sempre poupado), e para as instituições que o representavam directamente no regime, como a polícia e a Censura. Esta é pré-ruptura 'modernista' com o naturalismo, e aconteceu cerca de 1896 a 1900.
Paris era a Capital das Artes, e o sonho de qualquer artista era partir para viver nesse farol civilizacional, mesmo que fosse apenas para se enriquecer tecnicamente no academismo. Era o que acontecia com a maioria dos bolseiros portugueses, como lamenta Amadeo de Souza-Cardoso, em carta familiar de 1910 - «Hoje os artistas preocupam-se com a realidade, pretendem imitar a natureza como se ela fosse imitável, não sentem emoções grandes, porque são neutras de nascença as suas almas - em suma, é o ocaso duma religião que passou.»
A realidade era por um lado a imitação da natureza como conservadorismo amorfo, como era cada vez mais um fervilhar revolucionário numa sociedade em ruptura, como era a realidade política no Portugal do fim da primeira década deste século.
A Monarquia encontrava-se num beco sem saída, e o descontentamento abrangia todos os sectores da sociedade, nomeadamente o estudantil, que em 1907, por razões académicas, decretam uma Greve Académica em Coimbra. O descontrole de um regime em vias de naufragar, não deu o suficiente discernimento político para resolver de imediato a questão, e dessa forma esta greve não só se transformou politicamente, como se espalhou por todo o país.
Um dos elementos fundamentais de suporte a esta Greve Académica, que não só arregimentou as Universidades, como os Liceus, foi a imprensa, com a edição de folhas informativas, folhas volantes, e jornais. Finda a questão, ficou nesta juventude o gosto pela imprensa, e muitos Liceus e Universidades continuarão as experiências de editarem os seus próprios órgãos de informação académica.
Como referi, quando partiam o sonho era Paris, Mas quando por cá ficavam, as Revistas Artísticas, de Modas e Humorísticas eram a fonte de informação, era o abecedário da irreverência. Provinham tanto de França, como da Alemanha, e no campo humorístico fundamentais eram o "Assiete au Beurre", "Le Rire", "Simplicissimus", "…Bleter" . excelentes revistas que eram absorvidas avidamente pela nossa juventude irreverente.
Esta conjugação de influência de revistas estrangeiras modernistas; de uma cidade estudantil efervescente de revolta contra o regime e sociedade; o encontro de um núcleo de estudantes, de várias origens geográficas e sociais, ávidas de intervenção social e estética, fez com que a partir de 1908 nascesse o modernismo em Portugal.
A História escrita é uma visão facciosa dos homens, que impregnados de uma outra vivência, procuram olhar o passado com a mente enriquecida pelo tempo, pelo espaço.
É facciosa porque apesar de se dizer objectivo, o historiador, como homem comum, está viciado culturalmente por opções conceptuais e ideológicas.
É facciosa porque o tempo cria perspectivas, e leituras inexistentes na época. Factos, acontecimentos que no momento passaram despercebidos, foram insignificantes, mas que com a análise dos historiadores de hoje, tornaram-se fulcrais.
Naturalmente, pelas razões atrás descritas, eu sou mais um historiador faccioso, e aceito que a minha visão dos factos analisados possa ser criticada, e acusada de sectarista. É mais uma visão, mais uma opção de análise entre tantas.
O período sobre o qual nos vamos debruçar, é um dos momentos mais interessantes da nossa história cultural, e um dos mais difíceis de narrar objectivamente. Nela entram em jogo múltiplos interesses (literários, plásticos, sociais), múltiplas pretensões (ideológicas e estéticas), múltiplos interpretes.
Contudo, é necessário ter consciência de que os factos de relevo que narraremos, aconteceram sem que a maioria da população tivesse tomado conhecimento deles. Para além dos intervenientes, apenas uma parca centena de indivíduos tomaram consciência dos factos, tiveram uma posição crítica.
Por outro lado, existe uma dificuldade terminológica, já que tanto os conceitos de Humorismo, como de Modernismo, Futurismo… não são muito claros no nosso meio, e têm variado ao correr dos tempos.
Ora, precisamente neste período de 1909/1919, vai haver uma procura de nova posição perante o humor e a estética, e será nossa intenção conseguir distingui-las.
Antes do mais será necessário destrinçar a evolução cronológica da entrada do dito modernismo em Portugal. A maioria dos historiadores elege a data de 5 de Março de 1911 (inauguração da Exposição Livre) como momento de ruptura com o passado naturalista, e início de uma nova fase estética, dita posteriormente modernista.
A 5 de Março de 1911, oito jovens artistas, todos a estudarem no estrangeiro como bolseiros, apresentam trabalhos seus no Salão Bobone, uma Casa de Fotografias que abriu o seu espaço como a primeira Galeria de Arte privada. Os artistas são Manuel Bentes, e mentor e coordenador do grupo, acompanhado por Francis Smith, Domingos Rebelo, Francisco Alvares Cabral, Alberto Cardoso, Eduardo Viana, Emmérico Nunes, e o brasileiro Roberto Colin.
O argumento que dá força interventora a esta exposição, é o objectivo de irreverência geracional contra os mestres académicos das Belas Artes Nacionais, que está na raiz da organização do evento, e a reacção teórica de Manuel Bentes, que perante as críticas desfavoráveis. Declara então a nova postura "moderna" (infelizmente apenas numa opção filosófica) destes artistas: «A Arte não tem sistemas, tem emoções /…/ Queremos ser livres ! Fugimos aos dogmas do ensino, às imposições dos mestres, e , quando possível, às influências das escolas, porque cremos que os artistas têm uma só escola - a Natureza; um dogma único - o Amor".»
Na realidade a única irreverência desta exposição foi a postura contra os mestres, já que as obras apresentadas pouco tinham de modernidade, de ruptura com o passado, e entre todos destacar-se-ia apenas Emmérico Nunes, pela sua irreverência humorística.
A 6 de Março de 1911 inaugurou, na Academia de Belas Artes de Lisboa, uma outra exposição de jovens bolseiros a viverem em França. Porque é que a maioria dos historiadores ignorou esta exposição? Ela surgiu como resposta da Academia à postura de confronto de Manuel Bentes, e nele encontraremos tanto ou mais ousadia estética que na outra, já que entre os expositores estavam os bolseiros Francisco Franco, Henrique Franco, José Campas, Dórdio Gomes e Santa-Rita. Esta exposição não tinha objectivos estéticos, ou ideológicos por parte dos artistas, mas incorporava dois nomes que posteriormente marcarão o nosso modernismo, principalmente o último que será depois uma das vozes mais irreverentes da década.
Estes artistas, não só não impressionaram os seus contemporâneos que aqui só conheciam a rotina, como mereciam a crítica e o desdém de quem lá for a procurava realmente novos caminhos para a arte. Amadeo de Souza-Cardoso, em carta enviada de Paris a um tio seu, acusa «os amigos compatriotas, que marcham numa rotina atrasada. Arte é bem outra coisa que quase toda a gente pensa, é bem mais que muita gente julga. Tudo quanto para aqui se faz é medíocre, aparte raras coisas.»
Pela força dos factos, os historiadores foram obrigados a aceitar os humoristas como uma parcela motora do modernismo, apontando o Salão dos Humoristas de 1912 como o segundo passo na introdução do modernismo. Esta iniciativa é coadjuvada com a realização da primeira exposição individual de Almada Negreiros, principalmente porque esta mereceu uma crítica assinada pelo poeta Fernando Pessoa.
Esquecem-se eles que o humorismo já à vários anos vivia em ruptura com o passado naturalista, vivia em irreverência estética, em ousadia de caricatura moderna.
Porquê esta constante separação entre géneros artísticos? Porquê essa dificuldade facciosa de olhar as artes como um todo? Porquê essa necessidade de divisão em sectores da criação plástica? Esse facciosismo não é uma posição apenas contemporânea, e Leal da Câmara já na época (em conferência em 1912), sentiu a necessidade de denunciar que a «…raça de dominadores /…/ tem desejado fazer de papões diante dos pobres artistas sem defesa e decidiram do alto da sua infabilidade que a caricatura não era uma Arte !Eu não sei com que compasso mágico ou com que centímetro misterioso mediram eles a distância que separa a Arte Séria da Arte Cómica.
Eu só sei que certos destes artistas sérios têm feito caricaturas admiráveis e que vários caricaturistas têm conseguido fazer obras mestras de pintura e de escultura que forçaram a admiração dos próprios críticos.
Chego a acreditar que a Arte não é o apanágio de uma teoria, de uma formula ou de um processo, mas a universal manifestação do desejo de Beleza, de Correcção e de Progresso.
Não há arte séria e não existe arte cómica. Há somente uma Arte como há uma só Natureza, como há só Amor e não deveria existir senão uma Justiça.
São as manifestações de esta Arte suprema que são diferentes, mas a essência é sempre a mesma admirável Natureza que faz vibrar temperamentos diferentes.»
(Curiosamente encontramos os mesmos elementos defendidos por Manuel Bentes em 1911 - Natureza e Amor)
Será precisamente uma nova postura perante a criação e a "utilidade" da arte que revolucionou a estética, que rompeu com o passado, e criou uma nova arte para uma nova sociedade baseada na velocidade, na tecnologia, no progresso e na democracia (segundo os elementos ideológicos de liberdade, igualdade e fraternidade).
Portugal nunca foi um grande centro criativo das vanguardas culturais, mas, principalmente no campo literário, conseguiu acompanhar medianamente as correntes europeias (por vezes com alguns anos de atraso…)
Apesar de geograficamente pertencermos à Europa, a existência do 'tampão' Espanha, que também nunca foi um centro de vanguardas, obrigou-nos a um maior esforço de adaptação aos novos ventos. A implementação da imprensa após o triunfo do liberalismo, facilitou as comunicações, e as influências. Para além da imprensa, o desenvolvimento da gravura, e da caricatura foram outros elementos fundamentais, e através deles teremos conhecimento quase imediato do realismo e do naturalismo, assim como será fácil a introdução do romantismo. Todas estas são correntes estéticas que se quadunam perfeitamente com as nossas "deformações rácicas" intrínsecas.
A Caricatura, definição que abrangia todo o desenho de humor de imprensa, foi uma arte fundamental ao longo de todo o séc. XIX, seja no plano estético, seja no social e político. Através dela, verificou-se a introdução das estéticas realistas e naturalistas (onde a família Bordallo Pinheiro terá um papel fundamental com Manuel Maria, Raphael, Columbano, Manuel Gustavo), assim como será motor de introdução do gosto "Art nouveau" (por Manuel Gustavo, Simões Jr., …) e do expressionismo (por Celso Hermínio e Leal da Câmara)…
Através da caricatura, a necessidade de individualismo da sociedade triunfante (uma das características da nova sociedade moderna), com a sobrevalorização do retrato-charge, e do retrato litográfico impõe-se. Foi moda em alguns jornais humorísticos, a primeira página apresentar retratos litográficos das individualidades locais e nacionais.
Através da caricatura solidificou-se uma postura burguesa de estar na sociedade, de fazer política, de fazer modas.
Tal como na pintura, a naturalismo, principalmente pelo génio de Raphael Bordallo Pinheiro impõe-se primeiro como academismo de um estilo. Esse academismo, para além do docilidade do traço, era acompanhado de um maneirismo ironista de sátira. Contudo, a sociedade evoluía em confronto cada vez mais agudo com o regime, com o sistema. A Monarquia era cada vez mais contestada, e o Republicanismo grassava. Na década de noventa, de oitocentos, esse confronto agudiza-se com uma série de escândalos políticos e económicos (os monopólios), assim como com o Ultimatum Inglês, que fere profundamente o orgulho nacional.
Para apoiar uma nova campanha panfletária contra o regime, surgem Celso Hermínio e principalmente Leal da Câmara, que utilizam um traço sintético, anguloso e agressivo do tipo expressionista. Para além desta linha estética, verifica-se uma alteração de comportamento satírico, desviando o alvo dos políticos, e dos partidos, para o Rei (que até então tinha sido quase sempre poupado), e para as instituições que o representavam directamente no regime, como a polícia e a Censura. Esta é pré-ruptura 'modernista' com o naturalismo, e aconteceu cerca de 1896 a 1900.
Paris era a Capital das Artes, e o sonho de qualquer artista era partir para viver nesse farol civilizacional, mesmo que fosse apenas para se enriquecer tecnicamente no academismo. Era o que acontecia com a maioria dos bolseiros portugueses, como lamenta Amadeo de Souza-Cardoso, em carta familiar de 1910 - «Hoje os artistas preocupam-se com a realidade, pretendem imitar a natureza como se ela fosse imitável, não sentem emoções grandes, porque são neutras de nascença as suas almas - em suma, é o ocaso duma religião que passou.»
A realidade era por um lado a imitação da natureza como conservadorismo amorfo, como era cada vez mais um fervilhar revolucionário numa sociedade em ruptura, como era a realidade política no Portugal do fim da primeira década deste século.
A Monarquia encontrava-se num beco sem saída, e o descontentamento abrangia todos os sectores da sociedade, nomeadamente o estudantil, que em 1907, por razões académicas, decretam uma Greve Académica em Coimbra. O descontrole de um regime em vias de naufragar, não deu o suficiente discernimento político para resolver de imediato a questão, e dessa forma esta greve não só se transformou politicamente, como se espalhou por todo o país.
Um dos elementos fundamentais de suporte a esta Greve Académica, que não só arregimentou as Universidades, como os Liceus, foi a imprensa, com a edição de folhas informativas, folhas volantes, e jornais. Finda a questão, ficou nesta juventude o gosto pela imprensa, e muitos Liceus e Universidades continuarão as experiências de editarem os seus próprios órgãos de informação académica.
Como referi, quando partiam o sonho era Paris, Mas quando por cá ficavam, as Revistas Artísticas, de Modas e Humorísticas eram a fonte de informação, era o abecedário da irreverência. Provinham tanto de França, como da Alemanha, e no campo humorístico fundamentais eram o "Assiete au Beurre", "Le Rire", "Simplicissimus", "…Bleter" . excelentes revistas que eram absorvidas avidamente pela nossa juventude irreverente.
Esta conjugação de influência de revistas estrangeiras modernistas; de uma cidade estudantil efervescente de revolta contra o regime e sociedade; o encontro de um núcleo de estudantes, de várias origens geográficas e sociais, ávidas de intervenção social e estética, fez com que a partir de 1908 nascesse o modernismo em Portugal.
Sunday, November 11, 2007
"CARICATURISTAS POR TIMOR"
Tenho andado a fazer limpezas nos meus arquivos e fui encontrar alguns textos publicados em livros que creio que não perderam actualidade. Como podem, eventualmente, ser uteis para alguns estudantes, ao longo dos dias vou publica-los por aqui. Este foi escrito em 1999 para o catálogo da exposição, quando realizamos a grande manifestação de solidariedade "Caricaturistas por Timor".
DENUNCIAR É PRECISO
Por: Osvaldo Macedo de Sousa
O primeiro sinal de inteligência revelou-se no sorriso que o primeiro sapiens construiu perante a adversidade da vida, e com esse sorriso tomou consciência de como tornear a questão.
A primeira marca identificadora da consciência do Homem foi a mão gravada na parede da caverna.
A mão e o sorriso moldaram o nascimento de um novo Ser, que se levantou da terra e se impôs entre os outros animais. Surge então o Ser Inteligente.
Mas, ser ou não ser, é a questão que tem acompanhado a humanidade na sua tentativa de evoluir do estado selvático ao democrático.
Ao longo da História temos verificado que esse objectivo ainda está longínquo, e a animalidade selvática, desculpem-me os animais, não é apenas um resquício no carácter dos Homens tribais, fundamentalistas clubísticos ou políticos, mas uma característica bem viva, activa e presente em muitos Homens contemporâneos.
Não é preciso recuar no tempo, falar de um Hitler, de um Pinochet e seus esbirros, já que infelizmente o dia de hoje relata-nos o que acontece em Kosovo, em Timor Leste (para falar apenas em duas situações mais visíveis, e já politicamente correctas), os genocídios que acontecem às mãos de militares sérvios, de militares indonésios… Estes seres, ditos humanos, torturam, matam, destroem não por necessidade de sobrevivência, mas pelo simples prazer humano de espezinhar o vizinho.
Só o Homem sabe Rir pelo simples prazer, como só o Homem sabe matar e destruir pelo simples prazer de o fazer.
O prazer da morte é satânico, e o riso, segundo alguns teóricos, também. Será o Riso satânico? É verdade que, pelo humor, o homem mata, virtual e temporariamente, o inimigo, colocando-se numa posição superior e denunciadora das fraquezas do Ser atingido. Mas na realidade o riso não mata, apenas atordoa temporariamente. E Ri melhor quem Ri no fim. O Humor é uma arma democrática que deixa espaço à resposta. É fundamentalmente uma arma de denúncia.
Se não sabemos quando nasceu o riso, porque ninguém fala do deus Bess (deus do humor no Antigo Egipto), no âmbito do humor gráfico na Civilização Ocidental podemos falar do humor como denúncia satírica a partir do séc. XVI.
Ela desenvolve-se com o nascimento da tipografia, com a democratização do saber, com a tomada de consciência, com a democratização do saber, com a tomada de consciência cívica de novas camadas da sociedade. Surge como denúncia por parte da Reforma, e depois da Contra-reforma.
Nasce com a missão de denunciar, informar e despertar os espíritos subjugados pelo poder. Como definiu Jacques Sternberg: "O humor é uma arma de ataque, um grito enlouquecido no deserto, uma forma de desespero, uma sucursal do pânico e do insólito, o último recurso".
Não sendo tão alarmista como Sternberg, na verdade este é o último recurso da inteligência, é a revolta contra as vergonhas humanas, é a forma mais séria de olhar a vida. Na verdade, não se deveria brincar - como muitos fazem - com o humor, já que este é o último recurso de sobrevivência humana.
E a história desta arte, por que é de uma arte que se trata, tem sido a denúncia das desumanidades, das incongruências, dos abusos. Primeiro de uma forma panfletária, em que as farpas satíricas marcavam a sangue as suas vítimas. Depois foi-se ironizando, transformando o fundamentalismo em opinião. Uns dizem que perdeu desde aí a sua força interventora, outros juram que a democracia crítica é mesmo assim, já que o politicamente correcto tem muito mais força económica, que a irreverência.
De todas as formas a caricatura/cartoon é uma força de opinião, que por vezes desenterra o seu machado de guerra e denúncia com irreverência os políticos, os ditadores, os genocídios. Existem neste momento várias dezenas de cartoonistas presos por todo o mundo. Presos por terem ousado ter liberdade de pensamento e expressão. É certo que nunca um ditador, um político oportunista ou, um militar sanguinário foi destituído pela simples acção de um desenho. Mas é certo que muitos desenhos no seu conjunto já conseguiram abrir os olhos ao mundo.
Timor é um caso desses. Oprimido, assassinado, torturado durante décadas, o povo maubere soube sempre estar de cara levantada contra os opressores, contra a morte. Essa força obrigou a que, aos poucos, o mundo acordasse para essa opressão, obrigou a que a humanidade tivesse vergonha de não querer ver, não querer olhar, não querer ouvir.
A imprensa jogou um papel fundamental nesse despertar, e o caricaturista teve o seu papel, de na síntese de um desenho dizer milhares de palavras caladas no sofrimento, no horror.
Não é de hoje nem de ontem, que caricaturistas portugueses têm usado a sua irreverência para denunciar. Se apenas usamos cartoons publicados a partir do início desta década, é que neste momento de reconciliação de um povo em luta final pela sua liberdade e independência, não queremos abrir velhas feridas que os nossos caricaturistas testemunharam. Deliberadamente partimos do momento em que a infelicidade de uns fez acordar o mundo, um despertar longo e demasiado demorado até ao dia de hoje.
Este volume é pois o resumo de uma crónica desenhada de uma luta partilhada por um povo, e por uma classe de artista/jornalistas. Surge num movimento de solidariedade que se intitula "Caricaturistas por Timor", iniciativa a que aderiu a grande maioria dos caricaturistas portugueses, solidários com a causa de Timor Loro Sae e que obteve, de imediato, o apoio da Humorgrafe e do Sindicato dos Jornalistas, assim como de vários outros patrocinadores. Este álbum inclui-se numa mais vasta série de iniciativas que têm o valor que têm. Mais para uns, menos para outros, tentando esquecer pequenas desinteligências do dia a dia, e damos todos as mãos pela causa de TIMOR LOROSAE.
DENUNCIAR É PRECISO
Por: Osvaldo Macedo de Sousa
O primeiro sinal de inteligência revelou-se no sorriso que o primeiro sapiens construiu perante a adversidade da vida, e com esse sorriso tomou consciência de como tornear a questão.
A primeira marca identificadora da consciência do Homem foi a mão gravada na parede da caverna.
A mão e o sorriso moldaram o nascimento de um novo Ser, que se levantou da terra e se impôs entre os outros animais. Surge então o Ser Inteligente.
Mas, ser ou não ser, é a questão que tem acompanhado a humanidade na sua tentativa de evoluir do estado selvático ao democrático.
Ao longo da História temos verificado que esse objectivo ainda está longínquo, e a animalidade selvática, desculpem-me os animais, não é apenas um resquício no carácter dos Homens tribais, fundamentalistas clubísticos ou políticos, mas uma característica bem viva, activa e presente em muitos Homens contemporâneos.
Não é preciso recuar no tempo, falar de um Hitler, de um Pinochet e seus esbirros, já que infelizmente o dia de hoje relata-nos o que acontece em Kosovo, em Timor Leste (para falar apenas em duas situações mais visíveis, e já politicamente correctas), os genocídios que acontecem às mãos de militares sérvios, de militares indonésios… Estes seres, ditos humanos, torturam, matam, destroem não por necessidade de sobrevivência, mas pelo simples prazer humano de espezinhar o vizinho.
Só o Homem sabe Rir pelo simples prazer, como só o Homem sabe matar e destruir pelo simples prazer de o fazer.
O prazer da morte é satânico, e o riso, segundo alguns teóricos, também. Será o Riso satânico? É verdade que, pelo humor, o homem mata, virtual e temporariamente, o inimigo, colocando-se numa posição superior e denunciadora das fraquezas do Ser atingido. Mas na realidade o riso não mata, apenas atordoa temporariamente. E Ri melhor quem Ri no fim. O Humor é uma arma democrática que deixa espaço à resposta. É fundamentalmente uma arma de denúncia.
Se não sabemos quando nasceu o riso, porque ninguém fala do deus Bess (deus do humor no Antigo Egipto), no âmbito do humor gráfico na Civilização Ocidental podemos falar do humor como denúncia satírica a partir do séc. XVI.
Ela desenvolve-se com o nascimento da tipografia, com a democratização do saber, com a tomada de consciência, com a democratização do saber, com a tomada de consciência cívica de novas camadas da sociedade. Surge como denúncia por parte da Reforma, e depois da Contra-reforma.
Nasce com a missão de denunciar, informar e despertar os espíritos subjugados pelo poder. Como definiu Jacques Sternberg: "O humor é uma arma de ataque, um grito enlouquecido no deserto, uma forma de desespero, uma sucursal do pânico e do insólito, o último recurso".
Não sendo tão alarmista como Sternberg, na verdade este é o último recurso da inteligência, é a revolta contra as vergonhas humanas, é a forma mais séria de olhar a vida. Na verdade, não se deveria brincar - como muitos fazem - com o humor, já que este é o último recurso de sobrevivência humana.
E a história desta arte, por que é de uma arte que se trata, tem sido a denúncia das desumanidades, das incongruências, dos abusos. Primeiro de uma forma panfletária, em que as farpas satíricas marcavam a sangue as suas vítimas. Depois foi-se ironizando, transformando o fundamentalismo em opinião. Uns dizem que perdeu desde aí a sua força interventora, outros juram que a democracia crítica é mesmo assim, já que o politicamente correcto tem muito mais força económica, que a irreverência.
De todas as formas a caricatura/cartoon é uma força de opinião, que por vezes desenterra o seu machado de guerra e denúncia com irreverência os políticos, os ditadores, os genocídios. Existem neste momento várias dezenas de cartoonistas presos por todo o mundo. Presos por terem ousado ter liberdade de pensamento e expressão. É certo que nunca um ditador, um político oportunista ou, um militar sanguinário foi destituído pela simples acção de um desenho. Mas é certo que muitos desenhos no seu conjunto já conseguiram abrir os olhos ao mundo.
Timor é um caso desses. Oprimido, assassinado, torturado durante décadas, o povo maubere soube sempre estar de cara levantada contra os opressores, contra a morte. Essa força obrigou a que, aos poucos, o mundo acordasse para essa opressão, obrigou a que a humanidade tivesse vergonha de não querer ver, não querer olhar, não querer ouvir.
A imprensa jogou um papel fundamental nesse despertar, e o caricaturista teve o seu papel, de na síntese de um desenho dizer milhares de palavras caladas no sofrimento, no horror.
Não é de hoje nem de ontem, que caricaturistas portugueses têm usado a sua irreverência para denunciar. Se apenas usamos cartoons publicados a partir do início desta década, é que neste momento de reconciliação de um povo em luta final pela sua liberdade e independência, não queremos abrir velhas feridas que os nossos caricaturistas testemunharam. Deliberadamente partimos do momento em que a infelicidade de uns fez acordar o mundo, um despertar longo e demasiado demorado até ao dia de hoje.
Este volume é pois o resumo de uma crónica desenhada de uma luta partilhada por um povo, e por uma classe de artista/jornalistas. Surge num movimento de solidariedade que se intitula "Caricaturistas por Timor", iniciativa a que aderiu a grande maioria dos caricaturistas portugueses, solidários com a causa de Timor Loro Sae e que obteve, de imediato, o apoio da Humorgrafe e do Sindicato dos Jornalistas, assim como de vários outros patrocinadores. Este álbum inclui-se numa mais vasta série de iniciativas que têm o valor que têm. Mais para uns, menos para outros, tentando esquecer pequenas desinteligências do dia a dia, e damos todos as mãos pela causa de TIMOR LOROSAE.