Friday, June 04, 2021

«Maestro Rebocho no arquivo da SPA – Organizar informações e recuperar espectáculos» por Osvaldo Macedo de Sousa in «O Dia» de 28/4/1987

Pôr um anúncio para recuperar um cão, um gato, uma pessoa perdida é normal, mas ser necessário apelar para que a cultura seja salva, por estar perdida nos labiriontos da cidade, será um anacronismo, já comum no nosso país.

 

Ter peças «velhas», papéis, livros, manuscritos de antepassados, em casas minima de assoalhadas limitadas, é um pesadelo para algumas pessoas. São gentes que não têm o conhecimento, que desconhecem o valor das coisas, pois nem sempre o valor se avalia pelo dinheiro hipotetico que representam, e por isso não se coibem de livrarem-se delas, deitando simplesmente para o lixo preciosidades culturais. Por isso, é natural pedir num jornal: «Se tiver partituras antigas, manuscritos de musicas, argumentos, peças de teatro… em casa, em vez de deitar fora, ofereçam-nas à Sociedade Portuguesa de Autores».

Não é por acaso que surge este pedido, mas porque neste momento este organismo está a reestruturar o seu arquivo, recuperando e pondo em ordem o material que possui e que é o melhor centro de documentação e, quase diria, o único sítio onde podem encontrar as partituras, peçs, textos do Teatro de Revista à Portuguesa, Operetas, Ópera, Teatro Infantil, Teatro declamado, material didáctico…

Quem está à frente deste trabalho, e lança este apelo, é alguem que conhece como ningu+em esse mundo do espectáculo, porque esse tem sido toda a sua vida. É o Maestro Artur Sidónio Rebocho, neto de actor, filho do compositor e maestro Camilo Rebocho, velho Republicano-democrata e, por isso, perseguido pela Ditadura que, por prepotência, proibia quase tudo o que escrevia: não  censurava, proibia.

Nascido em 1918, Artur Rebocho começa a trabalhar como  profissional já durante a ditadura, em 1930, com 12 anos ao piano, instrumento que estudou no Conservatório Nacional. Aos 17 anos apresenta-se já como Maestro, à frente do Teatro Apolo, iniciando uma carreira que o levou a quase todos os Teatros de Portugal e Colónias. Para além de maestro e compositor, é autor literário de Revistas, Operetas e peças infantis, sendo a primeira obrachamada «Xá bi tudo», estreada no Teatro da Trindade com o Chabi Pinheiro e, a última o «Ó pá pega na vassoura, no Teatro Variedades.Entre estas duas peças, muito trabalho, dissabores, frustrações, luta por um trabalho honesto do qual se orgulha, principalmente no que fez com o grupo de Teatro Infantil da Firma Lever.

Hoje, com 68 anos, conhecedor da história que viveu pessoalmente, portador de uma tradição quase perdida, que se transmigra de mestre para discipulo, está encarregue de organizar todo esse material depositado por familiares, amigos, actores ou pelos próprios autores na SPA. Iniciou o trabalho em Outubro de 1986, fá-lo em part-time e esperemos que passe a tempo inteiro, com o apoio de um ajudante, que o trabalho é demorado, minucioso e importante. O arquivo, apesar de já ter um ficheiro provisório, estava desorganizado nos dossiers e arrumação. Agora, com este responsável, o «património» da Sociedade é mais facil de consuktar e dessa forma está aberta a porta à recuperação de espectáculos que foram êxitos e que podem ser de novo; está aberta a para os investigadores, a possibilidade de melhor se fazer a história e conhecer o passado.

«Gostaria de tentar fazer um Museu de tudo o que está inerente à Sociedade. – desabafa o Maestro Artur Rebocho – Todos os que tenham músicas, peças antigas… dêem-nas à Sociedade Portuguesa de Autores, ou então deixem-nos tirar fotocópias, para que não se perca o seu rasto. Elemento por elemento se pode reconstruir uma peça, uma partitura…»


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