Sunday, May 09, 2021
«João Oom – Desenhos sobre desenhos (originais)» por Osvaldo Macedo de sousa in «O Dia» de 16/1/1987
Sem se perder entre os nós e as tramas, entrecruzando o já concebido, com a inspiração no desenho, João Oom apresenta as suas mais recentes obras «Do Mar… sobre desenho (originais) de tapetes persas» na Galeria Altamira.
Traçando nós num jogo de cruzes e cores, segue o
artesão persa a ordem imutável da trama, numa repetição monótona, mas
artística, de tradição e utilitarismo. O que resulta desse labor, é a peça, o
objecto final e consequente. O que se perde no tempo é o «cartão» transmissor,
criado pelo artista.
Esses mesmos «cartões» acabaram por ser,
também, transmissores de novas
inspirações: «Subitamente veio-me parar à
mão este papel milimétrico, que serviu à 70, 80 anos, para os teares dos
tapetes persas, que são apaixonantes pelo seu desenho, na sua feitura. Pela sua
beleza atraiu-me como suporte, que era delicioso para eu desenhar por cima. Fiz
uma concha… depois um coral… peguei no tema e é isto que aqui está exposto».
Quem é este artista, João Oom? Num olhar rápido
pela sua biografia, descobrimos que é lisboeta há 48 anos, cursou escultura na
ESBAL e trabalhou nos «ateliers» dos escultores Martins Correia e Lagoa
Henriques. Depois, um rol de exposições colectivas ou individuais, prémios
vários, criando em escultura, medalhística, publicidade, cartazismo, tapeçaria,
pintura a óleo, pastel e desenho.
Nestes últimos tempos, o desenho tem surgido com
maior relevo nas suas exposições, sem contudo desaparecer a escultura: «Tenho aqui duas peças de escultura e já na
anterior exposição de desenho tinha várias. Porém, não só pelo tempo que é
necessário para trabalhar nas peças, como pelos custos dos materiais, é-me
difícil fazer uma exposição só de escultura, neste momento».
Este predomínio actual do desenho, que não é
verdadeiramente uma troca de valores criativos, não só é justificado, como
relacionado: «O desenho é fundamental
para a escultura, pois convém como “exercício” e como alternativa. O contacto
com a cor é fundamental para qualquer artista e a escultura policromada é algo
que me apaixona, só que é extremamente difícil». Dessa forma surge o
desenho e a cor na obra do artista João Oom.
Sabendo-se que já fez «cartões» de tapeçaria e
que trabalho sobre os «ditos», a questão pôs-se naturalmente – Podem estes
trabalhos ser encarados como proposta de trabalho para o artesão? «Seria possível, com outro tratamento
técnico». Não sendo plausível a sua transposição, não deixa de haver a menção
de uma relação entre o artista e o artesão; como poderia ser ela? «Intima e
extremamente útil, como troca de experiências entre artista-artesão, ou mesmo
entre pintura-escultura, porque é enriquecedora».
Se o suporte é belo e rico, dentro de um esquema
estético tradicional, a conjugação com as novas figurações actuais, mesmo
realistas, cria um jogo abstrato de relação. A esta minha constatação, o
artista respondeu: «É uma questão de
visão do problema: pode-se, perante uma figura realista, analisar na abstracção
essa figura e na abstracção há, para já, tendência para procurar formas
identificáveis, que digam alguma coisa, verificando-se, por vezes, a
redescoberta de uma coisa que se pensava
que era abstrata, e que realmente se vai
encontrar num pormenor ampliado, numa tempestade de areia… Existe sempre um
fundo figurativo em toda a abstracção, assim como existe em toda a figuração,
um sentido de abstracção. Acho que ambas estão sempre ligadas, sendo difícil
afirmar quando acaba uma e começa outra».
Conversando numa exposição, sobre uma exposição,
o dialogo cai certamente sobre os problemas dos artistas na sobrevivência, nas
suas relações com as Galerias: «Creio que neste momento existe novamente
interesse da parte do público, e consequentemente das Galerias. Na verdade
houve um apogeu, depois uma queda e agora está a renascer. Creio que nós,
artistas, podemos ter esperança».
Enquanto a esperança é o futuro, qual o seu
significado em trabalho? «Não me preocupa absolutamente nada. Vou fazendo, com
grande prazer na própria execução, sem realmente estar a pensar – eu vou fazer
isto ou aquilo. Posso voltar atrás, pegar numa coisa antiga, fazer uma nova…
não há programa estabelecido».