Saturday, April 17, 2021
«Caricaturas de Baltazar Ortega» por Osvaldo Macedo de Sousa in «O Artista» nº2 de arço de 1989
Antigamente, para se ganhar o titulo de mestre era necessário passar por várias fases, várias provas laborais e só depois de ter subido os vários degraus da arte poderia então ambicionar o título de Mestre. Hoje, sem qualquer experiência, apenas com um canudo debaixo do braço, muitos há que reivindinca a mestria. Não é este o caso de que vou falar, um artista que ganhou a pulso todo e qualquer título que se possa ambicionar, apesar de ele apenas querer fazer o seu trabalho calmamente.
Devido a esta forma de estar,
sociável, mas afastado, simpático, mas desconhecido, me dificultar muitas vezes
o escrever sobre a vida dos nossos humoristas, mortos ou vivos. É que não
abundam as referências biograficas sobre estes artistas, que muitas vezes eram
simples individuos que passavam pelos jornais a deixar os desenhos e a levantar
o seu dinheiro.
Sobre os que estão vivos, nem sempre
é facil chegar até eles, pois primam pela sua solidao, como é o caso de
Baltazar Ortega. Ele é um Mestre da caricatura de pleno direito que, com o
Mestre José de Lemos, é a presença ainda actuante da geração do «Sempre Fixe»,
desenvolvendo-se, aprendendo na mesma tarimba profissional, a par de colegas
como Albuquerque, Teixeira Cabral, D. Fuas … a par de mestres como Stuart
Carvalhais, Francisco Valença, Leal da Câmara…
Alfacinha da Madalena, Baltazar
Ortega conheceu os amargos da vida desde que nasceu em 1919, numa familia
pobre. As dificuldades de sobrevivencia apenas o deixaram tirar a segunda
classe da instrução pública, entregando-o à escola da rua vendendo jornais ou
trabalhando como «mandarete» no café Chiado. Era moço de recados, com esperteza
inata a lutar pela vida: «Eis então que
percebi, pelas festas, o seguinte – se desse aos clientes, um ou dois desenhos,
com palavras amáveis, as gorjetas eram maiores».
Isso tornou-se notado no meio
lisboeta do Chiado, ou seja, no meio cultural e jornalístico, motivando o
Leitão de Barros, então director do «Notícias Ilustrado» e descobridor de novos
talentos, a contratar Baltazar. O contrato incluia os desenhos, fazer recados e
obrigatoriedade de prosseguir os estudos.
Assim começou a sua carreira há cerca
de 55 anos. Desde ai foi passando por multiplos jormais e revistas, chegando a
marcar graficamente durante 49 anos o «Século». Hoje continua a desenhar para o
«Diário». Dizem que os temas, as piadas não são totalmente suas, antes dadas em
conversas, na redacção, apanhadas nas leitarias que frequenta ou nos
transportes públicos (os locais ideais para apanhar o que anda no ar, o que
preocupa a sociedade, a fonte pura do humor critico da imprensa), mas ninguem
pode dizer que não é sua a arte da caricatura, da linha gráfica incisiva e
caustica. Várias vezes me disseram que houve tempos em que, quando surgia uma
nova cara na ribalta do humor, os outros por vezes só conseguiam fazer-lhe a
caricatura após o Baltazar «apanhar a expressão caricatural».
Baltazar é um clássico, um mestre que
domina a técnica do retrato.charge num estilo simples, em que a charge não é um
gesto de raiva, mas apenas uma expressão de jornalismo actuante. «Não odeio ninguém. As cariaturas mais
agressivas que faço são determinadas pelas circunstâncias criadas pelos
próprios políticos. Olha: nem sei odiar, esta é que é a verdade».
Os que o conhecem definem-no como um
sorriso largo de bondade, que vive com o coração.