Tuesday, March 23, 2021
Caricaturas Crónicas / Visões do Mundo: «A Estética no humor – Onofre Varela» por Osvaldo Macedo de Sousa in Diário de Noticias de 14/4/1991
As distâncias, com os novos meios de navegação, são
cada vez menores, porém, dentro de Portugal, isso nem sempre é a realidade e o
Norte continua distante de Lisboa. Difícil é descobrir as vivências dos
artistas nortenhos, como é o caso do António Miranda, Artur Ferreira, Zeferino
Coelho… Onofre Varela é um artista nortenho em plena actividade humorística,
pictórica e gráfica, sobre o qual conseguimos finalmente falar nestas crónicas.
Natural do Porto (1944) iniciou-se com 13 anos no
ofício gráfico, subindo todos os degraus da profissão, desde aprendiz de
tipógrafo, passando pela litografia, zincogravura.. até se tornar designer
gráfico profissional.
É pelos vinte anos que surgem os primeiros trabalhos
publicados (banda desenhada e cartoon) no «Notícias, «Miau» (ambos em Angola
onde fez a tropa), prosseguindo na «Flama», «Século Ilustrado», «Mundo de
Aventuras», «Primeiro de Janeiro», «Notícias da Tarde». «O Jogo», «A Quinzena
do Porto», «A Pantera», «O Chato», «O Olho», «Comércio do Porto»…
Director criativo em agências de publicidade; Director
gráfico do suplemento «Encontro» do «Comércio do Porto»; monitor do Centro de
Formação de Jornalistas, na área gráfica, Onofre Varela dedicou-se à pintura,
onde a paródia se destaca nas suas deambulações estéticas e oníricas.
Porquê
o humor como veículo estético? «Não sei
se escolhi o desenho de humor como género de trabalho a seguir… sei que é um
gozo fazê-lo. Perante uma situação tenho mais facilidade em comentá-la por
desenho do que por palavras. As palavras enrolam-se-me dentro e não chegam à
língua com a força que julgo fazer chegar um desenho ao papel. Os desenhos
tenho-os dentro de um lápis de onde me é bem mais fácil faze-los sair do que
tirar algo do depósito de palavras que, sinceramente, ainda não descobri bem
onde fica…»
«Humor não é
apenas fazer rir – diz, acrescentando – Acho que um dos últimos desenhos de
humor que fiz e de que mais gosto é o que representa Nelson Mandela e De Klerk,
no entanto, não lhe encontro piada. Mas há nele uma outra verdade. Uma outra
intenção, que não a de fazer brotar apenas o riso. Gosto do humor sarcástico e
quanto mais incomodativo, melhor.»
Como vê o humor em Portugal? «Julgo que o humor em Portugal já foi muito próprio. Refiro-me aos
finais da monarquia e à primeira república. Julgo que hoje não há um humor
próprio português. Há um humor relativo á realidade portuguesa, mas o modo como
se faz não o considero português, mas sim universalista. A informação destruiu
fronteiras e moldou modos de agir. O humorista não pode ser indiferente nem
está invulnerabilizado a estilos, correntes e demais informações que lhe chegam
do mundo».
«Há um humor
brejeiro – salienta – mais ao gosto das camadas populares onde, um simples
frade das Caldas ou uma caneca com um pénis colado ao fundo faz espoletar uma
gargalhada. Mas, também esse humor, ligado ao tabu sexual, parece-me ser do
gosto das camadas mais simples da população de qualquer latitude».
«A estética, a crítica e o
trocadilho têm igual importância», prossegue,
sublinhando que «depende do bom ou mau
uso que o autor faz de cada um deles. Principalmente da crítica e do
trocadilho, que podem ser bem ou mal feitos. A estética é diferente. Em
estética, das duas uma: ou é ou não é. Não há estética bem feita e estética mal
feita. Sinto que os humoristas gráficos não são entendidos como necessários a
uma publicação no mesmo grau da necessidade que é atribuía a um cronista. Salvo
raras e honrosas excepções, os jornais usam um «boneco» como tapa furos
deixados pelos textos que resultaram mais curtos do que o previsto para encher
o espaço disponível».
«Em jornais
onde trabalhei, cheguei a ser chamado à secção de montagem para, á laia de
bombeiro, tapar um ou mais buracos com bonecos a propósito (ou não) do texto
que lhe ficava mais próximo. Isto, na hora de encerrar a edição, não restando
mais do que dez ou quinze minutos para idealizar e desenhar o boneco».
«Depois, há o gosto pessoal (ou a
falta de gosto) dos responsáveis editoriais que não publicam o boneco porque
não gostam dele, ou porque não lhe acham piada, ou porque não o entendem (mais
isto que aquilo), como se o seu gosto (ou a falta dele) fosse lei para a
publicação da critica desenhada por um autor que vê, assim, o seu trabalho
censurado… E quantas vezes a não publicação do desenho se deve precisamente por
factores políticos…»