Tuesday, March 16, 2021
Caricaturas Crónicas – Visões do mundo: «Humor alemão antes e depois do muro» por Osvaldo Macedo de Sousa in Diário de Notícias de 3/2/1991
Decorreu um ano sobre a queda do Muro de Berlim. Após a esperança, sucedeu muita coisa neste mundo e no mundo do humor.
Recentemente estive no Festival Internacional de
Caricatura de St. Esteve (França), onde tive a oportunidade de conhecer
artistas dos quatro cantos do mundo, onde tive a oportunidade de trocar
impressões sobre os problemas que os humoristas encontram no seu país.
Começo pela Alemanha (ex de Leste) e uma das questões
fundamentais é saber como trabalhava o humorista antes desta (r)evolução.
Conversando com 4 artistas da alemanha de leste:
Muzeniek – «A censura intervinha a niveis diferentes:
era mais facil expor que publicar. É como no Cabaret: torna-se mais facil dizer
a um pequeno público o que por vezes é impossivel transmitir na rádio,
televisão ou imprensa».
Rauwolf – «Não nos podemos esquecer que existiram
várias fases. Nos anos 50/60, o que aparecia, era a assinatura do chefe de
redacção, obrigando-nos a um trabalho colectivista. Não nos chamavam
caricaturistas, mas vorbilder (o que constroi o modelo do mundo). Havia modelos
a seguir, por isso, os três ou quatro «artistas» do jornal deviam fazer um
desenho como…. Nos anos 70 houve qualquer coisa que mudou e os caricaturistas
puderam começar a assinar os seus desenhos, criando cada um o seu estilo, e ,
acima de tudo, deveriam apresentar-se nos festivais internacionais de humor.
Hoje, na Alemanha de Leste existem 80 humoristas
reconhecidos, cada um com a sua própria personalidade.
Esta mudança nos anos 70 foi importante no humor da
imprensa, mas o artista mantinha, até aqui, a sua identidade nas exposições.
Depois nós sempre tivemos o contacto com o Ocidente através da imprensa, que
sempre recebemos, a rádio, a televisão. Nós stavamos mais informados sobre o
Oeste que, ao contrário, nos ignorava.
Muzenick- No fundo, estavamos ligados à dita cultura
popular. Só que o preç para que a cultura fosse mesmo popular era o do partido
deter todo o controle sobre as ideias. Por exemplo, o partido publicava tudo
mais barato, mas havia aqueles que não podiam ser publicados.
O humor para passar tinha que usar metáforas, e os
contos de fadas eram um óptimo utensili para veicular a crítica. Hoje,
utiliza-se a própria realidade».
Barbara Henninger – «Hoje, é mais facil imprimir
qualquer coisa, mas é mais dificil fazer humor, por várias razões. A caricatura
e o humor eram como que contrabando, agora é mercado livre; antes, o dever era
transmitir ideias, disseminar o que as pessoas pensavam, agora toda a gente já
conhece a in formação e temos de ser mais críticos, fazer comentário; antes a
sátira era estética, porque ers trabalhada durante meses, agora os
acontecimentos são tão rápidos, que é necessário ser imediatista.
Em novembro de 1989, surgiu-nos a esperança: a censura
tinha sido derrubada com o Muro. Em 90 foi o início da unificação imediata, a
supressão sem condições da soberania, o que veio a acontecer. Isto significa
que a RFA coloniza a RDA, significa a falta de segurança, perseguições sociais…
Significa a insegurança e desemprego dos cartoonistas. Por exemplo: a crítica
social, como está ligada às ideias de socialismo, não se pode fazer, chegamos
mesmo a ser discriminados».
O único alemão ocidental comenta: Rauschenbach - «Não
esperva a unificação, mas aconteceu. Isso mudou muita coisa. Apesar de na
cabeça acharem que somos umz, continuam a ser duas, mas estou optimista para
dentro de dez anos. Agora fazem-se muitas anedotas de um para o outro e há
muita agressividade no ar. Em Berlim faz-se «bichas» para tudo. Antes, viviamos
numa ilha, como na aldeia. De repente, é uma capital com miséria. Tudo subiu e,
dentro de tres anos vamos pagar mais 30 por cento de impostos….