Friday, March 19, 2021
Caricaturas Crónicas / Visões do Mundo: «Um humor que os deixa felizes (Albânia)» por Osvaldo Macedo de Sousa in Diário de Notícias de 10/3/1991
O dito «mais vale só que acompanhado» nem sempre tem razão, assim como «orgulhosamente sós» é um erro histórico. O mundo, nos últimos, tem estado em «revolução», caindo por terra as divisões em polos separados, as certezas e incertezas.
O socialismo do proletariado está em
crise, assim como o capitalismo. Os maus e os bons confundem-se, as alianças
baralham-se e muitos são os que se sentem traídos na história, na política, nas
ilusões. Quem tenta ainda
conservar as certezas, conservar-se só, orgulhoso e não acompanhado é, sem
dúvida, a Albânia, o país mistério da Europa. A imagem que tenta exportar passa
pela rigidez de princípios, pela obediência pura às ideologias, pela certeza do
seu caminho histórico.
Normalmente,
o humor é a irreverencia, a crítica, a dúvida do Homem. É o questionar o
estabelecido, no progresso do futuro. Na Albânia não há oposição aceite; não há
contestação autorizada, portanto, não deve haver humor crítico, como sátira da
oposição. Mas, curiosamente, há humor ctrítico.
Coisa rara e nunca vista, como
banalmente se poderá dizer. Existe um humor oficial, que tem como meio de
comunicação o jornal «Hostene» (Ferrão). É uma publicação de luxo, no papel e
na impressão, iniciada em 19454 e que já ultrapassou um milhar de números
publicados. Aí trabalham os artistas albaneses mais reconhecidos
internacionalmente, como é o caso de Zef Bumci, Bardhyl Fico, Petrit Konci,
Dhimiter Ligori, Shtjefen Palushi, Ilir Pojani, Korta Raka, Shemedin Ruci…
É um jornal que não critica o
partido, que não questiona a ideologia, mas satiriza os males do sistema. A
função da caricatura é assumida como moralizadora. Não pisando o risco, a
liberdade de espírito desses humoristas albaneses na critica e no humor é
espantosa, sendo vigilantes às imperfeições do sistema, como a burocracia; a
falta de entusiasmo de alguns albaneses em participar no esforço de produção; a crítica à industria que não se moderniza; à
agricultura que não produz; os erros da planificação; má qualidade de serviços
e de equipamentos; a crítica ao individualismo, irrealismo, ambição e egoísmo.
Para um estrangeiro, esta revista é
a panorâmica dos problemas do sistema, as dificuldades do quotidiano da
sociedade, as tortuosidades do regime.
É, pois, uma crítica social e
económica, nunca política. Depois, encontramos o humor oficial dos chavões, que
é o humor na política internacional.
Aí
a agressividade é grande contra o mundo capitalista. O Universo dos vampiros,
dos conspiradores, dos agiotas… em resumo, dos maus. Não poupam nem os Estados
Unidos da América, nem a União Soviética, os tubarões do planeta, mas não
acatam a China que os protege.
Existe uma «sinfonia» acordada entre
as superpotências, que discutem o desarmamento, quando continuam os ensaios de
armamento novo, que dizem proteger os países pobres, continuando a chupar-lhes
a seiva… e a Perestroika não passa da restauração do capitalismo czarista. Até
a China os traiu, ao abrir as portas aos créditos americanos.
Sós no mundo, mas orgulhosos,
continuam na luta pelo proletariado, contra o revisionismo, o capitalismo e o
sindicalismo. «No processo de luta, o proletariado deve afrontar a actividade
da burocracia sindical revisionista e reformista que apela para a greve. Um
humor que os deixe felizes!»