Saturday, February 27, 2021
Caricaturas Crónicas: «Mário Norton» por Osvaldo Macedo de Sousa in Diário de Notícias de 25/2/1990
Hoje, de
algum modo esquecido, ele foi afinal alguém que desenvolveu, para além da sua
acção como caricaturista, uma larga actividade de maquetista, «cartazistas» e
figurinista de teatro.
«Certa ocasião o
director do jornal para onde trabalhava encarregou-me de caricaturar
determinado político de destaque, sem que este desse por isso. Numa noite, numa
casa de espectáculos, ao vê-lo, preparei-me para fazer um ligeiro apontamento e
fixá-lo bem. Por casualidade, este estava sentado ao lado de um casal idoso, e
como eu olçhasse com insistência para aquele lado, o senhor de idade julgando
que eu estava a caricaturar a senhora, levantou-se, dirigindo-se a mim,
apodou-me de “garoto” e dando-me uma palmada na mão, procurou rasgar-me o papel
e, como não o conseguisse, continuou a insultar-me, procurando até agredir-me.
O mais bonito da história, é que o “boneco” foi publicado, e o senhor
procurou-me depois, para me “pedir satisfações” por o ter caricaturado!...»
Lamentação de um caricaturista, chamado Norton,
demonstrando que em tempos difíceis de humor, até a simples caricatura
individual podia trazer dissabores. Não é um artista da actualidade, mas dos
anos 30/40.
Mário Artur Leite Ribeiro Norton de almeida Gomes,
conhecido artisticamente por Mário Norton, nasceu no Porto a 4 de Outubro de
1911, e viria a morrer em 1967. Cedo se iniciou na arte da caricatura, seja
como ilustrador de jornal, seja para expor nas galerias de arte. Pode-se dizer
que, num meio em que é raro haver manifestações em galerias de arte, e que cada
artista conta no seu currículo com uma ou outra exposição, ele foi a excepção
com mais de uma dezena de exposições por todo o país e colónias, foi o
caricaturista que mais expôs nos anos 30 a 50. Era um individuo profícuo a
trabalhar, e sempre pronto a traçar, com rasgos simples, o rosto das pessoas
que se celebrizaram,
Belo Redondo, para uma exposição de 1938, escreveria:
«A sua mocidade irrompe em turbulências
de talento, irreverente azougada, mais graciosa do que caustica, mais
humorística do que satírica, mas sempre numa apoteose esplendorosa de alegria
em cada uma das suas caricaturas. Mário Norton revela as suas subtilezas de
interpretação que fazem dele um psicólogo de gracioso temperamento, que desenha
a rir, sem contundências irritantes ou desagradáveis».
«Milagre da
mocidade é o seu salutar optimismo, numa época em que os problemas sociais são
todos pesados e graves e as almas andam de negro vestidas, em penitencia de uma
geração que fez a maior guerra da História e não soube garantir a paz. O riso
de Mário Norton é, só por si, irreverencia de inconformista, em saudável e
generoso combate aos fantasmas que povoam a nossa existência e a enchem de
pesadelos e tormentos. /…/ Cada um dos seus traços é comentário jocoso, anedota
fúlgida, apontamento gaiato. E em cada uma das suas caricaturas tomam relevo as
personalidades, adquirem expressão bizarra os indivíduos, erguem-se almas em
prodígios de jogatina espiritual».
Os seus trabalhos podem-se encontrar publicados no
«Jornal de Notícias», onde se iniciou, ou no «Pirolito», «Repórter X»,
«Detective», «A Montanha», «O Cartaz», «O Primeiro de Janeiro», «Sempre Fixe»,
«Os Ridículos», «A Risota», «A Bomba», «O Mundo Ilustrado»,. «Riso Mundial»,
«Diário do Norte», «O Norte Desportivo», «Sporting», «Almanaque do Porto»,
«Plateia»…
Para além da caricatura, Mário Norton desenvolveu a de
maquetista, «cartazistas» e figurinista de teatro.