Tuesday, February 16, 2021
Caricaturas Crónicas: «Manuel Vieira: um humor desportivo» por Osvaldo Macedo de Sousa in Diário de Notícias de 9/7/1989
O humor de
Manuel Vieira é também desportivo porque, quando surgiu, o desporto era, de
facto, uma das raras portas abertas aos humoristas.
«O português é
um chato, não sabe pensar com humor (o humor não é só ter graça). Ele não é
derrotista, mas encara sempre a vida de uma forma mais séria. Isso talvez tenha
a ver por ele ser mal pago, mal alimentado, distrai-se pouco e está sempre a
pensar como vai ser o dia de amanhã».
São palavras de um homem pouco «sério», ou seja um
humorista conhecido por Manel, ou Manuel Vieira, um artista da geração da
«Parada da Paródia».
Natural de Lisboa, onde nasceu a 7 de Agosto de 1936,
Manuel Vieira é um humorista desportivo por vivência e por criatividade. Sempre
bem-disposto, divertido, ele é o próprio humor e desportivismo vivencial em
acção. Isso reflecte-se no seu trabalho gráfico e escrito, numa graça simples,
acessível mas contundente e objectivo, atingindo o público a que se destina.
É desportivo também porque, quando surgiu, o desporto
era, de facto, uma das raras portas abertas ao humor: «na altura (anos 50/60) quase não era possível fazer politica, e o
desporto era o tema mais popular, e com assunto constante. Havia também a
caricatura, que fazia, mas a crítica social quase não era explorada».
«Publiquei o
meu primeiro “boneco” em 1954, no jornal «Os Belenenses». É a história do
costume – o meu pai pegou nuns desenhos meus, mostrou ao já falecido jornalista
Roberto de Freitas. O homem gostou e publicou no jornal, a partir daí (tinha eu
17 anos) comecei a dar borlas por todo o lado. Houve uma altura que todos me
pediam desenhos, e publiquei ao mesmo tempo nos jornais “Os Belenenses”, “O
Benfica” e “O Sporting”.»
«’Entretanto
comecei a ter necessidade de dinheiro de bolso, para o bilhar, cigarros… e
procurei ganhar algum. A partir de 1957 passei a “profissional”, trabalhando
para tudo o que era publicação, desde “O Record”, “Mundo Desportivo”, “Sport
Ilustrado” (onde comecei também a escrever), “Diário Popular”, “Diário de
Lisboa”, “Cartaz Ilustrado”, “Parada da Paródia”… Praticamente fiz todos os
periódicos, e, excluindo o Stuart, era o desenhador com o maior número de
publicações com colaborações.»
«Depois do 25
de Abril? Comecei a fazer na “Flama” uma série de charges, em alegoria com os
heróis da BD, dsos nossos políticos. Trabalhei também na “Mosca”, “Sempre
Fixe”, “Gazeta dos Desportos”, “Semanário Desportivo”… Agora publico cada vez
menos, pois não tenho paciência para trabalhar em jornais que não pagam, que
criam dificuldades burocráticas…»
Manuel é não só um humorista gráfico, mas também um
escritor de textos humorísticos, e jornalista encartado desde 1968. Além disso,
pintor com diversas exposições realizadas, publicitário, e cada vez mais
artista gráfico de jornais e revistas.
O humor deve-lhe também o apoio que le deu à Câmara
Municipal de Lisboa na organização da exposição «Zé Povinho fez cem anos», e
foi também o responsável de um «Salon de Cartoon», nas Amoreiras, há dois anos.
Manuel, um humorista em repouso, pronto a entrar em
humor, sempre que lhe deem as condições, que lhe deem um simples gesto de vida.