Sunday, January 17, 2021
Nando – Fernando Gonçalves, o autor do anti-heroi «Zé da Fisga» homenageado na Povoa de Varzim em 2020
Graças ao alerta de Zé Oliveira, soube da homenagem realizada pelo município da Povoa de varzim ao cartoonista Nando, celebrado neste género artístico principalmente pela criação do anti-heroi «Zé da Fisga», personagem inesquecível, principalmente para quem esteve em Angola nos anos sessenta.
Para ilustrar este acontecimento fiz uma colagem dos artigos que saíram sobre ele nessa localidade.
O Município da Póvoa de Varzim homenageou a 2 de Fevereiro
de 2020, o artista poveiro Fernando Gonçalves com a inauguração de uma
instalação, na Avenida dos Banhos, junto à entrada do Porto de Pesca. O
Presidente da Câmara Municipal transmitiu que “a ideia deste monumento foi
convidar o Nando para vir ao seu aniversário. Hoje, se fosse vivo, faria 80
anos e a intenção era aproximarmo-nos o mais possível da imagem que tínhamos do
Nando, daquilo que nos proporcionava e da alegria que nos transmitia sempre que
estava próximo e reproduzir aquilo que eram as várias facetas que tinha”.
Sobre a escolha do local de implantação do monumento
disse que “tem não só a ver com a presença de um painel de azulejos muito
significativo e que nos mostra o que o Nando mais gostava de fazer, falar sobre
os poveiros e a história da Póvoa”. O edil esclareceu que “quando nos sentarmos
no banco colocado junto ao monumento, a música (trechos de violino tocados pelo
Nando) tocará e as pessoas poderão deliciar-se”.
O Presidente acrescentou que “o Nando era um poveiro
que gostava da sua terra, retratou-a artisticamente de uma forma como não
conheço ninguém que o tenha feito”, constatando que “tinha uma característica
muito própria para desenhar e nos transmitir tudo aquilo em que a Póvoa podia,
de alguma forma, ser representada”. A este propósito referiu-se a um dos
últimos trabalhos que fez, há cerca de cinco anos: “um quadro magnífico,
enorme, que está no gabinete do Presidente da Câmara e representa bem a nova
Póvoa. Demorou, praticamente, um ano e meio a pintar este quadro que é
património do Município”.
Nascido na Póvoa de Varzim, a 2 de fevereiro de 1940,
Nando revelou, desde cedo, o seu talento para as artes plásticas. Aos 14 anos
começou a frequentar o curso de pintura da Escola de Artes Decorativas Soares
dos Reis, fez, mais tarde, um percurso pela publicidade, ilustração, artes
gráficas e decoração e chegou a trabalhar como desenhador
para os tapetes de Beiriz.
Fez a recruta em Mafra e concluiu o curso de sargentos
em Tavira. Passou ainda por Lamego, onde completou o curso de caçadores
especiais, e por Lisboa. Foi na capital, no Batalhão de Caçadores n.º 5, em
Campolide, que desenhou um boneco que mais tarde foi baptizado “Zé da Fisga”, o
soldado que, apesar de estar na guerra, era contra ela. A 22 de Novembro de
1962 partiu para Angola. Embarcou no dia 5 de Dezembro de 1962 rumo a Cabinda,
integrado na Companhia de Caçadores Especiais 371.
Vídeo de Luís Bastos: Fonte: http://youtu.be/JM8xIm02_s8
«... o serviço militar levou-o até Angola, tendo sido
destacado para Cabinda. A fim de “matar o tempo” começou a desenhar a cores uma
figura divertida, de humor bélico, irónico, que pretendia gozar com as
situações diversas da vida militar, cartoon que assina com o pseudónimo de
"Nando". E foi assim que em 1962 surgiu o jovem e divertido "Zé
da Fisga", caricatura do soldado português que se “safava” sempre, dando a
“volta” ao Sargento da Companhia.» Algumas imagens extraídas do sítio «Reviver Estórias...» Fontes: http://youtu.be/ZmZGdLqoZT0 (clananet)
«Ainda em Luanda, em 1967, o “Nando” realiza um filme comercial animado do “Zé da Fisga” tendo como base a publicidade às pilhas Tudor. Filme que foi revelado na Rodésia e que começou a passar nos cinemas nos intervalos dos filmes, tendo sido o único filme de animação feito com aquele personagem. “Apenas por uma questão de pormenor e para exemplificar a típica inventividade do português, o filme foi filmado com a câmara assente num tripé apontado para uma parede iluminada, com os fundos e os acetatos presos com pioneses! E, ao que parece resultou em pleno, conforme se pode verificar no filme abaixo”» https://youtu.be/ZmZGdLqoZT0
Ainda militar, Fernando Gonçalves começou a publicar
imagens do «Zé da Fisga», assinadas com o pseudónimo Nando, no jornal
humorístico «O Miau» e na revista «A Palavra», a preto e branco. A cores, o Zé
da Fisga surge pela primeira vez na revista «Notícia» em 1965. É Charulla de
Azevedo, então director-adjunto da «Notícia», que convida Fernando Gonçalves a
integrar a equipa, como chefe do departamento de desenho.
A caricatura apresenta o soldado português destacado
em Angola, fardado com uniforme de campanha (camuflado) e com uma fisga no
bolso direito. Trata-se de um soldado, recrutado à força, sem qualquer ambição
de seguir carreira militar, que gosta muito de cerveja e ainda mais de mulheres
de todas as raças. “O Zé da Fisga era um soldado que não queria guerra. Neste
cartoon contava-se uma guerra pacífica, onde o “inimigo” nunca aparecia. A
simplicidade do desenho tornava-o perceptível a letrados e analfabetos.
Os desenhos eram feitos “em cima da hora. Iam à
censura pouco tempo antes de entrarem na máquina.” Apenas uma vez, garante o
cartoonista, o desenho foi censurado. Na imagem em causa, o Zé transporta nos
braços uma mulher de raça branca. Regressam de uma “farra”, visivelmente
alcoolizados. No desenho há uma placa com a famosa frase de contestação à
guerra dos americanos no Vietname – “Make love, not war”. “A redacção informou-me
que os censores não tinham deixado passar o desenho. Como já não havia tempo
para fazer outro cartoon e a página tinha que ser ocupada, modifiquei a
mensagem para ‘Make war with love’ e assim já passou.” O Zé da Fisga conquistou
fama em Angola.
Após o seu regresso a Portugal, em 1975, regressou à
Póvoa do Varzim onde tem um
atelier de pintura. Na metrópole, os jornais O Primeiro de Janeiro e Jornal de
Notícias interessaram-se pelo Zé da Fisga mas o autor não aceita as propostas.
“Não queria que o Zé fosse carimbado por tendências políticas de direita (O
Primeiro de Janeiro) ou de esquerda (Jornal de Notícias). O Zé da Fisga não
tinha nada a ver com política. A nível pessoal, eu sempre fugi da política e o
Zé também, ele que era um anarca…”
São seus os azulejos do magnífico painel que decora a entrada
do Porto de Pesca. A sua carreira artística é diversificada, abrangendo artes
tão diversas como a pintura, a escultura e a cerâmica, tendo trabalhos seus em
vários países, como o Togo, França ou o Brasil, bem como em várias localidades
portuguesas.
Fernando da Silva Gonçalves era um homem simples, acérrimo defensor da Póvoa e dos Poveiros, das suas raízes e tradições, notabilizou-se em várias artes, do desenho à pintura, da cerâmica ao vitrinismo, sem esquecer a música clássica, uma das suas grandes paixões, que interpretava como ninguém através do seu violino, capaz de nos fazer sorrir e, outras vezes, chorar de emoção.
Seria músico toda a sua vida, tocando em diversos casinos, mas fundamentalmente no Casino da Povoa. Por vezes acompanhava essas actuações musicais com a criação de caricaturas de personalidades, ou simples clientes.
Nando viria a falecer a 8 de dezembro de 2018 e
passados dois anos homenageado na sua terra natal.