Monday, January 11, 2021

Caricaturas Crónicas: «Pedro Cavalheiro – a caricatura na rua» por Osvaldo Macedo de Sousa in Diário de Notícias de 21/2/1988

 Quando os caricaturistas invadem as ruas, retratando os homens que passam, e estes pagam alegremente esse exagero, é porque ainda há humor, ainda há razões de sobrevivência.

 

Percorrer o Paris turístico, os bairros típicos de Londres, a velha Roma… sem encontrar um caricaturista «à la minute» é um factor raro, já que aquele é um dado adquirido entre os elementos de recordação de qualquer viagem turística.

Lisboa, não tendo o cosmopolitismo turístico de outras cidades da Europa, vai contudo tentando incorporar todos esses hábitos do «progresso», a par da derrocada de velhos hábitos feitos de ruelas e casas velhas, feitos de histórias perdidas.

Caricaturas existem muitas nestas cidades nacionais, bastando atravessar a viela da nossa política, bastando passar-se pela sociedade que habita este recanto geológico para as encontrar.

Para todos os gostos

Caricaturistas, também se pode dizer que há bastantes, bons e para todos os gostos humorísticos e estilísticos, o que não significa que essa sociedade caricatural lhes dê trabalho e carinho a todos, não quer dizer que consigam sobreviver com o que ganham nos jornais. Por isso, vão fazendo outras artes, vão para o estrangeiro ou vão para a rua, a nova galeria de sobrevivência artística, como é o caso de Pedro Cavalheiro.

O Douro

Pedro Cavalheiro é um jovem, nascido em Lisboa no ano de 1961. Filho de militar, com ascendência duriense, teve uma educação onde esses factores vincaram o seu espírito, e que se reflecte na sua obra artística.

Desde criança que brinca pelo desenho, e a sua narrativa gráfica desenvolveu-se paralelamente à narrativa literária, e já no ciclo preparatório fazia «bandas desenhadas».

É nesse género criativo que desenvolveu a sua formação, inspirado num grafismo herdado da segunda geração modernista, com raízes na ilustração de um Carlos Botelho, Almada (humorista), em que o traço síntese, a bidimensionalidade cezanniana é influenciada posteriormente pela escola de Hugo Pratts. No meio de todo este caminho evolutivo, a Escola de Belas-artes pouco o tem inspirado nos anos que por lá tem andado.

Vivências actuais

Ãs suas «bandas desenhadas», invadidas pelos seus soldadinhos de chumbo, pelo surrealismo da morte e sobrevivência dos heróis, partilha o papel com o reflexo das vivências actuais, com a transcrição da vida juvenil que o rodeia, que ele vive e observa com alguma ironia, com humor catártico, com sátira.

Nessa linha de banda desenhada tem colaborado no jornal «O Diário», onde faz também ilustração, campo no qual colaborou no «Jornal de Artes e Letras». Tem também feito ilustração para livros juvenis.

Ruinas da história

A caricatura surge no seu mundo criativo, não como uma real necessidade de sátira, de humor deformante, mas como complemento monetário ao que ganha nos jornais.

A caricatura é então o renascimento do livro de curso, como recordação humorística, ou deformada de um curso universitário; é então a caricatura de turistas nas esplanadas dos cafés, nas ruas… na expressão deliz de uma viagem pelas ruinas da nossa história, ou do nosso descontentamento.

Quando os caricaturistas invadem as ruas, retratando os homens que passam, e estes pagam alegremente esse exagero, é porque ainda há humor, ainda há razões de sobrevivência.


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