Friday, January 29, 2021

Caricaturas Crónicas: «Pedro Bordalo Pinheiro – o “Sempre Fixe”» por Osvaldo Macedo de Sousa in Diário de Notícias de 16/10/1988

Sem ser um humorista (do traço ou da palavra escrita), tinha como ninguém «…o sentido das oportunidades e vislumbrava, num relâmpago de inteligência, o momento propício de atacar um facto, de fazer uma crítica, de preparar uma charge.

Foi assim que Pedro Bordalo conseguiu fazer do “Sempre Fixe” um dos mais duradores hebdomadários portugueses, sem favor nenhum, o mais querido de todos os semanários de caricaturas que se tem publicado no nosso país. Sob a sua sábia e prudente direcção, “Sempre Fixe” só granjeou amigos e, sendo um jornal de caricaturas, nunca melindrou quem quer que fosse, porque Pedro Bordallo sabia, como ninguém, confinar-se dentro das fronteiras do humorismo, sem atingir nunca o campo das ofensas pessoais.

/…/ Era um dirigente na verdadeira acepção da palavra e, acima de tudo, um homem de coração que o sabia ser sem alardes, discretamente, dando por vezes a impressão de que, quando fazia o bem, quase que pedia desculpa de que alguém precisasse dos seus favores, porque os fazia, e muitos, quantas vezes até sem esperar que lhos pedissem» (in “Sempre Fixe” de 12/2/1932),

Com estas palavras anónimas, mas assinadas mentalmente por todos os colaboradores, se despediu o jornal “Sempre Fixe” do seu director e fundador Pedro Bordalo Pinheiro (Lisboa 1890 / 1942), aquando da sua morte. Terminava desse modo a primeira etapa de um dos mais importantes periódicos humorísticos deste século, ou mesmo da história do humor em Portugal.

As épocas tanto podem ser marcadas por indivíduos como por instituições e, se o rotativismo foi dominado pela sombra de Raphael Bordallo Pinheiro, a Primeira República pela irreverência modernista, sem dúvidas que o “Sempre Fixe” é o espelho das vicissitudes da liberdade e do humor no Estado Novo.

Por detrás da fundação deste jornal está, como já dissemos, Pedro Bordalo Pinheiro, um jornalista que nasceu em Lisboa a 9 de Novembro de 1890. Apesar do seu nome, e da sua relação com o humor nos fazer pensar que pertence à família de Raphael Bordallo Pinheiro, tudo leva a crer que assim não é, antes uma curiosa coincidência.

Começou a sua carreira no “Novidades”, para em 1915 fundar com o João de Barros e Paulo Barreto, o seu primeiro periódico, a revista “Atlântida”. Era uma revista que apostava no intercâmbio cultural luso-brasileiro, mas que não vingou durante muito tempo.

Por ironia do destino, também este Bordalo Pinheiro esteve ligado à cerâmica, como director de uma fábrica, a Companhia Cerâmica de Telheiras, nos anos dez.

Em 1921, agora com o dr. Joaquim Manso, funda um novo periódico, o vespertino “Diário de Lisboa”. Neste jornal, vai tomar cargo da direcção técnica, até que em 1924 assume a direcção da representação da agência internacional noticiosa – Agência Havas, em Lisboa.

Em 1926 regressa ao grupo empresarial do «Diário de Lisboa», para fundar e dirigir o semanário humorístico “Sempre Fixe”, que liderou até à sua morte, em Fevereiro de 1942

Segundo o testemunho daqueles que trabalharam intimamente com ele, Pedro Bordalo era não só um jornalista excepcional, um homem com pleno domínio do humor, como um excelente director que soube apoiar as várias vertentes do humor, desde as tradicionais até à vanguarda, que soube apostar tanto nos consagrados como na juventude que liderava a segunda geração modernista.

Sem ser um humorista, foi um caso de humor.


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