Sunday, January 24, 2021

Caricaturas Crónicas: «O Grupo dos Humoristas Portugueses» por Osvaldo Macedo de Sousa in Diário de Notícias de 14/8/1988

 A década de trinta aproxima-se do seu fim; a Espanha cobria-se de sangue; Portugal subjugava-se na ditadura. No meio desta turbulência, um grupo de homens livres surge ironicamente a rir-se da vida. Era a segunda versão do Grupo dos Humoristas Portugueses, que reaparece agora em 1938 e sobreviverá até 1942.

 

Um simples gesto, feito reunião, mais não seja para rabiscarem umas caricaturas, contar umas anedotas, pode ser um acto de irreverência, segundo os tempos e liberdades. E esses eram de esplendor de guerra e de opressão.

A década de trinta aproxima-se do seu fim; a Espanha cobria-se de sangue, num joguete de força entre potências internas e externas; Portugal subjugava-se na ditadura, na opressão das liberdades. No meio desta turbulência, um grupo de homens livres (já que o último raio da liberdade humana a ser sufocada é o riso, e nunca ninguém o conseguiu sufocar) surge ironicamente a rir-se da vida. Era a segunda versão do Grupo dos Humoristas Portugueses, que reaparece agora em 1938 e sobreviverá até 1942.

Herdeiros da Sociedade dos Humoristas de 1911 (alguns elementos da direcção provinham desse grupo); herdeiros dos Fantasistas de 1916 (o Presidente da associação será o mesmo); integra nas suas fileiras artistas que foram os irreverentes responsáveis por aquelas iniciativas anteriores, como Francisco Valença, Emmérico Nunes, Alfredo Cândido, Hipólito Collomb, Abel Salazar, Leal da Câmara…

Este último será o grande responsável e dinamizador deste novo grupo. Apesar da idade, de se ter afastado progressivamente do humor jornalístico (sem nunca o ter abandonado totalmente), havia dentro de si aquela força juvenil de irreverência, a força de dinamismo mais maduro e distanciado historicamente, que não o deixava parar, seja numa dinâmica da região em que vivia, seja do país a que pertencia.

Contudo, o grupo já não tem a pretensão de ser um movimento estético com tendências de vanguarda no interior, antes um culto aos mestres do passado, em convívio com os artistas do presente. Seria a primeira introspecção histórica e filosófica do humor gráfico nacional, numa cumplicidade de investigadores e humoristas.

«O Grupo dos Humoristas Portugueses», segundo os seus responsáveis, «não podia apresentar as suas produções, sem afirmar o respeito que tem pela tradição, esse fio subtil que une o presente ao passado, e a tradição, para ele, consta dos trabalhos artísticos daqueles que já desapareceram, mas que deixaram, nas suas obras, a afirmação de várias fórmulas do humorismo».

Para além de homenagearem os artistas desaparecidos, de reunir os humoristas «históricos», como Jorge Colaço, Rocha Vieira, Arnaldo Ressano, para além dos nomes já referidos anteriormente, este grupo era também o encontro com as gerações posteriores como Octávio Sérgio, Júlio de Sousa, João Valério, Zéco, Pargana, Natalino, Hugo Sarmento… Isto em referência aos artistas gráficos, porém, o grupo era uma associação muito mais vasta: «O Grupo é composto na sua quase totalidade, de escritores e artistas, cuja feição ou visão artística correspondem a esta fórmula de espírito – o humorismo». Por essa razão, encontraremos a intervenção de actores, músicos, historiadores… encontraremos nomes como Nelson de Barros, Luís de Oliveira Guimarães, Veiga Simões, Armando Boaventura, Cardoso Martha, Gustavo Matos Sequeira, Eduardo Libório, Carolina Ramos, Fernandes da Silva…

O que é que o Grupo pretendia? Tal como as outras tentativas de associativismo humorístico, desejavam dinamizar e propagar a arte do humor, como sobrevivência humana, neste mundo caótico. Nesse intuito, organizaram um Salão de Humoristas em 1938 (com retrospectivas históricas), assim como bailes de máscaras, serões humorísticos e conferências. Nesta última formula, houve uma programação vasta, não totalmente concretizada, que se debruçava sobre o humor em todos os campos, seja na literatura, nos tribunais, na medicina, no jornalismo, teatro, música… no povo português.

Curiosamente, denota-se nas suas várias iniciativas, dar relevo a uma «secção de humorismo popular, com várias manifestações dessa faceta jocosa do povo português».

Isso, para além de ser um gosto especial do Presidente do Grupo, Leal da Câmara, era também uma necessidade que se tinha imposto no humor, uma arma para iludir a censura, mantendo o aspecto crítico da comicidade. Eram tempos em que a sátira política estava proibida, e aos caricaturistas / humoristas restava apenas o retrato-charge e o humor social. Por este, a arte da ironia podia dizer muita coisa, que escapava à falta de inteligência dos censores, dizendo coisas que a ditadura não conseguia ler, mas que o público compreendia.

Um dos últimos projectos a realizar pelo Grupo, foi um congresso de humoristas, em 1941, que não passou de projecto. Este fracasso, ligado à inoperância do Grupo, levou-o a desmembrar-se. O que restou no final, foi essa magna exposição, várias reuniões/jantares, foram brincadeiras em jogos pueris, de a partir de dois traços fazer caricaturas… e infelizmente quase nada impresso para documentação futura.

Apesar de se terem concretizados alguns desses projectos, como acabamos de dizer, hoje pode-se dizer q    eu o Grupo foi um novo falhanço.


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