Monday, January 18, 2021

Caricaturas Crónicas: «Maia, em ironias de Maio» por Osvaldo Macedo de Sousa in Diário de Noticias de 29/5/1988

António Maia partiu para o humor num traço ingénuo, passou por uma certa influência da escola francesa (Sempé, Siné…) e agora procura libertar-se de influências, reencontrando a sua linha maiana.

 

Tempos de carrapato, ou diabo à solta. Maio é para o Maia, mês de perturbações existenciais. Foi nos tempos de primavera, pelos campos de Rio Maior, que despontou mais um Maia para a vida. Era dia 25, como convém aos heróis, mas do ano de 1951.

Não era 26, mas maio. Quando uma nova ironia despontou em «Edição Especial», nos anos de 78. Como causa desse evento, festeja actualmente dez anos de presença regular nos periódicos da capital, em ironia fina, porque gente grossa é outra coisa.

Como artista que é. E tal como convém, diz a lenda que a sua arte de tracejar o papel provem desde os primeiros passos, em linhas ingénuas de caricatura e humor. Depois destas ingenuidades, e como reacção juvenil ao mundo que se ia abrindo à sua volta, um tanto negro (por estar rodeado de jesuítas, nesse sistema escolar), surgiu a ironia que ainda mantém.

Falando em ironia, a tropa, ou seja o serviço (qual?) pela pátria bate à porta dos mancebos, como «iniciação» à fase adulta. Por essa razão, e não outra, ele interveio na sociedade, entrando no quartel em Janeiro de 1974, provoca o levantamento das Caldas, logo seguido pela Abrilada. Como bom heroi, e salvador da pátria, despejou uns tantos bares da Legião Portuguesa, da secreta, e foi carcereiro de Generais. Entretanto, foi causador da setembrada, marçada, novembrada, até que para sossego do país, em Dezembro de 75, resolveu sair definitivamente do quartel, para ir tratar da saúde dos portugueses, de outra forma (a burocrática!).

Esta experiência militar, deu-lhe a verdadeira dimensão das armas, na sobrevivência do dia-a-dia. Dai, proveio o afiar da baioneta irónica, feita desenho-intervenção, mas só em 78 conseguiria quebrar as barreiras que o separavam das impressoras, surgindo de imediato nas primeiras páginas, como acontecimento marcante da vida portuguesa, do jornalismo critico. Foram tempos da «Edição Especial», de traço ingénuo. Como encerramento desta primeira fase, surge um Álbum, que nunca chegou a surgir (perdendo-se nos armazéns da distribuidora).

Depois, durante uns meses foi a «Tribuna» da crítica, o «Tempo» da sátira política, desaguando na economia do «Expresso», quando o «Semanário» o contratou em exclusivo de semanários. Com toda esta progressão artística, estava lançado no meio artístico e no «Capital». (o «Correio da Manhã» tem sido o seu ultimo poiso jornalístico).

Temos estado a falar do Maia, que também é António, como outros portugueses de má memória, e muitos sem memória, que o povo português é um tanto para o distraído. Tal como já referi, ele partiu para o humor num traço ingénuo, passou por uma certa influência da escola francesa (Sempé, Siné…) e agora procura libertar-se de influências, reencontrando a sua linha maiana: «É verdade que tive influências, só que o meu traço sempre foi assim, e se procurei pontos de referência, apenas foi para estabilizar».

Actualmente, está estabilizado em dois periódicos, com estruturas de humor diferenciadas. Porque é que são generos diferentes? «É que uns faço de dia, e outros à noite… O semanário é sempre algo mais de fundo, mais pensado, não tendo aquele elemento de surpresa, é o dominio da mancha. Na “Capital” o cartoon é mais espontâneo, o burlesco da vida fixado em heróis, eternos, mas diversificados».

Essa é pois a sua arma para não estagnar no traço comodo da rotina. Se por um lado há a procura do domínio da mancha feita critica elaborada, por outro há a espontaneidade explorada por personagens tipo, dispares em situações, e onde por vezes existe a caricatura. É a constante intranquilidade, como força humorística e estética. Entretanto, os non sense, os manga de alpaca… foram surgindo em álbum de humor, com humor se paga, «porque necessitava de publicar desenhos que não têm cabimento nos jornais, não interessam aos periódicos pela sua atemporalidade».

António Maia, paralelamente, tem «investigado» o óleo, o azulejo… como novas estéticas de criatividade onde o grotesco, a paródia, a ironia subsistem.

Nesta crónica quisemos testemunhar o apreço por estes dez anos de humor, e amor irónico, por uma presença que já se impôs na sociedade portuguesa, e que no ano passado lhe valeu o Prémio Desenho do Ano / 87 (ex-aequo) no Salão Nacional de Caricatura (Vila Real).


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