Monday, January 25, 2021

Caricaturas Crónicas: «Francisco Zambujal – o desporto em humor» por Osvaldo Macedo de Sousa in Diário de Notícias de 25/9/1988

 O humor, «a arte de fazer sorrir de forma inteligente», é uma arma de crítica, uma diversão e um exercício saudável da mente. O desporto não é nenhuma fórmula de crítica, mas pode ser, para além de uma diversão ou um exercício saudável para o físico de quem o pratica, ser um exercício de escape mental para quem grita contra o árbitro, o treinador, o adversário…

O desporto é uma vertente da vida social, que por vezes, por interesses políticos, se transforma numa obsessão, na estupidificação de um povo. Pois, como elemento social, é passível de ser humorizado, e desde que se tornou moda, o Almada Negreiros, Menezes Ferreira, Stuart Carvalhais, Sampaio, Pargana, Natalino, Martins… aproveitaram o desporto para fazer humor gráfico.

Hoje quem domina este campo desportivo é Francisco Zambujal, um «clássico» do humor português que anda nestas lides há mais de vinte anos. Como enveredou para esta arte? «Da forma mais ou menos espontânea e acidental como é hábito acontecerem as coisas em Portugal. Gostava de desenhar e fazer caricaturas, mandei um dia alguns para um jornal, agradaram e cá fiquei».

Desde aí «tenho-me dedicado principalmente ao cartoon e à caricatura em “A Bola”. Colaborei igualmente no “Expresso”, no “Sete”, na revista “Pão com Manteiga” e em outras publicações, para além de vários trabalhos não destinados à Imprensa. Fundamentalmente posso dizer, no entanto que, em termos de desenho «A Bola» é. Há mais de vinte anos, a minha casa».

Apesar de ter a qualidade de um profissional, de um mestre da caricatura, e de ser uma presença regular na Imprensa portuguesa, uma frequência igual à dos outros profissionais, esta não é a sua verdadeira profissão, esta não é a sua forma de subsistência. É professor (do primeiro ciclo), a trezentos quilómetros da capital, em Faro mais propriamente. Este distanciamento tem várias contrapartidas; por um lado, dá-lhe maior serenidade no julgamento irónico do que se passa no país, um humor como sentimento calmo, e não precipitado e satírico como o poderia ser se vivesse na turbulência da capital; por outro lado, a distância (os desenhos eram despachados por comboio), as dificuldades de comunicação não lhe permitem estar em cima do acontecimento, Mas hoje quem está (‘), para além das agências noticiosas!?!

«Longe dos centros de decisão e de informação, só tarde e esbatidos chegam os ecos dos acontecimentos necessários aos muitos trabalhos que teria de realizar para sobreviver. Sentiria tamb´+em grandes dificuldades para colocar a tempo, em Lisboa, desenhos que, pela sua própria natureza, perderiam actualidade se publicados dois ou três dias depois». A opção é manter-se à distancia e fazer humor com o desporto, um mundo, em principio, mais lentos nos acontecimentos que a política.

A linha estética de Zambujal é o rafaelismo, ou seja, é um dos raros humoristas em actividade que mantem essa linha simples do naturalismo “exagerado”, mantem a tradição da única escola de humorismo gráfico que se desenvolveu em Portugal. Em Francisco Zambujal pode-se aperceber a linha base do rafaelismo, doseada pelo modernismo da segunda geração modernista, com os condimentos pessoais, que lhe dão um traço inconfundível. O seu humor e desenho é incisivo,irónico, atingindo o público a que se destina com perspicácia. De todas as formas, não é fácil fazer humor num campo de tantas susceptibilidades como é o do desporto, o qual já originou guerras, e Zambujal fá-lo.


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