Tuesday, January 05, 2021
Caricaturas Crónicas: «AS MULHERES DE STUART Carvalhais» por Osvaldo Macedo de Sousa in Diário de Notícias de 6/9/1987
Pertencendo
a uma das duas partes da humanidade, a mulher nunca foi parte igual na
sociedade que constitui com o homem, seja como poder matriarcal, seja como
«sexo fraco». Fraca ou forte, «a mulher é uma equação que não sendo bem
resolvida pode dar uma regra de três» (in A Bomba de 1946), e como tal é uma
eterna obsessão do macho na sua sobrevivência.
Dos
humoristas portugueses, quem melhor apreciou a mulher foi sem duvida o Stuart
Carvalhais, numa visão machista, como é a nossa sociedade, mas sempre com
ternura, porque a olhou elegante e decorativa ao gosto do Barradas e do Soares,
a retratou típica e popular como o Manuel Macedo, a desenhou pobre e miserável
como grito da pobreza ou da sombra da noite, e a todas fez sensuais, esbeltas.
Dizia um cronista que, desde que o Stuart morreu, as varinas perderam as suas
pernas bonitas. Mas, «porque é que o Stuart desenha tão bem pernas? - Não vê a
menina que eu vivi muito tempo... em Pernes?!» (Stuart Carvalhais, in Sempre
Fixe de 20-4-1933).
Quem
fala em mulheres fala também no amor, esse bater de corações que reduz o homem
da sua posição de sexo forte, que o faz subjugar-se a elas. a rastejarem na sua
trilha: “Estes rapazes de agora” «- Não tem mesmo habilidade nenhuma! Já me
segue há duas horas, e ainda não me deu ocasião para chamar um polícia...»
(Stuart, in Sempre Fixe de 30-3-1933).
Após
a conquista seguia-se o namoro, que agora os costumes estão um tanto mudados -
«A tua nova namorada é bonita? - Não sei... Pinta-se de tal maneira que ainda
não lhe pude ver a cara.» (Stuart, in Sempre Fixe de 7-4-1938).
Ditas
sexo fraco, porque frágeis e sensíveis, de lágrima teatral fácil, são elas que
orientam o jogo da conquista, no querer ou não abrir as guardas da defesa, são
elas que fingem deixar-se levar, só que nesse jogo nem sempre conseguem ter o
«timing» devido de resistência, ou ter sorte ao amor, e então suspiram -
«Tantos malmequeres! Tantos hei-de procurar, que devo encontrar um que diga:
Bem me quer!» (Stuart, in Sempre Fixe de 12-5-1932).
Após
a conquista realizada, e dados os louros ao triunfador, que no caso de orgulho
dá-se ao macho, não é fácil à mulher conservar o seu homem, já que este é um
animal pouco fiel, e ela de novo suspira (o que é um trejeito muito seu) - «Se
ao menos ele enganasse as outras comigo!» (Stuart, in . Sempre Fixe de
3-9-1930), ou «Pudesse eu também meter numa gaiola o meu amor...» (Stuart, in
Sempre Fixe de 29-8-1929).
Chega-se
então ao casamento: «Mamã! Por que motivo os noivos se dão as mãos quando se
casam?» «- Pura cortesia! Também os jogadores de boxe apertam as mãos antes do
combate!» (Stuart, in Sempre Fixe de 13;2-1930). Inicia-se desta forma a grande
sequência de anedotas das sogras e demais guerras que não nos interessam para o
caso. Apenas o ciúme, esse velho companheiro do amor que faz enfurecer o homem
- «Não achas que as tuas saias estão muito curtas?» «- Não, filho, as saias
estão bem, as pernas é que são muito compridas» (Stuart, in Sempre Fixe de
26-5-1927).
Os
anos passam, e «os beijos aos 16 dão-se; aos 20 vendem-se, aos 40 compram-se»
(Stuart, in Sempre Fixe de 29-10-1930). A crueldade do tempo não perdoa -
«porque é que é pecado perguntar a idade às senhoras?» «Porque as obriga a
mentir.» (Stuart, in Sempre Fixe de 12-11-1936). Só que as mulheres do Stuart
são eternamente belas, mesmo as de vidas sofridas.
Também
das mulheres da noite, ninguém até hoje soube dar um retrato com tanto carinho
e amargura, porque as conhecia e amava, porque elas são a tábua perdida de
homens que naufragam na solidão do macho, porque «chamam-nos perdidas, mas é
connosco que se encontram.»
A
última das mulheres que o Stuart desenhou foi a ‘Flausina’ esse ser sintético,
perdido entre vazio mental dos homens e as formas sublimes da natureza, a
falsidade da vida que acasalava magnificamente com o ‘Baú-Bau’ dandy.