Tuesday, December 08, 2020

Caricaturas Crónicas - «Os “itas” das religiões» por Osvaldo Macedo de Sousa (in Diário de Notícias de 6/2/1986)

As Igrejas, são como os partidos, pois todas procuram o mesmo, pregam o mesmo e todas são detentoras da verdade: o que as diferencia são os caminhos que nelas levam à salvação da alma, da pátria, que as introduzem no céu, d(n)o poder. Como os políticos, os homens das Igrejas defendem: «fazei o que eu digo e não olheis para o que eu faço» (Sebastião Sanhudo in «O Sorvete» de 6/4/1879).

Tanto uns como outros não desejam pressionar a sociedade, e se a História fala de inquisições ou ditaduras, estas não foram mais do que elementos orientadores de sociedades em desvio para a barbárie. As suas intervenções públicas são apenas contribuições para «formar consciências», e, por isso, há a «necessidade» de terem canais de rádio e de televisão, tal como eram anteriormente detentores dos colégios educacionais.

Essa formação, à sombra política (não à luz, porque segundo Sebastião Sanhudo, o padre é inimigo desta) é reacionária (Raphael Bordallo Pinheiro in «Lanterna Mágica» a 31/7/1875), sendo a principal inimiga da liberdade, a instigadora das opressões, como formação de consciências. Um dos líderes dessa opressão, segundo a visão caricatural oitocentista, é o Jesuíta. Sanhudo, em 1881, num desenho paracientífico, onde mostra «A Árvore da Liberdade atacada pela phyloxera-jesuitraxtrix» (in «O Sorvete» de 20/4/1881),  demonstra que o Jesuíta é um dos tipos de phyloxera que de tempos a tempos ataca o povo e lhe chupa a seiva, como qualquer outro parasita.

Claro está que esta visão caricatural é influenciada por uma visão política da época, e não religiosa. É que, apesar de mabas serem parecidas, são distintas. Ora, os caricaturistas estavam influenciados por ideais liberais ou socialistas, quando não republicanas, por ideias defensoras da revolução social no País. Por outro lado, a Igreja estava na outra trincheira, condicionante que não dá espaço de credibilidade às instituições religiosa, à sua imagem nesta visão deformadora e exageradora da sociedade.

Talvez, por essa razão, não se deva aceitar como cientifica a opinião de Simões júnior de que o aumento populacional, se deva aos conventos. Numa série de caricaturas («Serões nos Conventos» in «Algazarra» 1900), ele descreve os amores entre a irmandade, o nascimento dos afilhados e a importância da «roda». Já em 1883, Sanhudo chamava a atenção do público para as «Tentações da carne»: «-Sim minha filha», diz o cura a babar-se, para comera carne… é preciso comprar a…. Bulla…». «-Não bula, senhor padre… esteja quieto» (in «Sorvete» de 24/2/1883), Vendendo-se a b(g)ula pelo vinho e pela carne para quem pode pagar, o Zé é obrigado à quaresma permanente, enquanto os eleitos gozam na bulição.

Assim, para o homem oitocentista, não só era necessário libertar a sociedade de certas ideias políticas já rançosas, como libertar as religiões dos desvios «itas» na «tentação da carne», no «aumento populacional» ou na infecção parasítica educacional. Ele propôs então «Medidas Sanitárias»: «(Portugal) – Diz-me Zé, o que diabo hei-de fazer aesta praga de Jesuítas que me rabeia pelo corpo, que é mesmo uma aflicção?

– Sabes que mais, meu velho? Aplica-lhe aquilo que eles te querem aplicar a ti… o cacete! Esse é que é o verdadeiro desinfectante. Com esta medida sanitária, vês-te livre d’eles enquanto o diabo esfrega um olho!» (J.M.Pinto, in «Maria Rita» a 2479/1885).

Só que a visão do Zé fica turbada (não sei se é por Marx dizer que a religião é o ópio do povo, se é por a uva lhe subir à cabeça), e quando ele pega no cacete para destruir a phyloxeradas políticas, os «itas» das religiões… o cacete vira-se contra ele e cai-lhe nos costados, enquanto eles… «-V. Sas lembram-se d’aqueles mettings que ahi se fizeram para nos expulsar? Pois nós ainda cá estamos…» (Sebastião Sanhudo in «Sorvete» a 12/2/1882).


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