Thursday, November 12, 2020
«Siné - Sempre que um ditador morre é uma festa» por Osvaldo Macedo de Sousa in JL – Jornal de Artes e Letras de 11/10/1988
No próximo sábado inaugura-se o Salão Nacional de Caricatura – Porto de Mós / 88 que se realiza pela segunda vez, como consagração do jornalismo gráfico, Este ano, para além do Salão dirigido aos profissionais, com a atribuição dos prémios nacionais aos trabalhos publicados em 1987, há a homenagem a um mestre do humor internacional. Este ano é o francês Siné.
Siné (Maurice Sinet – 1928) é o símbolo de uma ruptura no humor gráfico no pós-guerra, é a reformulação do humor jornalístico como militância ideológica. A sua forma de escrever a visão que tem do mundo é uma linha-gafitti em riso-negro, povoado por gatos, militares, padres… Ninguém, até Siné, tinha levado tão longe o sadismo, a crueldade mental, a pornografia, o masoquismo como retrato de uma França gaulista e de uma sociedade burguesa europeia.
Foi nos anos 50 que ele iniciou a sua campanha de irreverência cívica, começando a escandalizar a sociedade com os seus desenhos de guerrilheiro anarquista. Passaria então pelo »Express», «Haute-Societé», «Liberation», «La Voie Comuniste», «Revolution», «Konkret», «Clarté», El Moudjahid», «Siné-Massacre», «La Renascita»… Os seus trabalhos eram o delírio do público e o guia de muitos jovens humoristas, influenciando o grafismo e a sátira destas últimas décadas, criando escola.
É este Siné que, aos 60 anos, vem agora a Portugal fazer uma exposição e inaugurar o Salão Nacional de Caricatura (patente ao público de 15 a 30 de Outubro), dar entrevistas e rever amigos. Antecipando-se à sua chegada, o JL falou com Siné ao telefone:
OMS - Siné, o que é para si esta homenagem, realizada por um Salão de Caricatura em Portugal?
Siné – Têm-me contactado muitas vezes para homenagens, querem que eu faça exposições, só que eu recuso tudo, não estou interessado. Se aceitei esta homenagem em Portugal, foi, sobretudo, para poder estar com o meu velho amigo Vasco, pois há muitos anos que não o vejo. Esta é a verdade.
OMS – Creio que esta é a segunda vez que vem cá. A primeira também o fez com o vasco, não é verdade?
Siné – O Vasco vivia em Paris e quando se deu a revolução (25 de Abril) apanhamos um avião mal tivemos lugar, ou seja, dois ou três dias depois. Viemos fazer a revolução juntos.
OMS – Para si foi importante esta revolução?
Siné – Para mim, sempre que um ditador morre é uma festa, e há muito que esperávamos que morressem o Franco, o Salazar… Quando aconteceu a revolução não podia deixar de acompanhar o Vasco, num momento tão feliz.
OMS – Para si, o cartoon o que é? Fazer política, humor…?
Siné – É fazer jornalismo, já que me considero um jornalista militante e não um artista gráfico.
OMS – E porquê essa opção pela sátira, pelo humor negro?
Siné – Como jornalista militante tenho de ser duro, para poder lutar contra os «canalhas» que governam, que são mais fortes. O meu trabalho é menos ácido que as metralhadoras deles. Faço-o em legítima defesa.
OMS – Hoje é mais fácil a profissão do que nos anos 50?
Siné – É mais fácil agora, porque já não necessito de «massacrar», e além disso já estou um pouco mais velho, mais mole. Ganho muito mais dinheiro, não necessito de procurar jornais para publicar, encomendam-me os trabalhos… em conclusão é muito menos excitante.
PS: O Salão Nacional de Caricatura era organizado e produzido por Osvaldo Macedo de Sousa