Tuesday, November 24, 2020

«A caricatura portuguesa em Museu Suíço - Sammlung Karikaturen & Cartoon Basel » por Osvaldo Macedo de Sousa (in JL – Jornal de Artes e Letras in 5/11/1991)

Para o comum dos mortais, Sammlung Karikaturen & Cartoon Basel não significa nada. Para os especialistas de arte, é o nome de uma das maiores colecções-museu de todo o mundo, no âmbito do século XX caricatural.

O Sammlung Kaarikaturen Cartoons é um marco cultural museológico, não só pelo imenso espólio reunido numa dezena de anos (2.200 originais, de cerca de 600 artistas de 35 países), mas essencialmente pela selecção de nomes representativos de cada um dos países dos cinco continentes,

Entre muitos, destacamos nomes como Addams, Arno, Bateman, All Capp, André François, Gulbransson, Heine, Hoffnung, Levine, Searle, Steadman, Steinberg, Ungerer, Grosz, McCay, Dubout…

A partir de agora, a esses nomes associam-se o António, Bandeira, Carlos «Z», Cid, Mais, Netello, Pedro Palma, Rui, Vasco, Vitor e Zé Manel, numa selecção realizada por uma delegação do museu (com minha orientação), que se deslocou este mês a Portugal.

Desconhecendo totalmente a arte portuguesa, foram alertados para o alto padrão de qualidade estética e humorística dos artistas portugueses pelos catálogos dos cinco Salões Nacionais de Caricatura já realizados, organismo que promove anualmente os artistas nacionais, enviando os catálogos das suas iniciativas aos maiores museus de humor do mundo. Esta visão foi enriquecida, ao visitarem em Janeiro a exposição Encontro Luso-Brasileiro de Humor no Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro, organizado pelo S.N.C. / Casa do Humor de Lisboa (OMS).

Depois de vários contactos do Museu comigo, concretizou-se agora o encontro físico, do qual resultou a aquisição de meia centena de obras. Ficou apenas uma mágoa, a de ainda não terem conseguido adquirir uma obra do mestre João Abel Manta, sem a qual a representação portuguesa nunca ficará completa. Ficou, porém, ainda a esperança de se conseguir colocar uma obra sua ao lado de Steinberg…

Para melhor conhecimento deste museu, entrevistamos o seu curador, Jürg Spärh.

OMS – Como se iniciou este projecto?

Jürg Spärh – Como um sonho de Dieter Burckhardt, que era um homem de negócios ligado ao campo da química. Quando se reformou, em 1976, começou a colecionar originais de caricatura. Como era apenas um amador, e não um verdadeiro especialista, um dia apresentou-me o seu projecto de colecção aberta ao grande público, convidando-me para conselheiro artístico.

Estávamos em 1978 e já tinha algumas obras, mas a partir de agora íamos fazer aquisições sistemáticas. Naturalmente, começamos pelos suíços. Desde aí, temos percorrido país por país (Portugal é o trigésimo quinto), a escolher trabalhos dos melhores artistas nacionais. Eu servia de conselheiro artístico e ele escolhia. Agora que o sr. Burckhardt faleceu (em Fevereiro último), faço as aquisições sozinho.

OMS – Creio que desde logo impuseram uma série de regras para a selecção das obras.

J.S – Desde logo queríamos trabalhos de profissionais, de nomes significativos da história do século XX de cada país. Outra regra era a opção pelo humor não político, universal e se possível sem palavras.

Ficamos apenas pelo século XX, porque não queríamos ter não originais, o que é difícil de encontrar entre os artistas importantes do século XIX. Não quisemos humor político, porque o homem esquece-se muito rapidamente das figuras, dos personagens, dos acontecimentos e o público futuro, sem longas explicações, deixa de compreender, de se divertir com a obra, perdendo o interesse comunicativo a até estético.

Claro que fazemos excepções com nomes fundamentais, dos quais encontramos apenas originais políticos. O mesmo acontece com a BD, a qual não nos interessa em si, mas sim alguns artistas.

OMS – Como selecciona?

J.S. – Preocupo-me primeiro com a qualidade gráfico-estética, depois com o humor e em terceiro com a universalidade da ideia. Por exemplo, se a qualidade for excepcional, e o tema muito nacional, porque não adquiri-lo? Mas, o charme da nossa colecção é o de o público de qualquer país compreender um desenho japonês, português, americano ou russo.

OMS – O público tem noção da excelência dos nomes?

J.S. – Claro que a nós interessam-nos os grandes nomes, e pela mesma razão outrasinstituições mundiais pedem-nos que façamos mostras com o nosso espólio, como já aconteceu em Nova Iorque e vai acontecer em Salzburgo e Hanôver… Porém, creio que a maior parte do público prefere a qualidade humorística, sem se aperceber por vezes das assinaturas. Outros, procuram a colecçãopara observar os mestres, a qualidade estética.

OMS – Todas as obras estão expostas?

J.S. – Não, porque temos um espaço pequeno, uma casa do séc. XVI, no centro histórico de Basileia. Fazemos exposições temáticas de oito em oito meses (já que o público, em média, não vai mais do que uma vez por ano ao museu), rodando as obras, e apresentando-as nas suas diferentes leituras: nacional, temática, estilos… Por exemplo, a 16 de Maio de 1992 inaugurará a exposição temática «Portugal, Brasil?, o que será uma revelação para muita gente, como já foi para nós.


Comments: Post a Comment



<< Home

This page is powered by Blogger. Isn't yours?