Wednesday, January 23, 2019
O ANTI-HERÓI NO HUMOR DE IMPRENSA
Por: Osvaldo Macedo
de Sousa
Eu Sou – Ele É, Nós Somos – Eles São,
a eterna luta entre os egos, entre a desumanização e a tolerância, entre a
existência e a epopeia. A história da humanidade é uma épica de egos, o
confronto entre os super-egos e os simples, os que se consideram super-heróis e
os anti-heróis do quotidiano. Na essência de qualquer luta humana, para além da
vida harmoniosa do Ser, está sempre o dinheiro, o poder, a adulação do Eu,
encenada pela neblina das hipocrisias políticas, cenografada numa mitificação
heroica da governação das sociedades. Contudo, o verdadeiro herói do quotidiano
é o “Zé-Ninguém”, o “anónimo”, aquele que sem necessidade de comprar a amizade
e a cumplicidade dos outros, sobrevive na selva do dia-a-dia.
O mundo da narrativa gráfica, dos
humores de imprensa, como espelho da vida que é, também vive destas
tragicomédias alegóricas. O confronto entre os míticos “heróis” e os anónimos
“anti-heróis” é constante e impõe-se como eterno, já que necessita deste frente
a frente para poder chamar a atenção dos leitores, para alimentar a fome da
tragédia que a humanidade cultiva como essencial do seu divertimento.
Mas o que é um “herói”? Na gíria
popular é alguém que executa acções excepcionais com coragem e bravura, como
alguns políticos que contra correntes e marés de honestidade e ideologia,
apesar dos desgovernos, conseguem ser reeleitos e continuam a desgovernar, a
gerir empresas endividadas... No passado, para além da coragem e bravura dos
heróis, havia um sentido altruísta que os transformava em seres mitificados e
aproveitados pelas narrativas históricas como modelos de comportamento. Daí
passou a personagem literária, a protagonista de ficção. Para se distanciar
desses protagonistas, que na sátira política é encarnada pelos “políticos”, os
criadores de narrativas gráficas impuseram novas estruturas de personagens como
os “super-heróis”, dotados de poderes especiais, combatendo o mal, pela ética e
honra, contudo, para que a ficção sobreviva e possa angariar fãs, o mal, apesar
de sempre derrotado, também impõe super-vilões.
No meio desta criatividade toda onde
se encontra o anti-herói? Por princípio, ele seria o que não tem as virtudes dos
heróis, mas a sua figura discreta foi-se transformando ao longo dos anos. Por
vezes, por não expôr publicamente as suas virtudes, é confundido com o vilão,
se for irreverente e revoltado perante o “establishment”. O anti-herói é o “herói apesar de tudo”, ou seja, comum
como todos nós e que sobrevive, como todos nós, na epopeia da vida.
Que tipos de anti-heróis há? De
todos os géneros, mas os estudiosos dividiram-nos em quatro tipos:
1) O indivíduo sem “qualidades” especiais,
vive uma vida ordinária num enquadramento ordinário e que não nos inspira para
actos de heroicidade podendo, contudo, fazer-nos pensar sobre a vida de todos
nós ou dos que se querem apresentar como heróis;
2) Uma personagem que até poderia ser um
herói, mas que prefere manter-se anti-heroi, decepcionando-se, como paródia do
que poderia Ser;
3) Uma personalidade com valores anti-heróicos,
por vezes anti-sociais, que pela negativa nos retrata as misérias do
quotidiano;
4) O “anónimo” sem qualificações para ser
herói que, por circunstâncias do momento, é empurrado para posições ou acções
extraordinárias.
Apesar de todos sonharmos em ser
heróis, quando acordados, a nossa imagem exterior identifica-se mais com o anti-herói,
o “Zé-Ninguém” que em Portugal é o Zé Povinho, o “anónimo” que se impôs como o
principal anti-herói da nossa imprensa.
O “anónimo” é o anti-herói mais
popular de qualquer humorista gráfico, já que, maleável e adaptável a qualquer
tempo, circunstância política e social, impõe-se como imortal, pois nunca
envelhece, nunca perde actualidade. Ele é uma tipificação abstrata de uma
personalidade que veicula a ideia filosófico-humorística do momento do artista,
diversificando-se segundo as necessidades de cada autor. Assim, apesar de ser
sempre o mesmo, é diferente do outro “anónimo”.
No universo gráfico é com o
renascimento que esta técnica alegórica ganha força interventiva e o povo, o
eterno anti-herói, assume protagonismo em gravuras de Dürer, Hans Weiditz… Nos
confrontos da Reforma e Contra-reforma e “Guerra dos Camponeses” assume um
estatuto lúdico que nunca mais abandonará. No século XVIII com a revolução das
comunicações e com o triunfo da revolução industrial, não só a gravura como as
artes a ela ligadas vão conquistar novos espaços e novas formas de estar na sociedade.
Se os anti-heróis já vivem e brilham com ironia ou sátira, na pré-história do
cartoonismo, seria com William Hogarth que conquistariam os seus primeiros
nomes de baptismo – Moll Hackabout e Tom Rakewekk nas séries gráficas Harlost’s
Pregress (1732) e The Rake’s Progress (1732/3). São heróis “negros” ou anti-heróis
da sátira social?
Com a Revolução Francesa (1789) e o
despertar dos sans-culotte, a imprensa, na sua função noticiosa e panfletária
dos revolucionários versus ancient regime vai impulsionar o desenvolvimento da
caricaturagrafia, a imagem grotesca, irreverente, cómica ou filosófica como
peça fundamental da comunicação social.
Neste universo em mudança constante,
a criação de iconografias e de símbolos, foi fundamental como estrutura de
comunicação. Vários ícones se irão impor ao longo dos tempos como a francesa “Marianne”
que simboliza o triunfo do republicanismo em “liberdade, igualdade e
fraternidade”, contudo, mais do que um símbolo de um povo é uma iconografia de
um regime, razão pela qual não se poderá considerar como uma iconografia de um
anti-herói. Já a Grã-Bretanha que se pavoneava como a “Britânia” imperial,
desenvolveu uma personagem caricatural – o John Bull, o mais antigo anti-herói
da história. Criado em 1712 no Panfleto “Lawis a Bottomless Pi” de John
Arbuthnot e Alessander Pope, seria depois desenvolvido por William Hogarth como
arquétipo heróico do inglês. Com o seu aspecto rural, beberrão, mais cómico que
possuidor de “witt” (espírito), opõe-se ao jacobinismo francês. Durante mais de
um século será o símbolo anti-heroico dos britânicos, usado também pela
caricatura dos outros países, como Portugal, para denegrir aquele espirito
snob, imperialista, rude e de sobranceria mal-educada, característico dos
ingleses.
Outros símbolos nacionais foram
criados neste século XIX, como o Tio Sam americano, o Urso russo… Na Alemanha
encontramos uma “Germânia” imperial que procura ofuscar “Michel”, a imagem
anti-heróica desenvolvida desde a idade-média pelos próprios alemães, uma
personagem sonolenta, um “homem comum” inofensivo sem qualquer poder de decisão
na vida do país, em que a sua principal característica é o seu gorro, um misto
de “chapéu de Anão” e uma touca de dormir. Apesar de ter todos os condimentos
para ser usado pela sátira dos países em confronto com as ganâncias expansionistas
dos seus Kaisers, este símbolo do povo alemão só foi explorado pelos próprios e
raramente aproveitado pelos outros. Mais recentemente temos o israelita Srulik,
criado por Dosh (Kariel Gardosh), em 1956, aquando da formação do estado de
Israel, como símbolo do sionista pioneiro, o agricultor judeu que veste a farda
de combate sempre que necessário para defender a criação do novo país. Do lado palestiniano
surgirá o “Handala” de Nji Al-Ali como a criança resistente que sonhe regressar
um dia a casa. Mas todos estes são encarados mais como heróis gráficos nacionais
que anti-heróis satíricos.
Dentro deste panorama de símbolos
iconográficos e que nos interessa mais surge, em 1875, o “Zé Povinho” pela mão
de Raphael Bordallo Pinheiro, como representante do povo português, o qual,
apesar de entronizado como “O Soberano”, é um “anti-herói” assumido
imediatamente por todos os outros caricaturistas que o usam em cotejo com os
“heróis” políticos. A particularidade do nosso “Zé” é que ele não representa
uma nação, nem o orgulho de uma nacionalidade, antes a alma triste, conformada
e saudosista do lusitano dormente, no fundo mais próximo do Michel germânico.
Por essa razão, humoristas posteriores tentarão criar outros tipos de “Zés”,
mais rezingões como o “Broncas”.
Na imprensa oitocentista, perante a
necessidade de desenvolvimento da narrativa gráfica em mais de uma vinheta,
principalmente nos periódicos de entretenimento e para um público mais
infanto-juvenil, vamos verificar o nascimento de um sub-género gráfico, onde mais
importante que os heróis, será o campo de vivência de muitos anti-heróis até se
transformarem em Super-heróis com a Segunda Guerra mundial.
Em Portugal, seria Nogueira da Silva
(1830-1868) a criar as primeiras narrativas gráficas, mas seria Raphael
Bordallo Pinheiro, com “A Viagem do Imperador do Rasib pela Europa” (1872) a
desenhar o primeiro álbum de BD nacional e o primeiro herói. Já que é uma
paródia, a uma personagem real – o imperador do Brasil - não se enquadra no
conceito de “anti-herói”.
Como não é nosso intuito fazer aqui
a história do humor na BD, não me debruçarei sobre as múltiplas tiras cómicas
que encherão os periódicos de todo o mundo, com especial relevo no continente
norte-americano que a transformará numa indústria, abrir-se-á apenas uma excepção
ao “Quim e Manecas”, outra dupla de crianças criadas, em 1915, por Stuart
Carvalhais (1887-1961) no “Século Cómico”. Viveriam de 1915 a 1953, com
interregnos, em diferentes periódicos e diversas variantes herdeiras de “Max
and Moritz”/”Katzenjammer Kids”/“Yellow Kid” e que usará também de vez em
quando, balões. Se no início as suas aventuras eram de puro cariz infantil,
rapidamente será enriquecido com o “engagement” sociopolítico com a realidade,
participando, inclusive, com a sua fantasia hilariante na Grande Guerra que
esmagava a Europa de então. Chegarão mesmo a “encontrar-se” com Lenine, numa
Moscovo revolucionária (in “Sports”, 1919) num acto histórico, sendo o único
anti-heroi bedéfilo a ter essa ousadia de contemporaneidade.
Nessa década de dez, ao período
republicano, temos de recordar que os revolucionários modernistas procuravam recriar
a filosofia do humor gráfico, evitando a caricatura dos políticos, tentando
impôr, ingloriamente, uma crítica mais social, mais filosófica onde os
anti-heróis poderiam florescer e ter um papel mais activo na criação de uma
sociedade mais equilibrada e justa. O gosto de se rirem do fácies de quem os
explora, leva a que a imprensa mantenha a preferência por caricaturas
personalizadas.
Com o fim da Segunda Grande Guerra, o
vazio da mente pela implosão do conflito, procura no humor a salvação do
inconsciente. A linha precipita-se no gesto caligráfico à procura da alma do
indivíduo, consultando, cada vez mais, o sofá psicanalítico em que o artista
faz a sua própria psicanálise. Com as suas fraquezas, ele impõe-se ao
colectivo, independentiza-se no egoísmo ou na heroicidade da auto-descoberta.
Conservando, a maior parte das
vezes, os tipos de anti-heróis estratificados em “crianças rebeldes”,
“vagabundos / marginais”, “zoomorfismos” e “família”, a caricatura social e o
comic-strip foi-se desenvolvendo numa fronteira confusa entre os vários géneros
de narrativa gráfica, mais conhecidas por Bds ou Comics, diferenciando-se por
serem editadas em periódicos e não em álbuns, e por serem gags conclusivos numa
prancha só.
A vizinha Espanha também possui uma
vasta lista de anti-heróis (o mais conhecido é sem duvida o “Mortadelo e
Filemon”, mas mais no campo da historieta) na sua história do humor gráfico
destacando-se, contudo, o humor galego onde proliferam os anti-heróis como
“Gaspariño”, “Caeteano”… de Xaquin Marin, o “Floreano” de Gogue, o “Carrabouxo”
de Xosé Lois… Outros artistas, apesar de nunca terem baptizado as suas
personagens, pela força do seu estilo inconfundível, acabam por ser importantes
anti-heróis anónimos, como acontece no traço de um Mingote, Forges, Malagon ou
entre os portugueses Miranda, Vilhena, Martins, José de Lemos, Maia, Luís
Afonso, José Bandeira…
Portugal levou algum tempo a
desenvolver a tira-cómica ou a baptizar séries com anti-heróis na caricatura de
imprensa. Quase poderíamos dizer que, depois dos bedéfilos “Quim e Manecas”, o
primeiro anti-herói do humor político-social é o pícaro “Pascoal” de José
Vilhena, publicado nos finais de cinquenta/sessenta. Claro que na história aos
quadradinhos já havia múltiplas personagens importantes no desenvolvimento da
história gráfica contudo, temos de recordar que vivemos uma ditadura que ia
apertando o pensamento censório, encurralando a sátira de imprensa numa ironia
suave ou anedótica.
Na África portuguesa, como extensão
colonial, na década de sessenta, fruto da guerra de independência e da necessidade
de vincar o nosso poder, conheceu um novo impulso na imprensa e em Moçambique
encontraremos o seu principal anti-herói
de nome “Zé Matope” de Celestino Fenes Pereira na Beira (hoje Pemba), como
imagem do pobre colonialista que lá vivia mais por sobrevivência que por
imperialismo. No pós-25 de Abril e transição para a independência surgirá
“Xiconha”, o “anti-imperialista”, desenvolvido pelo Departamento
(contra)Informação da Frelimo.
Em Angola a imprensa terá uma maior dinâmica,
assim como os fanzines criados pelos soldados, como Zé Oliveira, Onofre Varela,
Camilo Saraiva, Augusto Cid, João Lamas, Carlos Amor, Vicente da Silva…. Dos anti-heróis
aí criados podemos citar “Tito, o funcionário” de Manuel Ribeiro, “O Agapito”
de Hipólito Andrade, “Xiritung” de Carlos Fernandes mas, desculpem-me todos os
outros, o mais importante e de maior sucesso o “Zé da Fisga” do Nando (Fernando
da Silva Gonçalves que também criaria a menos conhecida “Fatita”) que viveria
não apenas, na imprensa, como na publicidade. Após a independência, brilhará
“Mankiko, o Imbumbável” de Sérgio Piçarra e mais recentemente o “Cabetula” dos
irmãos Lindomar e Olimpio Sousa.
Em Portugal, teremos de esperar pelo
final da década de sessenta para vermos germinar uma proliferação de anti-heróis,
crentes que o Inverno da ditadura estava no fim e uma nova Primavera (dita
marcelista) ia deixar entrar os raios da liberdade. Falsa ilusão, já que o
regime mantinha-se, razão pela qual, a ironia do humorista impôs um agente de
autoridade para veicular a sua contestação. Falamos, naturalmente, do “Guarda
Ricardo” de Sam (Samuel Azavey Torres de Carvalho). Esta personagem foi
crescendo, impondo-se ainda mais nos tempos pós-revolucionários até à
democracia, mantendo-se uma voz inquisitiva sobre o poder dos líderes e de
todos os outros chefes que pululam pelo país e das opções da sociedade. Ainda
nesses anos de transição, o “cego” de Fred marcará a sua presença, desaparecendo
no meio da revolução quando finalmente pôde ver a luz da esperança e da
liberdade.
Novos estereótipos satíricos surgirão
nestas décadas de renovação da comunicação social. Dentro desta panorâmica,
reencontraremos os zoomorfismos, esse regresso ao tempo em que os animais
falavam. A alegoria é um artefacto de distanciamento para que a crítica seja
menos “ofensiva”, para que seja uma voz de “consciência” e o role de animais
irónicos começa com o mesmo Sam com a coruja “Ulisses”, prosseguindo com “Os
Abutres” de Pedro Massano e José Abrantes, “Os Passarinhos” de Pedro Massano,
“Os Corvos” e “Pombas” de Zé Oliveira (que com o Imparcial, o Manuel, o
Broncas… se impõe como o campeão dos anti-heróis), o “Pintainho” de Carlos
Laranjeira, a “Ave Rara” do Pedro Mota, o moscardo “Ferraz” de A.M (Pires
Cabral). Mas nem só de asas vive a ironia na imprensa e, se o gato, o felino
com garras propícias para a sátira, acaba por não ser utilizado, excepto o “Horus”
de José Abrantes, mais vocacionado para o público infantil, os canídeos terão
uma presença mais forte pela pena de Onofre Varela (“Diogenes” e “Rosnau &
Cª”) e de Augusto Cid (“Cão-Traste”). Encontraremos também a “Formiga” de
Fernando Relvas e a selva de zoomorfimso de Rui Abrantes.
Cada um à sua maneira, os artistas
criam as personagens mais adequadas para cada periódico ou para cada público. Se
Caetano - Vasco Colombo (“Cicatrizante”, “Indigente”), Nuno Saraiva (“Zé
Inocêncio”, “Filosofia de Ponta”), Fernando Relvas (“Karlos Starkiller,
jornalista de ponta”), Pedro Morais (“Chico Esperto”) procuram personagens que
possam parecer mais “destruturadas”, as outras, por serem irónicas, ou
humorísticas, acabam também por sê-lo como a “Heloísa”, “Pereira, “Ezequiel”,
“Bartolomeu” e “Ricardo” todas do Sam; “Koko” de Cid, não esquecendo o
“Bartoon”, “Barba e Cabelo”, “Lopes Repórter Pós-Modernista” de Luís Afonso e
“Cravo e Ferradura” de José Bandeira.
A figura emblemática e icónica do
“Zé Povinho” continua recorrente entre os caricaturistas portugueses de todos
os tempos, já que é uma excelente muleta na sátira política nacional, mas isso
não impede que outras figuras de índole popular também procurem recuperar a
dita “esperteza saloia”, a mestria do olhar distanciado e séptico do
conhecimento e ironia dos mais velhos, o gosto pela “retranca” da tasca e café.
Se não assumem a fisionomia bordaliana, mantêm a mesma acutilância do dito
espirituoso, como aconteceu no pós-25 de Abril em que surgem duas personagens
do povo, curiosamente não são Zés mas Chicos, ou seja, o Chico de Fernando
Relvas e o Chikoboné do João Martins. Esta transposição do olhar crítico para a
figura popular, imagem na qual o leitor se identifica sem querer identificar-se
para evitar rir-se de si próprio e reconhecer-se como um ser do povo, é fundamental
no humor de imprensa. Por vezes é difícil olhar para o espelho, pensando que
estão a olhar para o grotesco, quando é deste lado que o grotesco se encontra.
É importante para o humor gráfico a
existência destes anti-heróis ou são apenas uma muleta criativa para uma ironia
mais assertiva? O acto de baptizá-los e dar-lhe uma personalidade, transforma-os
em heterónimos do criador ou são sempre reflexos, em grotesco, da personalidade
da sociedade a que se dirige? O anti-herói baptizado continua a transmitir o
pensamento subjectivo do artista ou conquista uma filosofia própria adequada ao
que é o seu posicionamento irreverente na sociedade e na imprensa? O anti-herói
é um alter-ego de um jornal?
Eu Sou – Ele É, Nós Somos – Eles São,
a eterna luta entre os egos da sociedade, e se todos devemos ser heróis de nós
próprios, é fundamental parar, olhar, ver, pensar com os anti-heróis para nos
mantermos despertos, atentos ao que se passa à nossa volta, no quotidiano
político e social, na vida. Enquanto soubermos aceitar as críticas e os
louvores em diálogo e sorrir, com os nossos heróis, com os nossos anti-heróis,
connosco e com os outros, a humanidade ainda pode ter esperança no futuro.