Thursday, January 31, 2019
ADEUS, ZÉ MANEL! (Homenagem de Carlos Rico no Blog BDBD)
24 de Janeiro de 2019.
Cerca da uma da tarde surgiu no meu telemóvel uma chamada da Isabel. Tive logo
um mau pressentimento, que se confirmou quando do outro lado ela me disse:
"O Zé Manel faleceu!".
Eu sabia que o Zé
Manel estava bastante doente e que lutava há anos (cada vez com menos forças),
tentando contrariar um epílogo inevitável. Mas, embora não fosse de todo
inesperada, a notícia deixou-me abalado.
Fiquei triste, ainda que ao mesmo tempo aliviado, por saber que o Zé Manel deixara de sofrer e estava, finalmente, em paz.
Não recordo bem as circunstâncias em que nos conhecemos. Terá sido num encontro casual no Festival da Amadora ou da Sobreda, ou possivelmente na primeira vez em que ele participou num concurso de cartoon, em Moura, e aqui se deslocou para visitar o salão.
O Zé Manel, sempre que concorreu em Moura ganhou, com excepção da primeira vez, em 2000, quando preferiu participar com um trabalho extra-concurso, algo que eu não entendi na altura. Mais tarde percebi que ele gostava tanto dos seus originais que não queria perde-los para a organização (como era norma do regulamento)!
A maior parte dos desenhadores que conheço são assim, possessivos e cuidadosos com os seus originais, mas o Zé Manel era, sem dúvida, aquele em que mais se acentuava essa característica.
Uma nota curiosa, para confirmar aquilo que digo, e que se repetiu durante anos, era quando o Zé Manel concorria ao Concurso de BD e Cartoon de Moura: pouco antes de terminar o prazo de entrega dos trabalhos, o Zé Manel telefonava-me e, sabendo das minhas múltiplas deslocações a Lisboa para recolher livros, exposições e cenários, pedia-me para eu recolher, também, o seu trabalho directamente em sua casa, pois não confiava nada na entrega via CTT. Dizia que, por mais protegido que fosse, o desenho poderia ficar amachucado ou até mesmo extraviar-se.
Eu, naturalmente, não me importava nada e fazia um desvio até à casa do Zé que, invariavelmente, descia as escadas do prédio e me entregava os seus originais, entre dois abraços e meia dúzia de palavras, pedindo-me sempre que "caso não fosse premiado" lhe devolvesse os originais quando eu tornasse a Lisboa.
O Zé Manel, contudo, com uma única excepção (em 2000, o tal ano em que participou extra-concurso, cujo tema era "O Western"), foi, sem surpresa, sempre premiado: em 2002 (com "O Terror" como tema), em 2003 ("O Desporto"), em 2004 ("A Moura Salúquia"), em 2005 e em 2011 (ambos com tema livre).
Fiquei triste, ainda que ao mesmo tempo aliviado, por saber que o Zé Manel deixara de sofrer e estava, finalmente, em paz.
Não recordo bem as circunstâncias em que nos conhecemos. Terá sido num encontro casual no Festival da Amadora ou da Sobreda, ou possivelmente na primeira vez em que ele participou num concurso de cartoon, em Moura, e aqui se deslocou para visitar o salão.
O Zé Manel, sempre que concorreu em Moura ganhou, com excepção da primeira vez, em 2000, quando preferiu participar com um trabalho extra-concurso, algo que eu não entendi na altura. Mais tarde percebi que ele gostava tanto dos seus originais que não queria perde-los para a organização (como era norma do regulamento)!
A maior parte dos desenhadores que conheço são assim, possessivos e cuidadosos com os seus originais, mas o Zé Manel era, sem dúvida, aquele em que mais se acentuava essa característica.
Uma nota curiosa, para confirmar aquilo que digo, e que se repetiu durante anos, era quando o Zé Manel concorria ao Concurso de BD e Cartoon de Moura: pouco antes de terminar o prazo de entrega dos trabalhos, o Zé Manel telefonava-me e, sabendo das minhas múltiplas deslocações a Lisboa para recolher livros, exposições e cenários, pedia-me para eu recolher, também, o seu trabalho directamente em sua casa, pois não confiava nada na entrega via CTT. Dizia que, por mais protegido que fosse, o desenho poderia ficar amachucado ou até mesmo extraviar-se.
Eu, naturalmente, não me importava nada e fazia um desvio até à casa do Zé que, invariavelmente, descia as escadas do prédio e me entregava os seus originais, entre dois abraços e meia dúzia de palavras, pedindo-me sempre que "caso não fosse premiado" lhe devolvesse os originais quando eu tornasse a Lisboa.
O Zé Manel, contudo, com uma única excepção (em 2000, o tal ano em que participou extra-concurso, cujo tema era "O Western"), foi, sem surpresa, sempre premiado: em 2002 (com "O Terror" como tema), em 2003 ("O Desporto"), em 2004 ("A Moura Salúquia"), em 2005 e em 2011 (ambos com tema livre).
Participação de Zé
Manel no 12.º Concurso de BD e Cartune de Moura, onde obteve uma Menção
Honrosa. Posteriormente, esta banda desenhada seria incluída no (ainda
disponível) álbum colectivo
"Salúquia: a
Lenda de Moura em Banda Desenhada", Ed. CM Moura (2009).
Desde o momento em que
nos conhecemos, passámos a ter um contacto assíduo, quer nos diferentes salões
que ambos visitávamos, quer através de telefonemas regulares, quer ainda
através do envio de cartões de Natal, um costume cada vez menos na moda na
sociedade actual, como se sabe, mas que o Zé Manel fazia questão de cumprir
todos os anos enviando-me postais com belos desenhos originais personalizados.
A primeira vez que eu vira um desenho do Zé Manel, contudo, fora uns bons quarenta anos antes, quando o meu pai estudava à noite e tinha como manual de francês um livro intitulado "Je Commence", de que muitos se recordarão, com certeza.
Aquele traço elegante e sedutor cativou-me de imediato a atenção e deixou-me de queixo caído, imaginando-me um dia a desenhar assim, enquanto folheava o manual, mesmo sem perceber patavina de francês.
E depois, como se não bastassem os desenhos, aquela assinatura - "Zé Manel" - era demasiado simples (e, por isso mesmo, original) para não nos ficar na memória. Um reflexo, afinal, da personalidade do próprio autor, simples e humilde também.
A primeira vez que eu vira um desenho do Zé Manel, contudo, fora uns bons quarenta anos antes, quando o meu pai estudava à noite e tinha como manual de francês um livro intitulado "Je Commence", de que muitos se recordarão, com certeza.
Aquele traço elegante e sedutor cativou-me de imediato a atenção e deixou-me de queixo caído, imaginando-me um dia a desenhar assim, enquanto folheava o manual, mesmo sem perceber patavina de francês.
E depois, como se não bastassem os desenhos, aquela assinatura - "Zé Manel" - era demasiado simples (e, por isso mesmo, original) para não nos ficar na memória. Um reflexo, afinal, da personalidade do próprio autor, simples e humilde também.
O tempo foi passando.
O Zé Manel continuou a visitar o salão de Moura com regularidade até que, em
2013, foi, finalmente, alvo de uma merecida homenagem, onde recebeu o Troféu
Balanito Especial. Uma bela exposição (com direito a catálogo e DVD
profusamente ilustrados), comissariada pelo investigador Osvaldo de
Sousa, alcançou um enorme sucesso junto do público. O próprio Zé Manel
estava radiante por ter, finalmente, uma exposição e um catálogo que mostravam um
panorama geral - embora necessariamente resumido - sobre a sua imensa e
magnífica obra.
Esta exposição esteve, posteriormente, patente no extinto Centro Nacional de Banda Desenhada e Imagem, na Amadora.
Esta exposição esteve, posteriormente, patente no extinto Centro Nacional de Banda Desenhada e Imagem, na Amadora.
Inauguração do salão Moura BD 2013,
onde a exposição "Eros uma vez... o Humorista Zé Manel", Comissariada por Osvaldo Macedo de Sousa, obteve um tremendo sucesso junto do público.
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Capa e contra-capa do catálogo "Eros
uma vez... o Humorista Zé Manel", Ed. CM Moura (2013) (Investigação e Texto de Osvaldo Macedo de Sousa)
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Em 2013, contudo, o Zé
Manel já dava sinais de estar doente. Notei isso quando, no jantar de
encerramento do Moura BD, lhe pedi, como sempre, para autografar o Livro de
Honra do salão, onde ele sempre fazia questão de rabiscar uma das suas
curvilíneas bonecas. Estranhamente, o Zé Manel começou a esquivar-se e a
dizer que não estava inspirado. Perante o meu espanto e a minha
insistência, lá anuiu e garatujou uma boneca que me deixou apreensivo pela
dificuldade com que foi (não tão bem) desenhada. Percebi, nessa altura,
que algo se passava mas não liguei muito, pensando ser uma situação momentânea.
Terminado o jantar, despedimo-nos e creio que foi essa a última vez que nos vimos.
Falámos mais uma ou duas vezes por telefone mas nunca mais nos cruzámos em festival algum.
Em Dezembro passado, liguei-lhe para saber como estava. Atendeu a Isabel, a esposa, que me relatou um cenário pouco animador. Fiquei de lhe ligar outra vez um dia destes. Já não fui a tempo...
Os desenhos que o Zé Manel fez para o Livro de Honra do salão Moura BD continuam, até hoje, a manter viva a memória dos bons momentos que passámos juntos, em alegre camaradagem, na minha cidade e, por isso, os partilho publicamente pela primeira vez (no meio da uma pequena selecção de fotos) como derradeira homenagem a um dos maiores humoristas gráficos que este país já conheceu.
Até sempre, Zé Manel.
Terminado o jantar, despedimo-nos e creio que foi essa a última vez que nos vimos.
Falámos mais uma ou duas vezes por telefone mas nunca mais nos cruzámos em festival algum.
Em Dezembro passado, liguei-lhe para saber como estava. Atendeu a Isabel, a esposa, que me relatou um cenário pouco animador. Fiquei de lhe ligar outra vez um dia destes. Já não fui a tempo...
Os desenhos que o Zé Manel fez para o Livro de Honra do salão Moura BD continuam, até hoje, a manter viva a memória dos bons momentos que passámos juntos, em alegre camaradagem, na minha cidade e, por isso, os partilho publicamente pela primeira vez (no meio da uma pequena selecção de fotos) como derradeira homenagem a um dos maiores humoristas gráficos que este país já conheceu.
Até sempre, Zé Manel.
Carlos Rico
Zé Manel, Carlos Rico e o
franco-cambojano Será, durante a Cerimónia de Encerramento da Sobreda BD,
onde fomos homenageados, em 2002.
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Zé Manel, António
Finha, Artur Correia, Flávio Almeida e Eugénio Silva,
premiados no 12.º Concurso de BD e Cartune de Moura, em 2004 |
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Com um grupo de
colegas e amigos, visitando a exposição de cartunes de Agim Sulaj, durante o
Moura BD 2011. De pé: Baptista Mendes, Valadas, Zé Manel, José Ruy, Leonardo
De Sá, Geraldes Lino e Álvaro Santos. Agachados: Osvaldo Macedo de Sousa, Diferr e Carlos Rico
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