Saturday, March 22, 2014
Crónica Rosário Breve: O primeiro a sair que diga por onde é que por Daniel Abrunheiro
Antigamente,
só de alguns ofícios se podia afirmar, com razoável caução e inspirada
garantia, que eram profissões/carreiras de
muita saída. Por aflitiva e angustiosa e factual tristeza, hoje são-no
quase todas: os professores estão de
saída, os enfermeiros dirigem-se à saída
aeroportuária, os operários navais estão como na canção do Fausto: “o barco vai de saída”, os funcionários
públicos idem e etc. – tudo e todos tão de
saída, que os mais novos nem a entrar chegam.
É
isto que a lápis mental vou penosamente considerando quando dou de fuças, em
parede antiga de viela baixa-histórica, com a seguinte
gritante-garrafal-caixa-alta-vermelha-spray inscrição:
CRISTO
VAI VOLTAR
– Outro D.
Sebastião… –
rosno eu para com as minhas miudezas botão-acústicas. – Ele que não faça isso, que neste morredouro de míseros nem para Ele
há milagres – cuspinho eu à maneira dos fumadores de mata-ratos.
Tenho
rosnado muito. Muito e em vão, à catedrática maneira dos revolucionários de
sofá, neste cada vez mais redoliano barranco
de cegos a que não adianta bradar Alto
e pára o braille! Rosnar, rosno – mas quase tudo do quase-nada em que esta
choldra piolheira descambou me dá pigarro canídeo à interjeição. E logo a mim,
espécie de lobo desdentado que, se e quando alguma coisa mastiga que não seja o
próprio cuspo, o faz mercê de uma geringonça dentada à base de resina acrílica
plastificadora até do sorriso, quando algum.
No
bolso dextro do blusão, porto um poema de amor inçado e inchado de turva
fatalidade. Mandou-mo um amigo tristonho como eu, que como eu e comigo se
carteia electronicamente a mote de tudo o que seja indignações, gajas boas e
piadolas frescas. Reza assim a missiva (que fiz imprimir por masoquismo):
“Descemos 3 posições no Índice de Desenvolvimento Humano da ONU.
1,4 milhões de desempregados.
Défice sem baixar. Dívida a chegar aos 220 mil milhões.
Adiamento do pagamento de dívida através da troca, de uma taxa de juro de 1,5%, para outra de 4,5%.
PIB ao nível de 2001.
250 mil emigraram, só desde 2011.
2 milhões de pobres, em 2011. E em 2013, 2,750 milhões.
E agora, dados de 2013, 660 mil famílias não conseguiram pagar empréstimos à banca.