Friday, February 10, 2012
Vimaranenses ilustres (1) - Martins Sarmento... por Miguel Salazar
Francisco Martins de Gouveia Morais Sarmento, arqueólogo e escritor, nasceu em Guimarães no ano de 1833.
Estudou latim no Colégio da Lapa (no Porto) e, com apenas quinze anos, foi para Coimbra onde veio a concluir o bacharelato em Direito, tinha então 20 anos.
Das obras literárias que escreveu, salientam-se Os Lusitanos (1880), Ora Marítima (1880) e Os Argonautas (1887).
Martins Sarmento foi o responsável pelo estudo de vários castros e citânias do Norte de Portugal, sendo o seu estudo mais relevante aquele que efectuou sobre a citânia de Briteiros e o castro de Sabroso.
Francisco Martins Sarmento tinha o sonho de fazer a descrição arqueológica de toda a região de Entre Douro e Minho, mas esse foi, no entanto, um projecto que nunca conseguiu concretizar, muito embora tenha deixado um vasto espólio constituído por milhares de páginas de notas manuscritas, onde estão registados os materiais recolhidos nas suas inúmeras expedições.
Foi igualmente importante a sua actividade como fotógrafo, iniciada em 1868. Pioneiro da fotografia de carácter científico, deixou centenas de negativos em vidro, na sua maior parte e como não podia deixar de ser, sobre arqueologia.
Em 1882, um grupo de vimaranenses ilustres, em homenagem ao sábio arqueólogo, criou a Sociedade Martins Sarmento, que estabeleceu como seu principal propósito o fomento da instrução popular, desenvolvendo desde logo uma importante acção de dinamização cultural.
Alberto Sampaio, outro ilustre vimaranense, descrevia assim o seu amigo…
“Alto, magro, de cabelos pretos retintos, a tez morena, o passo apressado, destacava-se em qualquer grupo, à primeira vista. Fisiologicamente um nervoso, falando por meias palavras, rápido e breve no discurso, como um homem que não pode desperdiçar o tempo, às vezes custava a perceber. A sua conversação usual, tocando aqui e ali a fugir, entrecortada de ditos alegres ou picantes, se carecia de atracção enlevadora, transbordava de típica graça portuguesa”
Quando, em 1875, Martins Sarmento iniciou o estudo da Citânia de Briteiros, o universo dos castros era uma incógnita e a arqueologia portuguesa dava os seus primeiros passos.
O povo é que muitas vezes não conseguia compreender a importância do seu trabalho e, na sua simplicidade, dizia (comentário registado no seu diário)…
“Em vez de gastar tanto dinheiro a tombar pedras e a revolver montes, maior proveito tiraria o Sr. Sarmento se legasse o que aqui desperdiça para que lhe fossem rezadas missas pela sua alma, quando morrer”
Martins Sarmento foi um dos pioneiros na utilização da fotografia como novo método de registo dos achados arqueológicos, substituindo assim o desenho.
As fotografias que tirou estiveram na origem da arqueologia científica em Portugal.
Aliás, a divulgação da Citânia de Briteiros está intimamente associada à fotografia. Na verdade, será através de dois álbuns fotográficos, que o arqueólogo vimaranense vai divulgar os resultados das suas pesquisas.
Correspondeu-se o sábio vimaranense com muitas das figuras mais ilustres do seu tempo, e o seu nome figura hoje em muitos tratados de arqueologia clássica.
Escrevia Alberto Sampaio a esse respeito…
“Homens distintos e vulgares, especialistas superiores ou simples amadores de arqueologia e folclore, recebia-os com urbanidade e agrado. Raro seria o forasteiro qualificado que viesse a Guimarães e o não procurasse”
É exactamente na sequência desta relação privilegiada com os seus pares que, em 1887, se realiza em Guimarães a primeira reunião científica de arqueologia, em Portugal.
Antes de morrer, em 1899, legou à Sociedade Martins Sarmento os milhares de livros da sua biblioteca, bem como todo o seu espólio científico, constituído em grande parte por peças arqueológicas.
Alberto Sampaio, que assistiu à sua morte, descreve assim os últimos momentos de Martins Sarmento…
“Regressando de Briteiros em 19 de Junho de 1899 quase saiu da carruagem para a cama. Cortado de dores que o imobilizavam numa única posição, sem palavras de lamentação ou de amargura, viu a doença aumentar dia a dia com a impassibilidade estóica dos fortes, até que em 9 de Agosto sucumbiu à hora e meia da tarde. Mas pouco antes, quando a morte se debruçava sobre a fronte a dar-lhe o beijo da eterna paz, estendendo o braço emagrecido sobre a dobra do lençol, e dispondo a mão, como se tivesse uma pena, fazia o jeito de escrever, de quem escrevia freneticamente. Que pensamentos que tanto quis e não pôde exprimir lhe revolveriam o cérebro agonizante? E assim acabou, agitado num turbilhão de ideias, sem conhecer a velhice intelectual, quem passara um quarto de século a procurar raios de luz, que iluminassem as trevas do passado”
Fernão Rinada
(caricatura publicada no blogue Memórias de Araduca)