Sunday, March 01, 2009
Historia da Caricatura de Imprensa em Portugal - 1892 (João Amaral, Alonso)
Por: Osvaldo Macedo de Sousa
Em 92 surgem mais títulos, numa roda viva, ou seja "O Gato Preto" (desenhos de J. Galvào), "Universal"... Ao referir estes títulos, não quer dizer que esteja a mencionar todos os jornais satíricos, ou jornais com ilustrações humorísticas que foram publicados em Portugal ao longo de todos estes anos.
Na realidade tem havido uma série de títulos que têm passado ao lado, ou porque os desenhos são muito maus, ou porque raramente têm ilustrações, ou porque têm gravuras não políticas, mas de entretenimento infantil, de modas, de narrativa gráfica... É impossível, e fastidioso, fazer aqui a listagem de todas os periódicos, porque como já referi parecem cogumelos com desenvolvimento e morte espontânea. Refiro normalmente os mais importantes, e um ou outro que não merecendo grande registo para a história, fica apenas como apontamento da diversidade da imprensa que se foi desenvolvendo ao longo destes anos.
Em relação aos caricaturistas, nem sempre temos desenvolvido as referências a todos eles. A respectiva selecção tem duas vertentes: o desconhecimento de dados biográficos já que a maioria deles surgem e desaparecem no nada), ou porque a sua qualidade estética é tão baixa, que não merecem desenvolvimento de dados informativos. Contudo nesta década de 90 irá surgir uma nova geração de caricaturistas que enriquecerão esta arte, e apesar de poucos deles estarem ao nível do grande mestre, serão a garantia da continuidade da caricatura nos anos vindouros. Precisamente neste ano, nas páginas da "Galeria Portuguesa" (1892/3) surge um novo artista, que assina João Amaral, mas que por baptismo é João Moreira Guedes do Amaral (aqui também colaborará João Constantino).
O seu biógrafo Francisco Cordeiro Laranjo, em catálogo de exposição retrospectiva de 1974, descreve a sua biografia da seguinte forma: «Viviam seus pais ao fundo da Olaria, a 4 de Novembro de 1874, quando nasceu. Naquela rua (que o nome não confunda, quem não conhece Lamego) naturalmente, tinha seu pai oficina e estabelecimento de sapataria. Mudaram-se depois para a Rua Macário de Castro, onde a mãe Damiana amassava a afamada «triga-milha». »
«/.../ Nasceu com o gosto pelo desenho, mas os mestres Gregório Lopes, Cristovão de Figueiredo e Garcia Fernandes já há muito haviam morrido. Quem, agora, para mestre ? »
«Demanda o Porto e trabalha como lavrante de ourives, no estabelecimento de um irmão mais velho e frequenta, como ouvinte, a Academia Portuense das Belas Artes.»
«É desta altura o "Álbum de Serões" onde deixa as suas primeiras caricaturas. Dedica este trabalho a seu irmão Luís, a quem era muito afeiçoado. Esta amizade, e não só, levou-o até ao Brasil, mas a saúde não lhe consentiu permanência naquelas paragens.»
«No Porto, os seus trabalhos artísticos passam pelos admirados olhos dos colegas nas Belas Artes, e são apreciados pelo grande mestre que foi Bordalo Pinheiro. Colabora então na "Galeria Portuguesa" (1892-93), é director artístico do "Charivari" (1898), desenha para o jornal "Raboleva" (1905), para o "Riso" (1905), para ''A Careta" (1909) , para "O Norte" (1909), para "O Século Cómico" (1913) e para outros.»
«Mais tarde, os seus desenhos irão aparecer também em obras como ''Artistas de Lamego" de Vergílio Correia, "Monumentos e Esculturas" do mesmo autor e "Mobiliário Artístico Português" de Alfredo Guimarães e Albano Sardoeira.»
«Nas «festas», todo o bom lamecense - e João Amaral era lamecense dos quatro costados - vem a Lamego. Aqui se acendem outras paixões: a que o leva a dedicar-se ao teatro amador, e a que o conduziu ao casamento. Então, constituída família, à boa maneira patriarcal, não volta para a cidade das Artes livres. João Amaral ensina agora desenho e pintura na sua terra natal. O grande pedagogo que foi o Padre Alfredo Pinto Teixeira, ao tempo Director do Colégio de Lamego, convida-o a ingressar no seu corpo docente, onde amparou e estimulou carinhosamente as vocações artísticas que ali descobria.»
«Outro notável lamecense, o Doutor Alfredo de Sousa, conheceu em João Amaral, o fundador e primeiro Director do Museu de Lamego no antigo Paço, que se deve à munificência do Bispo D. Manoel de Vasconcelos Pereira.»
João Amaral no campo do teatro foi também autor, encenador e cenógrafo. Morreu a 27 de Julho de 1955.
Em relação aos temas políticos, naturalmente o azedume continuava em relação à imperial Inglaterra, a terra dos bêbados, dos desacateiros planetários, a terra do John Bull.
Os símbolos nacionais não nascem espontaneamente, antes surgem sob uma pressão social e estética. Se o Zé Povinho nasceu perante o desespero caricatural, e com desprezo por um povo amorfo e sem brio nacional, o John Bull nasceu como fleuma nacionalista contra os sonhos imperiais de um Napoleão continental, francês. Esse orgulho de raça, desenhado primeiro como um boi possante, aliado à Britânia, passou posteriormente a ser representado como um bojudo personagem, bem alimentado pelas colónias que foi invadindo e roubando, de faces rubras pelo sangue espezinhado pelos Drakes Piratas, e que na sua soberba imperial foi conquistando inimigos por todo o mundo.
Portugal e a Inglaterra, segundo diz a história e alguns documentos, têm a mais velha aliança no mundo das nações, contudo frequentes vezes essa aliança foi "traída" (sempre pela segunda outorgante), e o John Bull considerado como um dos piores inimigos da nossa soberania e nacionalidade. Se raramente o John Bull surge na nossa caricatura como um aliado, na segunda metade do século era esta a sua imagem:
"No seu aprumo de pessoa fina / O John espanta uma cidade inteira / e anda a cahir de bebado, se apanha / de vinho bom, sortida garrafeira.
E d'ouro tendo os cofres atulhados / pois que do céu parece que lhe cai / para roubar-lhe a caixa do relógio / John é capaz d'assassinar o seu Pae.
Enfim! Enfim! é um vicioso e mau! / Na City espalha o grito de terror / e o mundo aponta o nome seu, dizendo / - É John Bull, o Jack estripador! (Almeida e Silva, in "Charivari" 22/2/1890)
Sentindo-se estripado no orgulho e na aliança, por mor de um ultimatum, as simpatias do Zé para com ele não eram muitas, e o caricaturista não se cansará de o denunciar: "Cathecismo Anglo-Germânico: Obras de Misericórdia - 1°: Tirar a camisa a quem a tiver" (Nogueira in "Pontos" 16/7/1899);
'«A amabilidade Inglesa - O rapazinho Zé anda mal arranjado, traz uma gravata que é uma indecência. John Bull, caridoso, dá-lhe uma nova e leva a sua amabilidade até ao ponto de lha pôr ao pescoço. Mas quando lhe der o nó hão-de ver como ele aperta com força (esganando-o)» (MGBP in "António Maria" 917/1892)
«Carícias de John Bull- Eis como a Inglaterra nos abraça e nos beija, levando-nos a carne, a bolsa, e o fato. Abraços de tigre, e beijos de Judas. Bandidos!...» (Almeida e Silva in "Charivari", 25/1/90) Deu-se pois, nesses tempos, o confronto entre o Zé despeitado, e um John Soberbo pleno de "humour" superior, que mesmo difamado, insultado, querelado nunca deixou de se instalar com os seus negócios, manter as suas feitorias... e sempre com um barco à disposição de D. Carlos para o caso deste necessitar de fugir à república.
Para a monarquia parecia que estes casos eram somenos, e os partidos o que queriam era sobreviver, com cada político a lutar desesperadamente pela sua manutenção no poder, mesmo que para isso fosse necessário mudar de partido, jogando nas transferências constantes, já que, fosse qual fossem os nomes dos partidos monárquicos, todos tinham a mesma ideologia. E como diz o adágio popular "De Deus vem o bem, e do Governo vem o mal" (in Pontos nos ii de 11/9/1890)
O mal principal que vinha do governo, eram os impostos que cada vez mais espartilhavam o Zé, uma grande espiga sob os seus ombros: «...todos têm a sua espiga: uns a doença, outros os empregos, outros os jornais e todos a falta de dinheiro, a maior de todas as espigas» (RBP, in António Maria 27/5/82)
O imposto é uma necessidade governamental: « - O patriotismo exige que o país se dispa um pouco mais ... - Mais do que isto? (pergunta o Zé já todo nu) - Sim, exige-o o patriotismo» (RBP, in Amónio Maria 13/1/81), já que como o desenhou Cecília em 1848, o Orçamento é uma cuba rota, que os impostos nunca conseguem encher. Só que quem paga mais, não é quem tem, mas sempre o que não tem, o Zé - «Aguenta, Zé! A coisa vem do alto, manda-a nosso senhor; portanto puxa dos cordões à bolsa, paga e não bufes!... » (Almeida e Silva, in Charivari 26/4/90)
Neste ano de 92, ao lado de M.Pinto, começam a surgir no "Charivari" trabalhos assinados por Alonso, e outros por Santos Silva. Na realidade "Alonso" era o pseudónimo de Joaquim Guilherme Santos Silva, e tudo leva a crer que ambos são uma pessoa só, mas ao mesmo tempo é estranho o mesmo artista assinar com dois nomes diferentes no mesmo jornal, principalmente quando a colaboração nem é muito abundante.
Alonso, ou Joaquim Guilherme Santos Silva é um lisboeta nado em 1871 (morre em Sintra em 1948), e que se afirmaria nas diversas vertentes artísticas, como a decoração, publicidade, ilustração, banda desenhada, professorado (Mestre na Escola Amónio Arroio), mas onde o humor teve um papel sempre presente, e fundamental na sua obra. O seu traço, apesar de marcado pela época, conseguirá uma identidade própria, com humor irónico, simples mas agradável, sem deixar contudo de ser crítico e incisivo.
Ficará também como marca da sua personalidade, a grande humildade, e a pacatez da sua vida, sempre pronto a trabalhar, colaborar, criticar, as não entrar em querelas inúteis. Exercia sua profissão com ética, e se possível com o espírito mais eclético possível, sem recusar o anarco-sindicalismo, o monarquismo, o republicanismo... procurando a objectividade caricatural que Raphael já tinha defendido de ser oposição ao governo, e oposição às oposição. Raphaelista de formação estética, e oposicionista por opção satírica, será um dos casos curiosos de republicano durante a monarquia, e monárquico durante a república.
Vasta é a sua obra gráfica, começando, como já referi no "Charivari" do Porto, para onde enviava os seus trabalhos, passando posteriormente pelo "Passatempo", "O Arauto", "A Paródia", "Os Ridículos", "O Século", "Ilustração", "O Thalassa" ... entrando pela Primeira República, passando pelo Estado Novo voltando a falar da sua obra nesses volumes. De todas as suas colaborações ficará a sua marca principalmente em "Os Ridículos" onde durante três décadas terá direito à primeira página.
Em 92 surgem mais títulos, numa roda viva, ou seja "O Gato Preto" (desenhos de J. Galvào), "Universal"... Ao referir estes títulos, não quer dizer que esteja a mencionar todos os jornais satíricos, ou jornais com ilustrações humorísticas que foram publicados em Portugal ao longo de todos estes anos.
Na realidade tem havido uma série de títulos que têm passado ao lado, ou porque os desenhos são muito maus, ou porque raramente têm ilustrações, ou porque têm gravuras não políticas, mas de entretenimento infantil, de modas, de narrativa gráfica... É impossível, e fastidioso, fazer aqui a listagem de todas os periódicos, porque como já referi parecem cogumelos com desenvolvimento e morte espontânea. Refiro normalmente os mais importantes, e um ou outro que não merecendo grande registo para a história, fica apenas como apontamento da diversidade da imprensa que se foi desenvolvendo ao longo destes anos.
Em relação aos caricaturistas, nem sempre temos desenvolvido as referências a todos eles. A respectiva selecção tem duas vertentes: o desconhecimento de dados biográficos já que a maioria deles surgem e desaparecem no nada), ou porque a sua qualidade estética é tão baixa, que não merecem desenvolvimento de dados informativos. Contudo nesta década de 90 irá surgir uma nova geração de caricaturistas que enriquecerão esta arte, e apesar de poucos deles estarem ao nível do grande mestre, serão a garantia da continuidade da caricatura nos anos vindouros. Precisamente neste ano, nas páginas da "Galeria Portuguesa" (1892/3) surge um novo artista, que assina João Amaral, mas que por baptismo é João Moreira Guedes do Amaral (aqui também colaborará João Constantino).
O seu biógrafo Francisco Cordeiro Laranjo, em catálogo de exposição retrospectiva de 1974, descreve a sua biografia da seguinte forma: «Viviam seus pais ao fundo da Olaria, a 4 de Novembro de 1874, quando nasceu. Naquela rua (que o nome não confunda, quem não conhece Lamego) naturalmente, tinha seu pai oficina e estabelecimento de sapataria. Mudaram-se depois para a Rua Macário de Castro, onde a mãe Damiana amassava a afamada «triga-milha». »
«/.../ Nasceu com o gosto pelo desenho, mas os mestres Gregório Lopes, Cristovão de Figueiredo e Garcia Fernandes já há muito haviam morrido. Quem, agora, para mestre ? »
«Demanda o Porto e trabalha como lavrante de ourives, no estabelecimento de um irmão mais velho e frequenta, como ouvinte, a Academia Portuense das Belas Artes.»
«É desta altura o "Álbum de Serões" onde deixa as suas primeiras caricaturas. Dedica este trabalho a seu irmão Luís, a quem era muito afeiçoado. Esta amizade, e não só, levou-o até ao Brasil, mas a saúde não lhe consentiu permanência naquelas paragens.»
«No Porto, os seus trabalhos artísticos passam pelos admirados olhos dos colegas nas Belas Artes, e são apreciados pelo grande mestre que foi Bordalo Pinheiro. Colabora então na "Galeria Portuguesa" (1892-93), é director artístico do "Charivari" (1898), desenha para o jornal "Raboleva" (1905), para o "Riso" (1905), para ''A Careta" (1909) , para "O Norte" (1909), para "O Século Cómico" (1913) e para outros.»
«Mais tarde, os seus desenhos irão aparecer também em obras como ''Artistas de Lamego" de Vergílio Correia, "Monumentos e Esculturas" do mesmo autor e "Mobiliário Artístico Português" de Alfredo Guimarães e Albano Sardoeira.»
«Nas «festas», todo o bom lamecense - e João Amaral era lamecense dos quatro costados - vem a Lamego. Aqui se acendem outras paixões: a que o leva a dedicar-se ao teatro amador, e a que o conduziu ao casamento. Então, constituída família, à boa maneira patriarcal, não volta para a cidade das Artes livres. João Amaral ensina agora desenho e pintura na sua terra natal. O grande pedagogo que foi o Padre Alfredo Pinto Teixeira, ao tempo Director do Colégio de Lamego, convida-o a ingressar no seu corpo docente, onde amparou e estimulou carinhosamente as vocações artísticas que ali descobria.»
«Outro notável lamecense, o Doutor Alfredo de Sousa, conheceu em João Amaral, o fundador e primeiro Director do Museu de Lamego no antigo Paço, que se deve à munificência do Bispo D. Manoel de Vasconcelos Pereira.»
João Amaral no campo do teatro foi também autor, encenador e cenógrafo. Morreu a 27 de Julho de 1955.
Em relação aos temas políticos, naturalmente o azedume continuava em relação à imperial Inglaterra, a terra dos bêbados, dos desacateiros planetários, a terra do John Bull.
Os símbolos nacionais não nascem espontaneamente, antes surgem sob uma pressão social e estética. Se o Zé Povinho nasceu perante o desespero caricatural, e com desprezo por um povo amorfo e sem brio nacional, o John Bull nasceu como fleuma nacionalista contra os sonhos imperiais de um Napoleão continental, francês. Esse orgulho de raça, desenhado primeiro como um boi possante, aliado à Britânia, passou posteriormente a ser representado como um bojudo personagem, bem alimentado pelas colónias que foi invadindo e roubando, de faces rubras pelo sangue espezinhado pelos Drakes Piratas, e que na sua soberba imperial foi conquistando inimigos por todo o mundo.
Portugal e a Inglaterra, segundo diz a história e alguns documentos, têm a mais velha aliança no mundo das nações, contudo frequentes vezes essa aliança foi "traída" (sempre pela segunda outorgante), e o John Bull considerado como um dos piores inimigos da nossa soberania e nacionalidade. Se raramente o John Bull surge na nossa caricatura como um aliado, na segunda metade do século era esta a sua imagem:
"No seu aprumo de pessoa fina / O John espanta uma cidade inteira / e anda a cahir de bebado, se apanha / de vinho bom, sortida garrafeira.
E d'ouro tendo os cofres atulhados / pois que do céu parece que lhe cai / para roubar-lhe a caixa do relógio / John é capaz d'assassinar o seu Pae.
Enfim! Enfim! é um vicioso e mau! / Na City espalha o grito de terror / e o mundo aponta o nome seu, dizendo / - É John Bull, o Jack estripador! (Almeida e Silva, in "Charivari" 22/2/1890)
Sentindo-se estripado no orgulho e na aliança, por mor de um ultimatum, as simpatias do Zé para com ele não eram muitas, e o caricaturista não se cansará de o denunciar: "Cathecismo Anglo-Germânico: Obras de Misericórdia - 1°: Tirar a camisa a quem a tiver" (Nogueira in "Pontos" 16/7/1899);
'«A amabilidade Inglesa - O rapazinho Zé anda mal arranjado, traz uma gravata que é uma indecência. John Bull, caridoso, dá-lhe uma nova e leva a sua amabilidade até ao ponto de lha pôr ao pescoço. Mas quando lhe der o nó hão-de ver como ele aperta com força (esganando-o)» (MGBP in "António Maria" 917/1892)
«Carícias de John Bull- Eis como a Inglaterra nos abraça e nos beija, levando-nos a carne, a bolsa, e o fato. Abraços de tigre, e beijos de Judas. Bandidos!...» (Almeida e Silva in "Charivari", 25/1/90) Deu-se pois, nesses tempos, o confronto entre o Zé despeitado, e um John Soberbo pleno de "humour" superior, que mesmo difamado, insultado, querelado nunca deixou de se instalar com os seus negócios, manter as suas feitorias... e sempre com um barco à disposição de D. Carlos para o caso deste necessitar de fugir à república.
Para a monarquia parecia que estes casos eram somenos, e os partidos o que queriam era sobreviver, com cada político a lutar desesperadamente pela sua manutenção no poder, mesmo que para isso fosse necessário mudar de partido, jogando nas transferências constantes, já que, fosse qual fossem os nomes dos partidos monárquicos, todos tinham a mesma ideologia. E como diz o adágio popular "De Deus vem o bem, e do Governo vem o mal" (in Pontos nos ii de 11/9/1890)
O mal principal que vinha do governo, eram os impostos que cada vez mais espartilhavam o Zé, uma grande espiga sob os seus ombros: «...todos têm a sua espiga: uns a doença, outros os empregos, outros os jornais e todos a falta de dinheiro, a maior de todas as espigas» (RBP, in António Maria 27/5/82)
O imposto é uma necessidade governamental: « - O patriotismo exige que o país se dispa um pouco mais ... - Mais do que isto? (pergunta o Zé já todo nu) - Sim, exige-o o patriotismo» (RBP, in Amónio Maria 13/1/81), já que como o desenhou Cecília em 1848, o Orçamento é uma cuba rota, que os impostos nunca conseguem encher. Só que quem paga mais, não é quem tem, mas sempre o que não tem, o Zé - «Aguenta, Zé! A coisa vem do alto, manda-a nosso senhor; portanto puxa dos cordões à bolsa, paga e não bufes!... » (Almeida e Silva, in Charivari 26/4/90)
Neste ano de 92, ao lado de M.Pinto, começam a surgir no "Charivari" trabalhos assinados por Alonso, e outros por Santos Silva. Na realidade "Alonso" era o pseudónimo de Joaquim Guilherme Santos Silva, e tudo leva a crer que ambos são uma pessoa só, mas ao mesmo tempo é estranho o mesmo artista assinar com dois nomes diferentes no mesmo jornal, principalmente quando a colaboração nem é muito abundante.
Alonso, ou Joaquim Guilherme Santos Silva é um lisboeta nado em 1871 (morre em Sintra em 1948), e que se afirmaria nas diversas vertentes artísticas, como a decoração, publicidade, ilustração, banda desenhada, professorado (Mestre na Escola Amónio Arroio), mas onde o humor teve um papel sempre presente, e fundamental na sua obra. O seu traço, apesar de marcado pela época, conseguirá uma identidade própria, com humor irónico, simples mas agradável, sem deixar contudo de ser crítico e incisivo.
Ficará também como marca da sua personalidade, a grande humildade, e a pacatez da sua vida, sempre pronto a trabalhar, colaborar, criticar, as não entrar em querelas inúteis. Exercia sua profissão com ética, e se possível com o espírito mais eclético possível, sem recusar o anarco-sindicalismo, o monarquismo, o republicanismo... procurando a objectividade caricatural que Raphael já tinha defendido de ser oposição ao governo, e oposição às oposição. Raphaelista de formação estética, e oposicionista por opção satírica, será um dos casos curiosos de republicano durante a monarquia, e monárquico durante a república.
Vasta é a sua obra gráfica, começando, como já referi no "Charivari" do Porto, para onde enviava os seus trabalhos, passando posteriormente pelo "Passatempo", "O Arauto", "A Paródia", "Os Ridículos", "O Século", "Ilustração", "O Thalassa" ... entrando pela Primeira República, passando pelo Estado Novo voltando a falar da sua obra nesses volumes. De todas as suas colaborações ficará a sua marca principalmente em "Os Ridículos" onde durante três décadas terá direito à primeira página.