Tuesday, December 09, 2008
Prémio Ibero-Americano Quevedos 2008 para ZIRALDO Alves Pinto
Madrid, 09 Dez (Lusa) - O escritor e caricaturista brasileiro Ziraldo Alves Pinto conquistou hoje em Espanha o VI Prémio Ibero-americano de Humor Gráfico "Quevedos", pela "qualidade e importância da sua obra, o seu compromisso social e a sua grande repercussão e difusão internacional".
Este galardão bienal, instituído pelos ministérios da Cultura e dos Negócios Estrangeiros de Espanha, tem uma dotação de 30.000 euros.
A decisão do júri, que se reuniu na Universidade Alcalá de Henares, Madrid, foi adoptada por maioria e após sucessivas votações. O prémio distingue a trajectória profissional de humoristas gráficos espanhóis e ibero-americano cuja obra se destaque pelo seu significado social e artístico.
Ziraldo Alves Pinto, mais conhecido como Ziraldo, é um artista tão popular que se fizeram filmes com algumas das personagens que criou, como por exemplo o Menino Maluquinho, também adaptado ao teatro. É ainda autor de livros infantis, que ele mesmo ilustra.
Os seus desenhos e caricaturas são conhecidos em todo o mundo. Ziraldo nasceu em 1932 em Caratinga, estado de Minas Gerais, e os seus pais chamaram-lhe Ziraldo para unirem os seus respectivos nomes, Zizinha e Geraldo.
Tinha seis anos quando publicou o seu primeiro desenho no jornal "A Folha de Minas". Esse foi o começo de uma carreira ao longo da qual recebeu prémios importantes como o internacional do Salão de Caricatura de Bruxelas, o "Merghantelle" de 1969 e o prémio da Imprensa Livre da América Latina.
Ziraldo colaborou em praticamente todos os "media" do seu país. Em 1963 começou a trabalhar no "Jornal do Brasil", onde continua a publicar uma "tira" de humor que se converteu há muito numa referência indispensável.
"Jeremias o bom", "A super-mãe" e o "Mineirinho" são personagens que criou e foram muito populares nos anos 60. Em 1957 começou a publicar na revista "A cigarra".
Em 1964, quando os militares tomaram o poder no Brasil, foi suspensa a publicação de "O pasquim", o maior periódico inconformista da imprensa brasileira, que Ziraldo fundara com outro humorista, mas as suas personagens sobreviveram aos "anos de chumbo" do militarismo.
Nesse período de ditadura (1964-1984) Ziraldo desenvolveu um intenso trabalho de resistência à repressão. Em 1999 criou duas revistas, "Bundas" e "Palavras".
Pintor, caricaturista, desenhador gráfico, jornalista e autor de teatro, publicou vários livros para crianças, traduzidos para italiano, inglês, francês, alemão e basco.
RMM.
© 2008 LUSA - Agência de Notícias de Portugal, S.A.2008-12-09 18:55:01
Este galardão bienal, instituído pelos ministérios da Cultura e dos Negócios Estrangeiros de Espanha, tem uma dotação de 30.000 euros.
A decisão do júri, que se reuniu na Universidade Alcalá de Henares, Madrid, foi adoptada por maioria e após sucessivas votações. O prémio distingue a trajectória profissional de humoristas gráficos espanhóis e ibero-americano cuja obra se destaque pelo seu significado social e artístico.
Ziraldo Alves Pinto, mais conhecido como Ziraldo, é um artista tão popular que se fizeram filmes com algumas das personagens que criou, como por exemplo o Menino Maluquinho, também adaptado ao teatro. É ainda autor de livros infantis, que ele mesmo ilustra.
Os seus desenhos e caricaturas são conhecidos em todo o mundo. Ziraldo nasceu em 1932 em Caratinga, estado de Minas Gerais, e os seus pais chamaram-lhe Ziraldo para unirem os seus respectivos nomes, Zizinha e Geraldo.
Tinha seis anos quando publicou o seu primeiro desenho no jornal "A Folha de Minas". Esse foi o começo de uma carreira ao longo da qual recebeu prémios importantes como o internacional do Salão de Caricatura de Bruxelas, o "Merghantelle" de 1969 e o prémio da Imprensa Livre da América Latina.
Ziraldo colaborou em praticamente todos os "media" do seu país. Em 1963 começou a trabalhar no "Jornal do Brasil", onde continua a publicar uma "tira" de humor que se converteu há muito numa referência indispensável.
"Jeremias o bom", "A super-mãe" e o "Mineirinho" são personagens que criou e foram muito populares nos anos 60. Em 1957 começou a publicar na revista "A cigarra".
Em 1964, quando os militares tomaram o poder no Brasil, foi suspensa a publicação de "O pasquim", o maior periódico inconformista da imprensa brasileira, que Ziraldo fundara com outro humorista, mas as suas personagens sobreviveram aos "anos de chumbo" do militarismo.
Nesse período de ditadura (1964-1984) Ziraldo desenvolveu um intenso trabalho de resistência à repressão. Em 1999 criou duas revistas, "Bundas" e "Palavras".
Pintor, caricaturista, desenhador gráfico, jornalista e autor de teatro, publicou vários livros para crianças, traduzidos para italiano, inglês, francês, alemão e basco.
RMM.
© 2008 LUSA - Agência de Notícias de Portugal, S.A.2008-12-09 18:55:01
Ziraldo, o revolucionário do traço
Ziraldo Alves Pinto, nasceu no dia 24 de outubro de 1932, em Caratinga/Minas Gerais. É o mais velho de uma família de sete irmãos. Seu nome vem da combinação dos nomes de sua mãe, Zizinha com o de seu pai Geraldo: assim surgiu o Zi-raldo, um nome único.
Em 1949 foi com o avô para o Rio de Janeiro, onde cursou dois anos no MABE (Moderna Associação de Ensino). Em 1950 voltou para Caratinga para fazer o Tiro de Guerra. Terminou o Científico no Colégio Nossa Senhora das Graças. Formou-se em Direito na Faculdade de Direito de Minas Gerais em Belo Horizonte, em 1957. Começou sua carreira nos anos 50 em jornais e revistas de expressão, como Jornal do Brasil, O Cruzeiro, Folha de Minas, etc. Além de pintor, é cartazista, jornalista, teatrólogo, chargista, caricaturista, colecionador de piadas e escritor.
Ziraldo tem paixão pelo desenho. Desenhava em todos os lugares - na calçada, nas paredes, na sala de aula. Outra de suas paixões desde a infância é a leitura. Lia tudo que lhe caia nas mãos: Monteiro Lobato, Viriato Correa, Clemente Luz (O Mágico), e todas as revistas em quadrinhos da época. Já nesse momento, ao ler as páginas do primeiro "Gibi", sentiu que ali estava o seu futuro.
Ziraldo fez cartazes para inúmeros filmes do cinema brasileiro como Os Fuzis, Os Cafajestes, Selva Trágica, Os Mendigos, etc. Foi no Rio de Janeiro, que Ziraldo se consagrou como um dos artistas gráficos mais conhecidos e respeitados nacional e internacionalmente.
A carreira de Ziraldo começou na revista Era Uma Vez..., com colaborações mensais. Em 1954, começa a trabalhar no Jornal A Folha de Minas com uma página de humor. Por coincidência foi esse mesmo jornal que publicou o seu primeiro desenho em 1939, quando tinha apenas seis anos.
Em 1957, começou a publicar seus trabalhos na revista A Cigarra, e posteriormente em O Cruzeiro. No decorrer dos anos 60, seus cartuns e charges políticas começaram a aparecer na revista O Cruzeiro e no Jornal do Brasil. Personagens como Jeremias, O Bom, a Supermãe e posteriormente o Mineirinho, tornaram-se popularíssimas.
Em 1963, começou a colaborar com O Jornal do Brasil, onde até hoje publica diariamente uma tira de comics. Trabalhou ainda na revista Visão e Fairplay.
Durante o período da ditadura militar (1964-1984), Ziraldo realizou um trabalho intenso de resistência à repressão. Fundou, junto com outros humoristas, o mais importante jornal não-conformista da história da imprensa brasileira, O Pasquim. Ziraldo o considera um grande celeiro dos humoristas pós-68.
Quando foi editado o AI-5, durante a Revolução Militar, muita gente contrária ao regime procurou se esconder para escapar à prisão. Ziraldo passou a noite ajudando a esconder os amigos e não se preocupou consigo mesmo.
No dia seguinte à edição do famigerado ato, foi preso em sua residência e levado para o Forte de Copacabana por ser considerado um elemento perigoso. Ficou encarcerado, por dois meses com Jaguar e parte da turma do Pasquim na Vila Militar. Eles foram presos em outubro, e saíram de lá em dezembro de 1970.
Em 1964, com a tomada do poder pelos militares, a revista encerrou sua carreira. Era nacionalista demais para sobreviver àqueles tempos. Entretanto, a força desses personagens, tão tipicamente brasileiros, resistiu aos difíceis anos da ditadura. Em 1975, voltaram a ser publicados pela Editora Abril. Atualmente, as melhores histórias estão sendo reeditadas em álbuns pela Editora Salamandra.
Em 1968, Ziraldo teve reconhecido o seu talento internacionalmente, com a publicação de suas produções na revista Graphis, uma espécie de Panthéon das artes gráficas. Teve ainda trabalhos publicados nas revistas internacionais Penthouse e Private Eye da Inglaterra, Plexus e Planète da França e Mad dos Estados Unidos.
No ano de 1969, grandes acontecimentos marcaram a vida do artista. Ganhou o Oscar Internacional de Humor no 32º Salão Internacional de Caricaturas de Bruxelas e o prêmio Merghantealler - prêmio máximo da imprensa livre da América Latina, patrocinado pela Associação Internacional de Imprensa, recebido em Caracas, Venezuela. Foi convidado a desenhar o cartaz anual da UNICEF, honraria concedida pela primeira vez a um artista latino.
Diversas revistas internacionais usam seus desenhos em capas, inclusive Vision, Playboy e a GQ (Gentlemen's Quaterly). Seuscartuns percorrem revistas de várias partes do mundo. Alguns de seus desenhos foram selecionados para fazer parte do acervo do Museu da Caricatura de Basiléia, na Suíça.
A partir de 1979, Ziraldo passou a dedicar mais tempo à sua antiga paixão: escrever histórias para crianças. Nesse ano publicou: O Planeta Lilás, um poema de amor ao livro, onde mostra que o livro é maior que o Universo, que cabe inteirinho dentro de suas páginas.
Em 1980, Ziraldo recebeu sua maior consagração como autor infantil na Bienal do Livro de São Paulo, com o lançamento de O Menino Maluquinho. O livro se transformou no maior sucesso editorial da Feira e ganhou o Prêmio Jabuti da Câmara Brasileira do Livro em São Paulo. Esse livro foi adaptado para o teatro, cinema e em ópera infantil pelo Maestro Ernani Aguiar. O Menino Maluquinho virou um verdadeiro símbolo do Menino Nacional.
Em 1994, O Menino Maluquinho, o Bichinho da Maçã, a Turma do Pererê e o próprio Saci Pererê, transformam-se em selos comemorativos do Natal. Nessa homenagem dos Correios e Telégrafos ao artista, sua arte foi espalhada pelos quatro cantos do planeta, com votos de Boas Festas, Feliz Natal e Feliz Ano Novo.
Em 1999, criou, de uma só vez, duas revistas que sacudiram os conceitos do ramo editorial: Bundas e Palavra. Bundas foi uma resposta bem-humorada à ostentação dos “famosos” que semanalmente aparece na revista Caras. Reuniu grandes escritores, analistas políticos e cartunistas, muitos revelados no O Pasquim - que durou 20 anos e marcou época.. Ao contrário do que o nome podia sugerir, era uma revista que tratava de assuntos muito sérios, todos ligados ao destino político do país. Por sua vez, Palavra se destinava a divulgar e discutir a arte que se faz longe do eixo Rio - São Paulo, que concentra a maior parte das publicações nacionais do gênero. É uma revista marcada pelo requinte da produção gráfica e pela originalidade do conteúdo.
Por ter criado uma vasta obra na área da literatura infanto-juvenil, Ziraldo foi convidado, em 2000, para montar um parque de diversões temático em Brasília. No Ziramundo, as crianças podem rodar dentro da panela do Menino Maluquinho e subir à Lua com o FLICTS.
Com o fim de Bundas, Ziraldo continuou a articular seus colaboradores para sustentar uma publicação de humor e opinião. Logo no início de 2002, surgiu O Pasquim21, um jornal semanal que faz alusão ao histórico O Pasquim e continua a revelar talentos, especialmente na charge política e na caricatura.No carnaval de 2003, Ziraldo voltou a ser homenageado por uma escola de samba. A paulistana Nenê de Vila Matilde levou o enredo “É Melhor ler... O Mundo Colorido de um Maluco Genial” e conquistou o 4° lugar. Mais uma vez, Ziraldo subiu num enorme carro alegórico e desfilou emocionado.O marco dos 70 anos também foi oportunidade para a realização de um documentário sobre sua vida e obra, “Ziraldo, profissão cartunista”, exibido na TV Senac e realizado por Marisa Furtado.
No mesmo ano estreou a ópera “O Menino Maluquinho” no Theatro Central de Juiz de Fora. A ópera foi escrita pelo maestro Ernani Aguiar com libreto de Maria Gessy. Os papéis principais são cantados por dois meninos e uma menina acompanhados por um coro também de crianças.
Em 2004, Ziraldo ganhou, com o livro Flicts, o prêmio internacional Hans Christian Andersen. Sua arte faz parte do nosso cotidiano e pode ser identificada em logotipos famosos; ilustrações de livros e revistas; caixinhas de fósforos, que viraram itens de colecionador; cartazes da Feira da Providência (no Rio) e do Ministério da Educação; centenas de camisetas e símbolos de campanhas públicas ou privadas. Ziraldo está sempre envolvido em novos projetos.
Os trabalhos de Ziraldo já foram traduzidos para diversos idiomas, como inglês, espanhol, alemão, francês, italiano e basco, e representam o talento e o humor brasileiro no mundo. Ziraldo ilustrou o primeiro livro infantil brasileiro com versão integral on-line, em uma iniciativa pioneira. Recebeu, em vida, um prêmio de valor inestimável: viu todos os seus livros infantis se transformarem em peças de teatro pelas mãos de outros artistas.
Para Ziraldo, o livro é maior que o universo, "porque esse cabe inteirinho dentro de suas páginas".
Ziraldo talvez seja o único escritor do mundo a desfrutar a honra de ter um de seus títulos comparados à lua por ninguém menos que Neil Armstrong, o primeiro astronauta a pisar o respectivo satélite, que disse: The moon is Flicts. Polivalente, foi o primeiro a criar uma revista de história em quadrinhos brasileira, reunindo todos os bichos do folclore nacional, um pequeno índio e o Saci-Pererê.
As obras de Ziraldo mesclam palavras e imagens de forma harmônica e convida o leitor à reflexão sobre a realidade. Por vezes, o olhar é conduzido para simples partes do corpo como o umbigo Rolim e o joelho Juvenal que se tornaram personagens principais de estórias.
A proposta principal é que uma parte do corpo, por menor que seja, pode sozinha não parecer tão importante, mas no conjunto do funcionamento ela se torna fundamental. Com certeza, manifesta-se nessa perspectiva o posicionamento político e democrático que marca a obra desse escritor maluquinho.
Defensor de inúmeras causas e envolvido com as mais diversas atividades, a presença de Ziraldo na vida cultural do país tem sido das mais marcantes nas últimas décadas.
Ziraldo fala sobre sua carreira, política, jornalismo e muito mais.
O Menino Maluquinho e os outros livros que a obra originou são um marco na literatura para crianças. O que você leva em conta ao escrever para crianças? A que atribui o sucesso de seus livros infantis? Ziraldo - O que eu levo em conta é manter, na história, mesmo a mais difícil idéia que me ocorra. Não fazer qualquer concessão ao leitor a que o livro se destina. A não ser a da simplicidade da linguagem. Procuro não usar qualquer palavra que pressuponho não ser do universo do meu leitor. Às vezes, porém, me ocorre uma frase com uma palavra bonita, que lhe dá ritmo. Aí, avalio se vale a pena deixar o menino parar de ler pra perguntar ao pai ou à mãe o significado de tal palavra. Se estou certo de que nem o pai nem a mãe vão saber, aí, mesmo morrendo de amor pela palavra, eu a retiro da frase. Às vezes me parece tão interessante deixar a frase propiciar uma discussão na família, que trabalho em volta dela para que isto aconteça. Um texto limpinho, enxuto, bem fácil, poético e bonito para um livro destinado à criança dá muito trabalho! Acho impossível acabar de escrever um livro e dizer: "Pode publicar".
E o Menino Maluquinho? Nas palavras do autor, quem é esse menino e qual a mensagem que ele quer passar para seus leitores?Ziraldo - O Menino Maluquinho é um menino que teve, acima de tudo, amor na infância. Uma criança feliz tem tudo para ser um adulto feliz, acredito. E vi! O Menino Maluquinho, como diria o Millôr, nunca trabalhou nos Correios, por isso não foi criado para enviar mensagens...
Você vê a internet como um novo instrumento de comunicação com as crianças, como mais uma ferramenta para que o universo infantil seja contemplado com inteligência?Ziraldo - A gente, hoje, nem pode imaginar o tanto que a internet vai alterar nossas vidas, a vida de todo mundo, da família, dos pais, das crianças, todos. Imagina você que o McLuhan falou numa aldeia global como resultado das conquistas eletrônicas de seu tempo – uns trinta e poucos anos atrás. Pensa só na aldeia que está vindo aí! O "neighbour next door", nosso mais íntimo amigo, poderá estar morando na Ilha de Pascoal e continuará sendo nosso vizinho de porta. Vem aí a universal "neighbourhood". Escrevi em inglês porque esta vai ser, inexoravelmente, a língua oficial desta vizinhança. Daqui a pouco a internet vai ser visual, você não vai mais precisar ler. E aí, o mundo será dominado por aqueles que deterão este segredo: saber ler. E gostar de ler. O livro tem, pois, um papel fundamental no nosso futuro. Porque, assim como o progresso não fará com que o ser humano perca o prazer do sexo, o prazer de ouvir uma bela canção, o prazer de olhar um belo quadro, ele não vai perder o prazer de ler uma bela história ou um belo poema. Se acontecer isto, o homem vai ser uma outra espécie de animal.
O que considera ser sua grande responsabilidade social como escritor?Ziraldo - A responsabilidade do cidadão existe como ser humano, e não especificamente como escritor. Responsabilidade inerente a todo e qualquer ser humano, né! Agora, por temperamento e por formação, andei carregando bandeiras, sem parar: contra a ditadura militar, contra o Fernando Henrique, contra o Bush, contra a globalização, contra a corrupção, o desmatamento, a poluição das águas e por aí vai. Quando virei autor de literatura infantil, descobri o que eu já sabia: artista, em um país como o Brasil, acaba fazendo de seu trabalho uma forma de missão. Sem manto e sem cajado, claro! Escrever livros num país sem leitores? Temos que tentar mudar isto. Acho que um dos caminhos para um país melhor é fazer dele um país de leitores.
O que faria se fosse o Ministro da Leitura no Brasil?Ziraldo - Dois dos males históricos do Brasil são a falta de seriedade e o imediatismo. Mas aqui e ali, porém, se vêem tentativas de melhorar o desempenho de um ou outro setor da vida brasileira. Na educação, honestamente, temos que louvar alguns esforços das autoridades brasileiras no momento e nos últimos anos. Tem muita gente séria fazendo das tripas coração pra levar um pouco de seriedade ao setor. E, aos poucos, vamos avançando. Heroicamente. Mas é uma tristeza imaginar que, para que a educação seja a prioridade básica deste país, a gente precise de heróis. Nunca tive a pretensão de ser ministro, mas falando hipoteticamente, acho que a escola não pode transformar ler em dever, em obrigação. Ler é básico. O importante é motivar a criança para a leitura, para a aventura que é ler. Acho que o importante é dar condições a nossas crianças de lerem mais, de gostar de ler. Ler é mais importante do que estudar, eu vivo repetindo.
Você lançou a primeira revista em quadrinhos brasileira de um só autor. Como conseguiu publicá-la na época?Ziraldo - Em torno dos anos 60, havia a expectativa da nacionalização da história em quadrinhos. Nosso editor na revista O Cruzeiro, para se precaver, resolveu publicar histórias em quadrinhos nacionais. E convidou o Péricles, o Carlos Estevão e a mim. Péricles, muito complicado, morreu pouco depois. Carlos Estevão fez o Dr. Macarra, um personagem carioca sensacional. Eu fiz o Pererê, a primeira revista em quadrinhos nacional de um autor só e em cores. Durou cinco anos e foi uma das coisas mais importantes da minha vida. Nesse tempo, cinco anos, a revistinha vendeu muito: 150 mil exemplares mensais, na época uma tiragem absurda. Em 64, a revista parou e fui trabalhar em publicidade.
De que forma descobriu a vocação pelo desenho?
Ziraldo - A mais antiga lembrança de minha infância sou eu desenhando. Antes de entender as palavras, minha cabeça já transava imagens. Acho que nasci desenhando. Não sei se naquele tempo já imaginava ser o que sou hoje. Acho que o que eu queria da vida era isso mesmo. Tinha ainda os livrinhos que minha mãe fazia para mim. Acho que foram os primeiros livros que ilustrei na minha vida. Minha mãe dobrava, costurava e fazia para mim uns livrinhos de papel manilha para eu ilustrar minhas historinhas.
O Pasquim foi seu maior empreendimento?
Ziraldo - Fazer O Pasquim, para mim, não foi um empreendimento meu, pelo amor de Deus. Foi de um bando de gente, começando pelo Jaguar e pelo Tarso de Castro. Não posso imaginar de que maneira eu poderia ter atravessado os anos de ditadura sem poder manifestar minha indignação. E de maneira tão efetiva. Foi uma sorte ter vivido nas páginas do Pasquim os anos de chumbo da ditadura militar brasileira. É bom saber disso, é bom contar para os meus netos que eu não fiquei assistindo de braços cruzados o triste espetáculo do desastre que foi este tempo para o Brasil e para o nosso futuro como nação. Epa! Tou fazendo um discurso. Menos, Ziraldo, menos...
Como foi peitar a ditadura?
Ziraldo - O Pasquim nasceu no berço do Jaguar. Mas eu antes tinha feito o Cartum JS, suplemento dominical criado para o Jornal dos Sports, responsável pelo lançamento de uma nova geração de cartunistas, entre eles Miguel Paiva, Al, Juarez Machado, Henfil, Vagn. Como foi o Manequinho, suplemento de humor que o Fortuna fez para o Correio da Manhã. Como o Pif-Paf, do Millôr. Eram jornais de humor, e você sabe que se passar duas gargalhadas em volta de um tirano, você pode começar a derrubá-lo, como já diziam em Roma. O Pasquim foi um jornal que reuniu todo o pensamento não-conformista, indignado, reflexivo e sério da época. Um jornal que usava todo o pensamento vivo brasileiro que existia naquele tempo – e pleno de Humor.
Como faziam para burlar a censura?
Ziraldo - Atrito com a censura, que era um braço do regime militar, dos golpistas, tinha toda hora. Nós usávamos da imaginação para enganar os milicos. No livro do Bernardo Kucinski, “Jornalistas e Revolucionários”, há mais explicação sobre isso, mas de qualquer modo, para ilustrar melhor a resposta, vou complementar para vocês: foi a mais rude censura jamais imposta à Imprensa Brasileira. Uma censura que era exercida por policiais no interior das redações, em misteriosos departamentos, ou seja, lá o que for, onde não podíamos ter acesso aos censores, na Polícia Federal, no Rio, ou no Ministério da Justiça, em Brasília. Era para lá que ia, de avião, nossos originais, que nos voltavam destruídos. Coisas do gênero...
Por que projetos como Bundas e O Pasquim 21 não foram adiante?
Ziraldo - Infelizmente, os anunciantes não entenderam que a revista e o jornal falavam para as pessoas mais inteligentes deste país, para os formadores de opinião, para as pessoas que não querem comprar-feito, mas querem criar, decidir, escolher, repensar, refletir.
Cinara Dreide - Jornalista
Sites: http://www.ziraldo.com.br/
E o Menino Maluquinho? Nas palavras do autor, quem é esse menino e qual a mensagem que ele quer passar para seus leitores?Ziraldo - O Menino Maluquinho é um menino que teve, acima de tudo, amor na infância. Uma criança feliz tem tudo para ser um adulto feliz, acredito. E vi! O Menino Maluquinho, como diria o Millôr, nunca trabalhou nos Correios, por isso não foi criado para enviar mensagens...
Você vê a internet como um novo instrumento de comunicação com as crianças, como mais uma ferramenta para que o universo infantil seja contemplado com inteligência?Ziraldo - A gente, hoje, nem pode imaginar o tanto que a internet vai alterar nossas vidas, a vida de todo mundo, da família, dos pais, das crianças, todos. Imagina você que o McLuhan falou numa aldeia global como resultado das conquistas eletrônicas de seu tempo – uns trinta e poucos anos atrás. Pensa só na aldeia que está vindo aí! O "neighbour next door", nosso mais íntimo amigo, poderá estar morando na Ilha de Pascoal e continuará sendo nosso vizinho de porta. Vem aí a universal "neighbourhood". Escrevi em inglês porque esta vai ser, inexoravelmente, a língua oficial desta vizinhança. Daqui a pouco a internet vai ser visual, você não vai mais precisar ler. E aí, o mundo será dominado por aqueles que deterão este segredo: saber ler. E gostar de ler. O livro tem, pois, um papel fundamental no nosso futuro. Porque, assim como o progresso não fará com que o ser humano perca o prazer do sexo, o prazer de ouvir uma bela canção, o prazer de olhar um belo quadro, ele não vai perder o prazer de ler uma bela história ou um belo poema. Se acontecer isto, o homem vai ser uma outra espécie de animal.
O que considera ser sua grande responsabilidade social como escritor?Ziraldo - A responsabilidade do cidadão existe como ser humano, e não especificamente como escritor. Responsabilidade inerente a todo e qualquer ser humano, né! Agora, por temperamento e por formação, andei carregando bandeiras, sem parar: contra a ditadura militar, contra o Fernando Henrique, contra o Bush, contra a globalização, contra a corrupção, o desmatamento, a poluição das águas e por aí vai. Quando virei autor de literatura infantil, descobri o que eu já sabia: artista, em um país como o Brasil, acaba fazendo de seu trabalho uma forma de missão. Sem manto e sem cajado, claro! Escrever livros num país sem leitores? Temos que tentar mudar isto. Acho que um dos caminhos para um país melhor é fazer dele um país de leitores.
O que faria se fosse o Ministro da Leitura no Brasil?Ziraldo - Dois dos males históricos do Brasil são a falta de seriedade e o imediatismo. Mas aqui e ali, porém, se vêem tentativas de melhorar o desempenho de um ou outro setor da vida brasileira. Na educação, honestamente, temos que louvar alguns esforços das autoridades brasileiras no momento e nos últimos anos. Tem muita gente séria fazendo das tripas coração pra levar um pouco de seriedade ao setor. E, aos poucos, vamos avançando. Heroicamente. Mas é uma tristeza imaginar que, para que a educação seja a prioridade básica deste país, a gente precise de heróis. Nunca tive a pretensão de ser ministro, mas falando hipoteticamente, acho que a escola não pode transformar ler em dever, em obrigação. Ler é básico. O importante é motivar a criança para a leitura, para a aventura que é ler. Acho que o importante é dar condições a nossas crianças de lerem mais, de gostar de ler. Ler é mais importante do que estudar, eu vivo repetindo.
Você lançou a primeira revista em quadrinhos brasileira de um só autor. Como conseguiu publicá-la na época?Ziraldo - Em torno dos anos 60, havia a expectativa da nacionalização da história em quadrinhos. Nosso editor na revista O Cruzeiro, para se precaver, resolveu publicar histórias em quadrinhos nacionais. E convidou o Péricles, o Carlos Estevão e a mim. Péricles, muito complicado, morreu pouco depois. Carlos Estevão fez o Dr. Macarra, um personagem carioca sensacional. Eu fiz o Pererê, a primeira revista em quadrinhos nacional de um autor só e em cores. Durou cinco anos e foi uma das coisas mais importantes da minha vida. Nesse tempo, cinco anos, a revistinha vendeu muito: 150 mil exemplares mensais, na época uma tiragem absurda. Em 64, a revista parou e fui trabalhar em publicidade.
De que forma descobriu a vocação pelo desenho?
Ziraldo - A mais antiga lembrança de minha infância sou eu desenhando. Antes de entender as palavras, minha cabeça já transava imagens. Acho que nasci desenhando. Não sei se naquele tempo já imaginava ser o que sou hoje. Acho que o que eu queria da vida era isso mesmo. Tinha ainda os livrinhos que minha mãe fazia para mim. Acho que foram os primeiros livros que ilustrei na minha vida. Minha mãe dobrava, costurava e fazia para mim uns livrinhos de papel manilha para eu ilustrar minhas historinhas.
O Pasquim foi seu maior empreendimento?
Ziraldo - Fazer O Pasquim, para mim, não foi um empreendimento meu, pelo amor de Deus. Foi de um bando de gente, começando pelo Jaguar e pelo Tarso de Castro. Não posso imaginar de que maneira eu poderia ter atravessado os anos de ditadura sem poder manifestar minha indignação. E de maneira tão efetiva. Foi uma sorte ter vivido nas páginas do Pasquim os anos de chumbo da ditadura militar brasileira. É bom saber disso, é bom contar para os meus netos que eu não fiquei assistindo de braços cruzados o triste espetáculo do desastre que foi este tempo para o Brasil e para o nosso futuro como nação. Epa! Tou fazendo um discurso. Menos, Ziraldo, menos...
Como foi peitar a ditadura?
Ziraldo - O Pasquim nasceu no berço do Jaguar. Mas eu antes tinha feito o Cartum JS, suplemento dominical criado para o Jornal dos Sports, responsável pelo lançamento de uma nova geração de cartunistas, entre eles Miguel Paiva, Al, Juarez Machado, Henfil, Vagn. Como foi o Manequinho, suplemento de humor que o Fortuna fez para o Correio da Manhã. Como o Pif-Paf, do Millôr. Eram jornais de humor, e você sabe que se passar duas gargalhadas em volta de um tirano, você pode começar a derrubá-lo, como já diziam em Roma. O Pasquim foi um jornal que reuniu todo o pensamento não-conformista, indignado, reflexivo e sério da época. Um jornal que usava todo o pensamento vivo brasileiro que existia naquele tempo – e pleno de Humor.
Como faziam para burlar a censura?
Ziraldo - Atrito com a censura, que era um braço do regime militar, dos golpistas, tinha toda hora. Nós usávamos da imaginação para enganar os milicos. No livro do Bernardo Kucinski, “Jornalistas e Revolucionários”, há mais explicação sobre isso, mas de qualquer modo, para ilustrar melhor a resposta, vou complementar para vocês: foi a mais rude censura jamais imposta à Imprensa Brasileira. Uma censura que era exercida por policiais no interior das redações, em misteriosos departamentos, ou seja, lá o que for, onde não podíamos ter acesso aos censores, na Polícia Federal, no Rio, ou no Ministério da Justiça, em Brasília. Era para lá que ia, de avião, nossos originais, que nos voltavam destruídos. Coisas do gênero...
Por que projetos como Bundas e O Pasquim 21 não foram adiante?
Ziraldo - Infelizmente, os anunciantes não entenderam que a revista e o jornal falavam para as pessoas mais inteligentes deste país, para os formadores de opinião, para as pessoas que não querem comprar-feito, mas querem criar, decidir, escolher, repensar, refletir.
Cinara Dreide - Jornalista
Sites: http://www.ziraldo.com.br/