Friday, March 16, 2007

Conceitos de Humor 2 - O Cartoon

Por: Osvaldo Macedo de Sousa

Este é o termo mais polémico e ambíguo no mundo actual dos conceitos do humor gráfico. Não só porque tem significados diferentes de país para país, mas porque abarca diferentes géneros de criação plástica.
A origem do termo – cartoon – cujo significado se mantêm e se usa, provem do mundo técnico. As Artes Decorativas normalmente dividiam-se em criadores e artífices, ou seja o autor criava a obra, o croqui, o cartão, e o técnico transpunha-o para a obra final. Assim acontece (ia) no mural, no fresco, no azulejo, na cerâmica, na tecelagem, na tapeçaria, na ourivesaria, na gravura, na tipografia...
No âmbito da origem da imprensa, seja com a gravura, com a caricatura e até com a fotografia... os criadores tinham que entregar o projecto-obra aos artífices para que o trabalho pudesse surgir impresso no papel. No mundo do desenho de humor/caricatura usou-se primeiro a xilogravura (madeira), depois a litografia (pedra calcária) em que existiam técnicos intermediários. Depois essa transposição passou-se a fazer de forma mecânica com a zincogravura, a fotogravura, offset...
Isto tudo para dizer que para a impressão, primeiro há um desenho original em papel, um cartão, um "cartoon".
A primeira vez que o termo "cartoon" foi usado oficialmente no âmbito do humor, foi em Julho de 1843 pelo jornal britânico "Punch". O Governo Inglês resolveu fazer uma exposição de desenhos (cartoons) nas salas do Parlamento, com toda a pompa e circunstância, num período de grande crise económica, e o caricaturista John Leech resolveu satirizar esse desperdício de dinheiro com um desenho cuja legenda era "The poor ask for bread and the philanthrophy of the State accords an axhibition", e que o "Punch" publica sob a designação de "Cartoon nº 1".
Apesar de se manter a designação de caricatura, esta primeira abordagem ficou no subconsciente dos humoristas, que foi posteriormente aproveitada pelos americanos como forma de se distinguirem linguisticamente da mãe pátria, introduzindo-o na linguagem comum. Esse novo termo, sendo então dominante nos Estados Unidos foi-se alastrando no âmbito anglo-saxónico, mas com a IIª Guerra Mundial, e a imposição universal do americano como o novo império dominante, e globalizante, esse termo foi-se impondo noutras línguas, e noutras culturas normalmente distantes da sua influencia.
O problema é que a palavra "cartoon" foi sempre usada para o desenho, mantendo-se para os "croquis" de qualquer trabalho gráfico, ou seja para a caricatura, ou para a narrativa gráfica, quando ela se anima, e ganha vida própria em cinema de animação. Cartoon é também desenho animado, usando-se por vezes o diminutivo – Toons.
Assim se desenvolve a confusão, a ambiguidade quando se houve falar em cartoons, nunca se sabe a que género se refere, mas como também é desenho de imprensa, é esse que nos interessa.
Cartoon veio substituir o termo Caricatura, não criar um género específico. A Caricatura é que ficou reduzido a um género específico de retrato exagerado-humoristico, dentro da alçada do cartoon. Depois existem os Gags, que são momentos de humor inócuo, que podem ser em comédia ou desenho, sendo neste caso Gags de cartoon. Para especificar o que era entendido como Sátira Politica, criaram o conceito de Cartoon Editorial, ou seja aquele que é feito sob pressão do momento, uma crítica datável, que tem o risco de ser incompreendida se for publicada antes, e desactualizada se for publicada muito depois dos factos se terem dado. Para estes trabalhos, aquando de exposições posteriores é conveniente ter sempre uma explicação histórica do momento. Como deve ser uma espécie de raio fulminante, de leitura e compreensão imediata, o cartoonista usa normalmente alegorias, paródias, estereótipos, caricaturas... para maior facilidade de entendimento.
Alguns estudiosos defendem que a alteração terminológica de caricatura satírica, ou sátira politica para Cartoon Editorial coincide também com uma alteração no conceito da politica, e da crítica humorística, ou seja os políticos deixaram de ser figuras individuais dentro de uma governação, para serem representativos da governação, do partido porque foram eleitos, das directrizes conjunturais. Antes havia o indivíduo/Carácter/poder, enquanto que o cartoon editorial comenta o Homem/colectivo/poder.
Existem também o Cartoon Ilustração (que acompanham textos, publicidade...), o Strip-cartoon... Com o Strip Cartoon, ou Comic-strip, a dita tira-cómica que também pode ser encarada como cartoon, nascem mais umas séries de ambiguidades, que são o ganha pão destes construtores de conceitos e definições, mas isso será outra divagação.

P.S. : Todos estes conceitos e definições são altamente discutíveis, já que variam de país para país. Por exemplo no caso do Brasil ouve um aportuguesamento do termo em Cartum, mas seu significado é bem diferente já que significa um desenho-de-humor, "quando a preocupação do artista for mais ligada à qualidade do desenho do que ao seu poder de riso" (Ziraldo).
Por essa razão, quando fui convidado a fazer esta série de artigos para a Quevedos, desenvolvemos com a Universidade de Alcalá o projecto de auscultar diferentes artistas e historiadores dos países iberoamericanos sobre estes diferentes conceitos, definições segundo a interpretação de cada país. Curiosamente, apenas dois investigadores me responderam até agora ao inquérito. Talvez porque achem que não vale a pena, estas dissertações inteletualoides, numa arte de irreverentes.

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