Wednesday, November 15, 2006
Caricaturas Crónicas 16
OS SANTOS POPULARES
Por: Osvaldo Macedo de Sousa
«Estalam bombas e foguetes /
andam balões no ar, /
E o Manuel e a Maria /
à «rasquinha»... sem jantar.»
à «rasquinha»... sem jantar.»
(in «A Bomba», 25{6/ /1946)
São tempos de folguedos, manjericos e amores, é o solstício no calor da esperança, como falsa ilusão do amadurecimento do ano, da vida.
O seu símbolo é a «cascata», a vida como reconstrução da realidade em bonecos rústicos, em bonecos de pés de barro, como o são os santos, políticos, que se instalam no topo, enquanto o eterno Zé, por tradição ou burrice, mantem-se a seus pés, pedindo cinco tostões (de empréstimo) para o Santo... deficit.
De deficit não consta a Hagiologia, mas dos Santos Populares são três os festejados: um especialista em amores e milagres; outro que tanto pode aparecer como o «cordeiro sacrificado dos políticos», como as eleições, sem batatas; finalizando com o «primeiro-ministro», que abre as portas do «céu», apenas aos seus amigos.
O dos amores é o Santo António: «Gosto muito de cravos / por serem lindas flores / vejam todos como é lindo / este que cheira a amores.»
«Desculpa ser este cravo / tão mesquinho em valor / se ele é de papel de seda / é de veludo o meu amor»
«São como as luzes da Avenida / os teus olhos Luísa amada / quem teima em os fitar / depois não vê mais nada.» (Julião Machado, in «Comédia Portuguesa», 15/6/1889).
Falsos cravos de seda ou papel, em manjericos aperaltados, que entram na igreja solteiros, e saem de lá casados. Santo casamenteiro, ele é de Lisboa, mas disputado por outras nações, porque de milagres todos são necessitados: é um santo que fala aos peixes (óptimo mercado de votos); não deixa que se partam as bilhas (do orçamento); e é popular - três características ambicionadas por todos os políticos.
A «cascata» é o retrato da vida, íngreme encosta que temos de subir, e em que os saltos sobre as fogueiras (do selo, profissionais, complementar, predial...) são o «eterno S. João do Zé-povinho» (J. M. Pinto, in «A Algazarra», 26/6/1899).
Saltar a fogueira é a tradição Joanina: «Na noite de S. João / Ao querer saltar a fogueira / Apanhei um encontrão / E roubaram-me a carteira.» (in «A Bomba", 25/8/1946)
Uma tradição com porros e alcachofras, e muitos percalços, porque se uns são mais ligeiros e afoitos de dedos, outros são mais pesados, de consciência: «O Governo, para festejar o seu S. João, acendeu a fogueira das economias (acumulações, interesses pessoais, gratificações...). E enquanto um dos festeiros salta por cima das terríveis e ferozes labaredas (das indignações e imprecações), os outros transidos de medo, esperam que o fogo abrande, para ver se podem saltar, sem chamuscar os fundilhos...» (Manuel Gustavo B.P., in «Ant. Maria» 27/6/1891).
«À porta do céu colocado, tem ele o direito de dar entrada, ou negá-la, a todos os que pretendem um lugar no céu. E enquanto dá a mão a um «crente», repele um «protestante», dando-lhe com as chaves no toutiço. Donde se prova que, embora seja S. Pedro, não é careca. Não, senhores, tem muito cabelinho... na venta!» (M. Pinto, in «Charivari», 29/6/1895).
S. Pedro, o santo das chaves, é que fecha as festas, mas seja a 13, 24 ou 29, são tudo noites para esquecer as mágoas, e cantar as marchas: «Ó meu S. (António, Pedro) João Baptista / Protegei esta cidade / Dai cabo dos Jesuítas, / Das manas da caridade.»
«CORO: Orvalhadas, orvalhadas, orvalheiras / Viva o rancho das moças solteiras.»
«Ó meu Santo / Atendei nossos desejos / Livrai-nos do peixe-espada, / Dai cabo dos percevejos.»
«CORO: Orvalhadas, orvaIheiras, orvalhadas / Viva o rancho das mulheres casadas.» (Nogueira, in «Os Pontos», 23/6/1901).