Saturday, June 20, 2009
Historia da Caricatura de Imprensa em Portugal - 1900 (Raphael Bordallo Pinheiro...)
Por: Osvaldo Macedo de Sousa
A 17 de Janeiro de 1900 nasce «A Paródia»- «Os portuguezes são essencialmente conservadores. Por muito que esta opinião possa surprehender o nosso colega Magalhães Lima, não é menos certo que se nós mudamos com frequência de fato, nós recusamos obstinadamente a mudar de idéas, o que faz com que em Portugal a fortuna sorria mais aos alfayates como o sr. Amieiro do que aos evangelistas como o sr. Theophilo Braga.»
«Se somos inquestionavelmente um paiz de janotas, estamos longe de ser um paiz de reformadores. Assim, o nosso primeiro embaraço ao emprehender esta publicação é familiarisar o publico com a idéa de que já não se chama o António Maria o jornal que tem agora na mão, porque o publico conservador e rotineiro, quereria ver perpetuado no tempo e na galhofa, aquelle titulo que ficou pertencendo a uma epocha que desappareceu e que por isso fez o seu tempo.»
« Porquê ? - o que era o António Maria ? O António Maria, meus senhores, foi a Regeneração, o Fontes e a sua Água Circassiana, o Ávila e o seu cache-nez, o Sampaio e os seus pamphletos, o Arrobas e os seus editaes, o Passeio Publico e o lyrismo do sr. Florencio Ferreira, a sr.a Emilia das Neves, a «Judia» e os Recreios Whitoyne, mundo fIndo, mundo morto, de sombras, espectros, múmias, onde só poderíamos estar à vontade sob a condição de termos desapparecido com elle, o que não é evidentemente um facto. Ficarmos dentro do António Maria seria ficar dentro de um museu, na situação de um velho guarda mostrando à curiosidade do seu tempo os despojos de uma epocha passada. A Parodia é outra coisa, como o tempo é outro. O António Maria foi um homem. Quando muito, foi uma família. A Parodia -- dizemo-lo sem receio de ser immodestos - somos nós todos. A Parodia é a caricatura ao serviço da tristeza publica. É a Dança da Bica no cemitério dos Prazeres.»
Na realidade surgia um novo jornal. com outro espírito mais adequado à época na questão gráfica, e se Raphael estava velho e doente (tão bem simbolizado no desenho onde o Raphael de 1870 saúda o de 1900), não o impedirá de fazer um leque de obras primas. como que testamento de uma época, como propostas para uma nova era. Começa logo com a grande criação, que será uma série zoomórfica. ou seja surge no nº 1 "A Grande Porca - a Política", seguindo-se depois "O Grande Cão - as Finanças"; “A Galinha Choca - a Economia"; "O Grande Papagaio - a retórica parlamentar"; "A Grande Toupeira - a reacção...
Uma das diferenças é que a cor será uma constante. Por outro lado. se nos jornais anteriores poucas foram as colaborações exteriores (salvo fugazes aparições de Julião Machado, Celso Hermínio, Jorge Cid), neste serão uma constante, ou seja veremos obras assinadas não só por Raphael, Manuel Gustavo como Celso Hermínio, Jorge Cid, Manuel Monterroso, Vale e Sousa, Alonso ... Durará até 1907, mas com diferentes séries: lª Série de 17/1/900 a 31/12/02; na 2ª Série é uma fusão com a Comédia Portuguesa, vivendo de 11/1/03 a 10/2/05 (terminando com a morte de Raphael seu director); a 3a série de 23/2/05 a 1/6/07, sendo Manuel Gustavo o Director, com colaborações de Alfredo Cândido, Saavedra Machado, João Valério, Manuel Monterroso ..
Um elemento que parece esquecido nesta história, mas que foi uma opção, é a falta de referências aos colaboradores literários dos jornais humorísticos. É que esse, é um outro mundo, que necessita de um estudo paralelo, uma abordagem muito mais ampla com ramificações na própria História da Literatura nacional, na História do Jornalismo. Seria difícil, se não impossível, integra-los nesta História do grafismo humorístico, mais não seja pela falta de tempo, pela urgência de se editar esta obra. De todas as formas será interessante dar uma olhadela por alto.
O que se destaca neste sector humorístico, é que nos jornais de Raphael essa colaboração foi entregue a personalidades importantes da vida literária e cultural do país de então, como acontece com Guerra Junqueiro e Guilherme d' Azevedo logo em “A Lanterna Mágica". Em relação a este último quase que poderemos afirmar que é o Raphael da sátira literária de oitocentos, sem desprimor para Ramalho Ortigão e suas farpas. Este incluirá a lista de colaboradores logo no segundo jornal de Raphael, "O António Maria", assim como depois surgirá Alfredo de Morais Pinto (que assina Pan-Tarantula), e nos "Pontos nos ii" Fialho de Almeida (Irkan), Eduardo Fernandes (Esculápio), Eugénio de Castro (Eu), enquanto que em «A Paródia» surge João Chagas, que já tinha dirigido «A Marselheza»... Pan-Tarantula deixará o jornal de Raphael para dirigir "O Pimpão". Marcelino Mesquita dirigirá «A Comédia Portuguesa", com Fialho de Almeida. Esculápio também escreverá em A Chacota", "Os Ridículos". José Maria da Cruz Moreira (o Caracoles) será durante bastante tempo o responsável literário de "Os Ridículos". No norte destaca-se Sá de Albergaria, que apesar de não ser hoje famoso como criador literário, foi responsável por belas páginas em "O Sorvete", "Maria Rita", "Os Pontos" ... Assim como há toda uma plêiade de jornalistas que deram o seu contributo para estes jornais, e para a história do humor literário português, como, por exemplo, Guedes d' Oliveira ...
Outro facto a reflectir, será a evolução do humor na imprensa. A caricatura surge como complemento da imprensa noticiosa, para se impor como suplemento gráfico e literário de jornais noticiosos, ao mesmo tempo que a técnica gráfica se desenvolve em jornais de recreio e informação. Depois a sátira cria os seus próprios jornais, em que o Director Artístico assume muitas das vezes a própria propriedade do jornal. Esta evolução infelizmente nem sempre correspondeu a uma alteração qualitativa do trabalho gráfico, ou seja, muitas das vezes continuou a ser o curioso da litografia a aproveitar esta técnica para enviar os suas farpas políticas e sociais. Mas também se regista uma lenta, mas progressiva aproximação de artistas plásticos a este género, seja como início de carreira, seja como hobby plástico a uma outra profissão, seja como carreira gráfico-jornalística profissional. Com o passar dos tempos, o "proletariado" satírico foi engrossando, e neste começo de século vamos encontrar jornais com múltiplas colaborações.
A irregularidade na qualidade estética mantém-se. Contudo, o raphaelismo já tinha conseguido criar uma escola académica, onde os menos aptos esteticamente tinham um modelo, uma bitola a seguirem. Dessa forma se consegue um salto positivo na qualidade geral, por onde se destaca um ou outro nome. E quando se destacam, não é apenas na estrutura gráfica, mas no âmbito geral das artes portuguesas. Infelizmente não é possível criar bitolas - modelo para o humor, porque esse não tem escola, depende do poder interior de cada um.
As idas de Raphael e seu filho ao estrangeiro, a chegada de revistas estrangeiras sempre ajudou a manter-nos informados do que se passava no resto da Europa, e naturalmente influenciou as diversas gerações de gráficos. Nesta viragem de século é notória essa influência, e muitas das páginas humorísticas de então poderiam incluir qualquer antologia do grafismo Arte Nova que se desenvolvia entretanto na Europa.
Como já referi, descobrimos também os primeiros sintomas estéticos da revolução que as artes estavam a desenvolver nos outros campos, nomeadamente o pré-expressionismo, ou a pré-síntese modernista. Falamos nas obras de Celso, e de Leal da Câmara quando ele cá estava, mas muito importantes são as obras que ele vai enviando de Paris, onde a cor, a plasticidade da massa pictórica são dominantes. Houve tentativas falhadas de o copiarem. Curiosamente, a revolução modernista surgirá mais sob a influência de Celso Hermínio, não tanto pela textura plástico-pictórica, mas pela síntese, pela caligrafia do traço.
Devemos também registar que nesta passagem de século, um pequeno grupo de títulos jornalísticos, de âmbito noticioso nacional, já estão impostos como o Diário de Notícias, Comércio do Porto, Século, Primeiro de Janeiro. Neles vamos encontramos uma aproximação dos géneros, seja como suplementos dominicais, seja como enriquecimento gráfico das suas páginas. A sátira política e social reencontram o seu papel, na dita imprensa séria.
Por outro lado acompanhará a evolução técnica da gravura, isto é, no início andará entre a gravura em madeira e a litografia, e no final do século já está a ser executada em zincogravura.
Em 1900, início do novo século, para além de “A Paródia" surgem novos jornais como "O Chinelo" (onde se vai destacar Francisco Valença) e "Passatempo". "O Mundo" (que viverá até 1936) não sendo um jornal satírico, incluirá ilustrações de Alberto Sousa, Leal da Câmara, Luís Filipe, Francisco Valença...
A 17 de Janeiro de 1900 nasce «A Paródia»- «Os portuguezes são essencialmente conservadores. Por muito que esta opinião possa surprehender o nosso colega Magalhães Lima, não é menos certo que se nós mudamos com frequência de fato, nós recusamos obstinadamente a mudar de idéas, o que faz com que em Portugal a fortuna sorria mais aos alfayates como o sr. Amieiro do que aos evangelistas como o sr. Theophilo Braga.»
«Se somos inquestionavelmente um paiz de janotas, estamos longe de ser um paiz de reformadores. Assim, o nosso primeiro embaraço ao emprehender esta publicação é familiarisar o publico com a idéa de que já não se chama o António Maria o jornal que tem agora na mão, porque o publico conservador e rotineiro, quereria ver perpetuado no tempo e na galhofa, aquelle titulo que ficou pertencendo a uma epocha que desappareceu e que por isso fez o seu tempo.»
« Porquê ? - o que era o António Maria ? O António Maria, meus senhores, foi a Regeneração, o Fontes e a sua Água Circassiana, o Ávila e o seu cache-nez, o Sampaio e os seus pamphletos, o Arrobas e os seus editaes, o Passeio Publico e o lyrismo do sr. Florencio Ferreira, a sr.a Emilia das Neves, a «Judia» e os Recreios Whitoyne, mundo fIndo, mundo morto, de sombras, espectros, múmias, onde só poderíamos estar à vontade sob a condição de termos desapparecido com elle, o que não é evidentemente um facto. Ficarmos dentro do António Maria seria ficar dentro de um museu, na situação de um velho guarda mostrando à curiosidade do seu tempo os despojos de uma epocha passada. A Parodia é outra coisa, como o tempo é outro. O António Maria foi um homem. Quando muito, foi uma família. A Parodia -- dizemo-lo sem receio de ser immodestos - somos nós todos. A Parodia é a caricatura ao serviço da tristeza publica. É a Dança da Bica no cemitério dos Prazeres.»
Na realidade surgia um novo jornal. com outro espírito mais adequado à época na questão gráfica, e se Raphael estava velho e doente (tão bem simbolizado no desenho onde o Raphael de 1870 saúda o de 1900), não o impedirá de fazer um leque de obras primas. como que testamento de uma época, como propostas para uma nova era. Começa logo com a grande criação, que será uma série zoomórfica. ou seja surge no nº 1 "A Grande Porca - a Política", seguindo-se depois "O Grande Cão - as Finanças"; “A Galinha Choca - a Economia"; "O Grande Papagaio - a retórica parlamentar"; "A Grande Toupeira - a reacção...
Uma das diferenças é que a cor será uma constante. Por outro lado. se nos jornais anteriores poucas foram as colaborações exteriores (salvo fugazes aparições de Julião Machado, Celso Hermínio, Jorge Cid), neste serão uma constante, ou seja veremos obras assinadas não só por Raphael, Manuel Gustavo como Celso Hermínio, Jorge Cid, Manuel Monterroso, Vale e Sousa, Alonso ... Durará até 1907, mas com diferentes séries: lª Série de 17/1/900 a 31/12/02; na 2ª Série é uma fusão com a Comédia Portuguesa, vivendo de 11/1/03 a 10/2/05 (terminando com a morte de Raphael seu director); a 3a série de 23/2/05 a 1/6/07, sendo Manuel Gustavo o Director, com colaborações de Alfredo Cândido, Saavedra Machado, João Valério, Manuel Monterroso ..
Um elemento que parece esquecido nesta história, mas que foi uma opção, é a falta de referências aos colaboradores literários dos jornais humorísticos. É que esse, é um outro mundo, que necessita de um estudo paralelo, uma abordagem muito mais ampla com ramificações na própria História da Literatura nacional, na História do Jornalismo. Seria difícil, se não impossível, integra-los nesta História do grafismo humorístico, mais não seja pela falta de tempo, pela urgência de se editar esta obra. De todas as formas será interessante dar uma olhadela por alto.
O que se destaca neste sector humorístico, é que nos jornais de Raphael essa colaboração foi entregue a personalidades importantes da vida literária e cultural do país de então, como acontece com Guerra Junqueiro e Guilherme d' Azevedo logo em “A Lanterna Mágica". Em relação a este último quase que poderemos afirmar que é o Raphael da sátira literária de oitocentos, sem desprimor para Ramalho Ortigão e suas farpas. Este incluirá a lista de colaboradores logo no segundo jornal de Raphael, "O António Maria", assim como depois surgirá Alfredo de Morais Pinto (que assina Pan-Tarantula), e nos "Pontos nos ii" Fialho de Almeida (Irkan), Eduardo Fernandes (Esculápio), Eugénio de Castro (Eu), enquanto que em «A Paródia» surge João Chagas, que já tinha dirigido «A Marselheza»... Pan-Tarantula deixará o jornal de Raphael para dirigir "O Pimpão". Marcelino Mesquita dirigirá «A Comédia Portuguesa", com Fialho de Almeida. Esculápio também escreverá em A Chacota", "Os Ridículos". José Maria da Cruz Moreira (o Caracoles) será durante bastante tempo o responsável literário de "Os Ridículos". No norte destaca-se Sá de Albergaria, que apesar de não ser hoje famoso como criador literário, foi responsável por belas páginas em "O Sorvete", "Maria Rita", "Os Pontos" ... Assim como há toda uma plêiade de jornalistas que deram o seu contributo para estes jornais, e para a história do humor literário português, como, por exemplo, Guedes d' Oliveira ...
Outro facto a reflectir, será a evolução do humor na imprensa. A caricatura surge como complemento da imprensa noticiosa, para se impor como suplemento gráfico e literário de jornais noticiosos, ao mesmo tempo que a técnica gráfica se desenvolve em jornais de recreio e informação. Depois a sátira cria os seus próprios jornais, em que o Director Artístico assume muitas das vezes a própria propriedade do jornal. Esta evolução infelizmente nem sempre correspondeu a uma alteração qualitativa do trabalho gráfico, ou seja, muitas das vezes continuou a ser o curioso da litografia a aproveitar esta técnica para enviar os suas farpas políticas e sociais. Mas também se regista uma lenta, mas progressiva aproximação de artistas plásticos a este género, seja como início de carreira, seja como hobby plástico a uma outra profissão, seja como carreira gráfico-jornalística profissional. Com o passar dos tempos, o "proletariado" satírico foi engrossando, e neste começo de século vamos encontrar jornais com múltiplas colaborações.
A irregularidade na qualidade estética mantém-se. Contudo, o raphaelismo já tinha conseguido criar uma escola académica, onde os menos aptos esteticamente tinham um modelo, uma bitola a seguirem. Dessa forma se consegue um salto positivo na qualidade geral, por onde se destaca um ou outro nome. E quando se destacam, não é apenas na estrutura gráfica, mas no âmbito geral das artes portuguesas. Infelizmente não é possível criar bitolas - modelo para o humor, porque esse não tem escola, depende do poder interior de cada um.
As idas de Raphael e seu filho ao estrangeiro, a chegada de revistas estrangeiras sempre ajudou a manter-nos informados do que se passava no resto da Europa, e naturalmente influenciou as diversas gerações de gráficos. Nesta viragem de século é notória essa influência, e muitas das páginas humorísticas de então poderiam incluir qualquer antologia do grafismo Arte Nova que se desenvolvia entretanto na Europa.
Como já referi, descobrimos também os primeiros sintomas estéticos da revolução que as artes estavam a desenvolver nos outros campos, nomeadamente o pré-expressionismo, ou a pré-síntese modernista. Falamos nas obras de Celso, e de Leal da Câmara quando ele cá estava, mas muito importantes são as obras que ele vai enviando de Paris, onde a cor, a plasticidade da massa pictórica são dominantes. Houve tentativas falhadas de o copiarem. Curiosamente, a revolução modernista surgirá mais sob a influência de Celso Hermínio, não tanto pela textura plástico-pictórica, mas pela síntese, pela caligrafia do traço.
Devemos também registar que nesta passagem de século, um pequeno grupo de títulos jornalísticos, de âmbito noticioso nacional, já estão impostos como o Diário de Notícias, Comércio do Porto, Século, Primeiro de Janeiro. Neles vamos encontramos uma aproximação dos géneros, seja como suplementos dominicais, seja como enriquecimento gráfico das suas páginas. A sátira política e social reencontram o seu papel, na dita imprensa séria.
Por outro lado acompanhará a evolução técnica da gravura, isto é, no início andará entre a gravura em madeira e a litografia, e no final do século já está a ser executada em zincogravura.
Em 1900, início do novo século, para além de “A Paródia" surgem novos jornais como "O Chinelo" (onde se vai destacar Francisco Valença) e "Passatempo". "O Mundo" (que viverá até 1936) não sendo um jornal satírico, incluirá ilustrações de Alberto Sousa, Leal da Câmara, Luís Filipe, Francisco Valença...
Wednesday, June 17, 2009
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Sunday, June 14, 2009
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